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Defensoria diz que detenção é inconstitucional

Habeas corpus foi ajuizado a favor dos moradores de rua detidos em Franca acusados de 'vadiagem'

Por Rene Moreira - Agência Estado
Atualização:

FRANCA - A Defensoria Pública ajuizou um habeas corpus coletivo em favor de pessoas que vivem nas ruas de Franca, no interior de São Paulo, e que têm sido detidas por policiais militares acusadas de "vadiagem", o que perante a lei configura contravenção penal. Inicialmente, o pedido busca beneficiar 52 pessoas que já foram detidas e tiveram procedimentos criminais instaurados contra si em varas do Juizado Especial Criminal local, mas a ação pede também que a prática seja vetada para as demais pessoas em situações parecida.Os defensores argumentam que o cidadão é conduzido à delegacia "pela mera e única razão de ser morador de rua". Um dos autores do pedido de habeas corpus, Antônio Machado Neto, diz que a abordagem é discriminatória, pois, para deter alguém seria preciso que estivesse na prática de um crime ou indicando que fosse fazer isso, como portando uma arma. Ele contou que algumas pessoas procuraram a ajuda na Defensoria e que outros foram ouvidos em abordagens dos defensores nas ruas.A ação é assinada pelos cinco defensores públicos que atuam na cidade. Nela, é narrado que a população em situação de rua foi alçada à condição de alvo da atividade policial, passando o cidadão nessa condição a ser abordado e conduzido às delegacias. Neto diz que em alguns casos a pessoa é abordada por mais de uma vez no mesmo dia pelos policiais. O problema é que a maioria não tem passagem pela polícia, mas acaba sendo fichada e pode ser até condenada.As detenções ocorrem geralmente na área central da cidade e em avenidas movimentadas. É o caso que envolveu Marcelo Henrique Moura e Claudinei da Silva Junior, que foram parar na delegacia por estarem à toa na Avenida Champagnat. Nenhum deles tinha passagem pela polícia, mas agora quando seus nomes forem puxados numa abordagem vai constar uma detenção por vadiagem.A Polícia Militar alega que apenas cumpre a solicitação da Justiça e leva os moradores de rua à Polícia Civil. Lá é elaborado o chamado Termo Circunstanciado (TC) por vadiagem e que gera os procedimentos criminais instaurados no âmbito do Juizado Especial Criminal. A legislação é de 1941 e prevê uma pena de prisão de 15 dias a 3 meses quando alguém "entregar-se habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover à própria subsistência mediante ocupação ilícita".Para os defensores, a detenção por vadiagem é inconstitucional, por ferir a liberdade de ir e vir dos cidadãos e pelo fato de a previsão legal ser essencialmente discriminatória. "A conduta considerada infração penal somente pode ser cometida pelo pobre, pelo desprovido, pelo cidadão de parcos recursos. O pobre, sem acesso a postos de emprego, nessa condição é considerado vadio, e por isso merece a repressão penal; o rico que não trabalha, porque tem rendas, ou o filho do rico, nessa mesma situação, não é vadio, mas sim cidadão admirado socialmente, e por isso não há razões para submetê-lo às consequências penais da prática contravencional de vadiagem", diz um trecho da ação remetida à Justiça. O pedido para deter os moradores de rua partiu do juiz José Rodrigues de Arimatea, da Corregedoria da Polícia Judiciária. Procurado para falar sobre o assunto, ele informou que estaria durante toda a tarde desta terça-feira em audiência e pediu para que o chefe do Cartório de Execuções Criminais, Douglas Estevam Quintanilha, atendesse a reportagem. Ele contou que o juiz ainda não havia sido informado oficialmente sobre a ação da Defensoria Pública, mas que a determinação não era para deter os moradores de rua, mas sim para "levá-los à delegacia, puxar a ficha deles e redigir um Termo Circunstanciado". Entretanto, indagado se isso não resultaria em processo, informou ser possível, mas que estão sendo analisados caso a caso.Ele contou que todas as ocorrências são acompanhadas e que o objetivo é atender aos interesses da população. Na cidade as opiniões se dividem sobre a detenção dos moradores de rua. Alguns comerciantes alegam que eles chegam a atrapalhar o movimento comercial por exigirem dinheiro para olhar os carros nas avenidas de bares e restaurantes. Mas algumas pessoas defendem que se não estiverem cometendo nenhum crime, não seria justo fichá-los na polícia.

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