Olimpíada e Copa trazem prejuízo social

ONU conclui que eventos afetam moradia de boa parte das pessoas

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Por Jamil Chade
Atualização:

A organização de Copas do Mundo e Jogos Olímpicos causou a expulsão de milhares de pessoas de suas casas e, na grande maioria dos casos, teve impacto negativo sobre a situação de moradia para a população. A conclusão é da ONU, que apresenta hoje, em Genebra, seu primeiro relatório completo sobre o impacto de megaeventos esportivos sobre a vida das pessoas nas cidades que os sediam e desfaz o mito de que apenas trazem benefícios à população.No caso do Rio de Janeiro, alerta o estudo, a ameaça de expulsão de moradores de áreas que serão usadas para os Jogos de 2016 é real e o governo terá de dar uma solução.O trabalho de elaboração do levantamento coube a uma brasileira, Raquel Rolnick, relatora das Nações Unidas para o Direito à Moradia e hoje uma das principais especialistas mundiais na questão. A ONU buscou contato com a Fifa para tratar do assunto. Sequer foi recebida. "Experiências passadas mostram que projetos de reurbanização adotados para a preparação de eventos resultaram em violações extensivas de direitos humanos, em especial o direito à moradia"", alertou Rolnick em seu documento, que será apresentado hoje a governos de todo o mundo. Expulsões, encarecimento de moradia, falta de alternativas e pressão sobre os mais pobres, que acabam empurrados para as periferias, têm sido algumas das marcas mais características das Copas e Jogos Olímpicos. Para a brasileira, os benefícios econômicos desses eventos não são distribuídos de forma adequada à população e o legado "é longe de ser positivo"". "Velhas disparidades parecem se exacerbar diante de um processo de regeneração e embelezamento das cidades"", afirma. "As consequências de longo prazo de megaeventos incluem fatos preocupantes."" Os exemplos citados pela ONU são inúmeros. Em Seul, em 1988, a Olimpíada afetou 15% da população, que teve de buscar novos locais para morar - 48 mil edifícios foram destruídos. Em Barcelona, em 1992, 200 famílias foram expulsas para a construção de novas estradas. Em Pequim, a ONU admite que 1,5 milhão de pessoas foram removidas de suas casas. A expulsão chegou a ocorrer em plena madrugada. Moradores que se opunham foram presos. Outra constatação é a alta nos preços de casas. Em Seul, a inflação foi de 20% nos oito meses anteriores aos Jogos. O preço da terra subiu 27%. Em Barcelona, a alta foi de 131% nos cinco anos antes da Olimpíada, contra mais de 50% em Sydney. Em Atlanta, 15 mil moradores foram expulsos de suas casas em 1996 e a inflação no setor imobiliário passou de 0,4% para 8% no ano dos Jogos. Para Londres/2012, as áreas próximas aos locais dos eventos já sofrem inflação quatro vezes maior que a média nacional.Em relação à Copa da África, a relatora alerta que os compromissos do governo de proporcionar ganhos sociais com o evento não estão se confirmando. O orçamento para isso é baixo e a Fifa sequer aceitou falar com Raquel sobre o assunto. A ONU pede que a entidade modifique seus critérios para a escolha da sede das próximas Copas. Não houve resposta.JOGOS DE 2016Para a Olimpíada do Rio, a ONU já alerta para possíveis violações ao direito à moradia. Um dos problemas seria a Vila do Autódromo, que poderia ter seus moradores expulsos para as obras do evento. Outra preocupação é com relação à falta de informação sobre compensações que moradores de algumas áreas terão de receber. OS IMPACTOS NA HABITAÇÃO1988 Olimpíada de Seul Em Seul, 15% da população foi violentamente expulsa e 48 mil edifícios foram demolidos em 1988 durante a preparação dos Jogos Olímpicos. A especulação imobiliária aumentou em mais de 20% o valor dos apartamentos e em mais de 27% o de terrenos1992 Olimpíada de Barcelona Duzentas famílias foram despejadas para abrir caminho para a construção de novas rotatórias e outras adaptações urbanísticas antes do Jogos Olímpicos de 1992. A especulação imobiliária em torno dos Jogos resultou num aumento de 131% no preço dos imóveis1994 Copa do Mundo dos Estados Unidos Em Dallas, cerca de 300 pessoas foram expulsas de suas residências por causa da preparação para a Copa do Mundo 19941996 Olimpíada de Atlanta Em Atlanta, em torno de 15 mil residentes de baixa renda foram expulsos da cidade por causa dos Jogos. Cerca de 1.200 unidades de habitação para os pobres foram destruídas em nome dos Jogos2000 Olimpíada de Sydney Em Sydney, os relatórios indicam que cerca de 6 mil pessoas foram desalojadas na preparação para os Jogos Olímpicos de 2000. A especulação imobiliária em torno dos Jogos elevou em 50% o preço dos imóveis2008 Olimpíada de Pequim Projeto envolveu realocação de moradores em larga escala. Foram relatadas denúncias sobre despejos em massa, por vezes conduzidos por homens não identificados. Cerca de 1,5 milhão de pessoas foram deslocadas 2010 Copa da África do Sul Mais de 20 mil moradores foram removidos e transferidos para áreas empobrecidas da cidade. O ministro da Habitação observou que os planos de construir milhares de casas de baixo custo poderiam ser afetados por mudanças nas demandas do orçamento na preparação para a Copa de 20102010 Jogos da Commonwealth de Nova Deli Em Nova Deli, na Índia, 35 mil famílias foram expulsas das terras públicas na preparação para os Jogos2010 Olimpíada de Inverno de Vancouver Em Vancouver, mais de 1.400 unidades habitacionais de baixa renda foram perdidas em relação à especulação imobiliária gerada pelos Jogos Olímpicos de Inverno de 20102012 Olimpíada de Londres Na capital da Inglaterra, sede dos Jogos de 2012, que antecedemo os do Rio, o preço médio dos imóveis no entorno olímpico aumentou mais de 3%, enquanto no restante da cidade os valores caíram aproximadamente 0,2 por cento2016 Olimpíada do RioNo Rio de Janeiro, diversos assentamentos informais estão sob ameaça de despejo, por causa da construção de instalações esportivas para a realização dos Jogos Olímpicos de 2016

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