PUBLICIDADE

Parente é serpente

De como os Diáz-Balart, familiares de Fidel, vivem a espinafrar a ditadura castrista

Por Sérgio Augusto
Atualização:

Quem foi que disse que Cuba só tem um partido político? E o Republicano? (Si, si, aquele mesmo que agora escolhe o candidato a sucessor de Obama.) 

PUBLICIDADE

Os republicanos estão promiscuamente ligados à história da ilha desde sua ocupação pelos Estados Unidos, há quase 100 anos. Theodore Roosevelt, o regente da ocupação, era do partido Republicano. A Revolução castrista ocorreu quando na Casa Branca mandava outro republicano, Eisenhower. Mesmo depois que os democratas entraram no danzón, durante o governo Kennedy, os republicanos não largaram o salão. 

É quase sempre montado no elefante do Grand Old Party que os cubanos naturalizados e sua prole costumam fazer carreira política na América, a partir da Flórida, a Canaã dos gusanos e reduto eleitoral republicano. O conservadorismo os une pela raiz. Por incrível que pareça, nem a família de Fidel escapou dessa sina. Dois sobrinhos de El Comandante, Lincoln e Mario Rafael Díaz-Balart, já se elegeram ao Congresso americano, sendo que o segundo ainda cumpre mandato. 

A trajetória política dos irmãos Díaz-Balart é algo que só deveria surpreender quem desconhece a história da família Castro. Shakespeare talvez se interessasse por recriá-la no palco, mas desconfio que seu narrador ideal seria Félix Caignet, o Mario Puzzo das radionovelas cubanas, infelizmente há muito falecido, ou o letrista de um bolero. O que os Castros têm a ver com os Díaz-Balart? Era uma Díaz-Balart a primeira mulher de Fidel: Mirta Francisca, mãe de Fidel Ángel Castro Díaz-Balart, "Fidelito". Conheceram-se estudantes universitários, ele de Direito, ela de filosofia; casaram-se em outubro de 1948, com lua de mel em Miami; Fidelito nasceu em setembro de 1949. Divorciaram-se quatro anos antes da Revolução. Mirta raptou o filho, mas Fidel o sequestrou de volta, no México, e, beneficiado pela lei cubana, ficou com a guarda do filho, que mais tarde estudaria em Moscou. Foi o primeiro escândalo da família. Fidel teria mais seis ou sete filhos com outras mulheres. 

Rafael Díaz-Balart, sogro de Fidel, foi prefeito da cidade de Banes, onde seus filhos nasceram, e membro do gabinete de Fulgencio Batista, o ditador que seu genro pôs para correr no réveillon de 1959. Dos irmãos de Mirta, só o mais velho, Rafael Lincoln, entraria na novela; o outro, Waldo, artista plástico, há décadas vivendo em Madri, nunca se meteu em política. 

Ligado, como o pai, ao gabinete de Batista, Rafael Lincoln elegeu-se senador no final de 1958, mas nem teve tempo de tomar posse. Seu cunhado desceu de Sierra Maestra e estragou tudo. Rafael escafedeu-se e montou no exílio a primeira organização anticastrista, La Rosa Blanca. Seu primogênito, narcisisticamente batizado Lincoln Rafael, tinha quatro anos quando a família fugiu de Havana para Madri, e depois para a Flórida, onde o caçula Mario Rafael, nasceu em 1961, em Fort Lauderdale. 

Enquanto isso, tia Mirta vivia discretamente em Madri. Casada com o filho de um ex-embaixador de Cuba na ONU, criou duas filhas, e há quem diga que o cunhado Raúl Castro desde sempre facilitou suas frequentes, mas sigilosas, visitas a Havana para rever Fidelito. Já tia Juanita, a irmã dissidente de Fidel e Raúl, não teve essa colher de chá.

Publicidade

 

Sete anos mais nova que Fidel, Juanita participou ativamente da derrubada de Batista, cuidando da compra de armas para o exército revolucionário, mas, ao sentir-se traída pela influência dos comunistas no governo castrista, especialmente pelo confisco das terras da família pela reforma agrária bancada pelos irmãos (menos Ramón), virou agente da CIA, morou uns tempos no México, com a irmã Emma, e, a partir de 1964, em Miami, onde se dedicou a espinafrar a ditadura castrista, em palestras, artigos e livros, e a cuidar de uma farmácia.

 

Em seu livro de memórias, Fidel e Raúl, Meus Irmãos - A História Secreta, publicado em 2009 e que não causou mal-estar apenas no governo cubano, Juanita revelou ter sido cooptada para a CIA pela então embaixadora do Brasil em Cuba, Virginia (Nininha) Leitão da Cunha, que também era espiã, segundo a irmã de Fidel. Nunca se esclareceu se o embaixador Vasco Leitão da Cunha, em seguida escolhido por João Goulart para representar nosso país na União Soviética, conhecia essa faceta de sua mulher.

Mas voltemos ao “ramo Rafael” da família. Além de Lincoln Rafael e Mario Rafael, o patriarca dos Díaz-Balart teve mais dois filhos: José (telejornalista) e outro Rafael tout court, atuante no mercado financeiro. Os políticos do clã, Lincoln, formado em Direito, e Mario, diplomado em ciências políticas, são os que importam.

 

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Lincoln, que também tem um filho chamado Lincoln (já estou começando a achar que se trata de uma doença genética), foi democrata até 1985. Ao perder uma eleição, trocou o burro pelo elefante. Deputado pelos republicanos de 1993 a 2011, notabilizou-se por combater o jogo de pôquer em aviões, a visita do ex-presidente Jimmy Carter a Havana, em 2002, a guarda paterna do menino Elian González, todas as propostas econômicas do presidente Obama, e incentivar um bloqueio naval a Cuba e o assassinato de Fidel. 

Herdeiro do eleitorado do irmão, Mario Rafael é o representante do 21º distrito da Flórida no Congresso, desde o ano passado. Tem 24 anos de experiência legislativa e é um dos políticos latinos mais conservadores de Miami. Feroz defensor do embargo a Cuba, também combateu o plano emergencial de estabilização econômica de Obama de 2008. Aliás, o que Obama propuser, ele é contra. Nem o assassinato de Osama bin Laden aprovou. Surpreendentemente, defende o Dream Act, aquela medida que possibilita a legalização dos filhos de imigrantes que se diplomem numa universidade ou prestem dois anos de serviço militar. Só nisso parece discordar de Mitt Romney, o provável candidato republicano às próximas eleições presidenciais, em cuja campanha mergulhou de cabeça, mesmo sabendo que, se necessitasse de um vice cubano para arrancar votos do eleitorado latino, Romney escolheria Marco Rubio. Este, quando nada, é mais fotogênico.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.