Em 25 de outubro de 1975, o jornalista Vladimir Herzog, diretor do departamento de Jornalismo da TV Cultura, se apresentou ao Destacamento de Operações Internas (DOI-Codi) de São Paulo para prestar depoimento. De lá, não saiu com vida. Foi preso, torturado e morto pelos agentes da repressão. O caso, um entre os muitos episódios criminosos que compõem a história da ditadura militar no Brasil, despertou a indignação da opinião pública e fez crescer o movimento pelos direitos humanos e pela abertura política do País.
>> Estadão 26/10/1975
A versão do suicídio. Uma inverossímil versão de suícidio foi defendida pelo Comando do 2º Exército. Vladimir Herzog teria se suicidado quando foi deixado sozinho em sua cela. Em 27 de outubro uma matéria de página inteira no Jornal da Tarde noticiou a morte do jornalista nas dependências do DOI-Codi. Como não circulava às segundas-feiras, o Estado publicou, no dia 28, a nota oficial do 2º Exército com a conclusão do laudo do IML, atestando “asfixia mecânica por enforcamento”. O documento também falava de uma confissão - com “assinatura ilegível”, rasgada em pedaços e recomposta “para fins legais”. Na mesma edição, uma página inteira trazia os detalhes do sepultamento de Herzog: o caixão fechado no velório, a recusa recebida pela viúva ao tentar realizar um segundo exame do corpo, a perplexidade dos que conheciam o jornalista, a denúncia da pressa com que o sepultamento foi realizado, a determinação do rabinato de não enterrar o corpo nas quadras especiais reservadas aos suicidas nos cemitérios judaicos. À medida em que as informações sobre o caso eram noticiadas, um sentimento de revolta tomou conta da opinião pública.
No jornal, matérias cobravam esclarecimentos e a condenação dos responsáveis. Instituições como o Sindicato dos Jornalistas e a Ordem dos Advogados do Brasil reagiram. O sindicato cobrou medidas que garantissem a integridade física dos jornalistas. A OAB encaminhou um ofício ao presidente, o general Ernesto Geisel, pedindo a apuração rigorosa de responsabilidades na morte de Herzog.
Homenagem na Sé. Em 31 de outubro, o Estado publicou a posição de Geisel sobre o caso, “um fato lamentável”. A matéria também trazia declarações de uma alta fonte do governo dizendo que o caso não deveria gerar inquietação, pois o governo agiria pra impedir novos incidentes. No mesmo dia, cerca de oito mil pessoas compareceram ao rito ecumênica em homenagem a Herzog na Catedral da Sé. Na matéria sobre a cerimônia, o Estado falou sobre a comoção dos presentes que, em silêncio, ouviam as palavras do arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns, “ninguém toca impunemente no homem!”. O evento é tido como a primeira grande reação popular contra as violações aos direitos humanos cometidas pelo agentes do regime, uma demonstração da força da sociedade civil na luta contra a ditadura.
A queda do general. Em 17 de janeiro de 1976, ocorre outra morte nos porões da ditadura. O metalúrgico Manoel Fiel Filho é morto no mesmo local que Vladimir Herzog. Dois dias depois, Geisel afasta o comandante do 2º Exército, general Ednardo D'Avilla Melo, responsável pelo DOI-Codi.
Em 1978, numa decisão histórica, a Justiça condenou a União no caso da morte de Vladmir Herzog. A verdade sobre as circunstâncias que levaram à morte do jornalista só teve reconhecimento oficial em 2012, quando a Justiça atendeu ao pedido da Comissão Nacional da Verdade e determinou a mudança da causa da morte no atestado de óbito de Vladimir Herzog para “decorrente de lesões e maus-tratos sofridas em dependência do Exército”.
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