Brasil só receberá inspeções de Direitos Humanos da ONU em 2019

Três relatores das Nações Unidas solicitaram visitas ao governo brasileiro, mas indicações é de que elas apenas ocorrerão depois das eleições

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Por Jamil Chade
3 min de leitura

GENEBRA - O governo brasileiro só receberá inspeções de relatores de Direitos Humanos da ONU em 2019. O Estado apurou que três peritos da entidade pedem para visitar o Brasil com suas missões, mas receberam indicações de que as viagens para avaliar a situação de ativistas, da extrema pobreza e dos programas sociais do País não ocorrerão antes das eleições presidenciais. 

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Michel Forst, relator da ONU sobre a proteção a defensores de direitos humanos, solicitou uma visita ao Brasil em dezembro de 2017, principalmente diante da situação de ameaça aos ativistas. Dados de entidades como a Anistia Internacional apontam o Brasil como o local mais perigoso para um defensor de direitos humanos. 

Nações Unidas Foto: REUTERS/Mike Segar

No ano passado, governos também usaram a sabatina do Brasil no Conselho de Direitos Humanos para cobrar o governo sobre essa questão. Países como Holanda sugeriram a federalização das investigações em casos de mortes de ativistas. 

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Por enquanto, porém, a resposta do governo é de que a visita do relator apenas ocorreria em 2019 e o Itamaraty confirmou que existe um diálogo estabelecido com o perito para se encontrar uma data. Na ONU, porém, o oferecimento de 2019 foi interpretado como uma tentativa de o governo não ter um constrangimento internacional antes das eleições presidenciais. 

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Outro que pediu para realizar uma missão ao Brasil foi Philip Alston, relator sobre extrema pobreza. Ele tem feito duras críticas contra cortes nos gastos sociais e no impacto em comunidades mais carentes. 

Numa carta ao governo em 2017, ele indicou que a austeridade era "inteiramente incompatível com as obrigações de direitos humanos do Brasil" e teria "um impacto severo sobre os mais pobres". "Essa é uma medida radical, desprovida de toda nuance e compaixão", disse. "Vai atingir com mais força os brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente, assinala que para o Brasil os direitos sociais terão muito baixa prioridade nos próximos 20 anos."

Alston, agora, queria ver qual estava sendo o impacto da contenção de recursos nos programas sociais. 

No mês passado, o governo brasileiro suspendeu a visita ao País do relator da ONU para a dívida, Juan Pablo Bohoslavsky, que ocorreria entre os dias 18 e 30 de março. Ele faria um exame do impacto das medidas de austeridade implementadas pelo governo nas áreas sociais, de educação e saúde. 

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O Estado apurou que, no governo, a justificativa é de que a viagem foi apenas adiada por causa da saída da ministra de Direitos Humanos, Luislinda Valois, demitida pelo presidente Michel Temer (MDB). Em função da "transição" no ministério, a viagem teria sido adiada. Mas, na ONU, fontes revelaram à reportagem que nenhuma nova data foi apresentada pelo governo para que a nova visita possa ocorrer. 

Convite. O governo brasileiro tem como política aceitar a missão de todo e qualquer relator especial da ONU, no que é conhecido como "convite aberto". Mas estabelece que cabe ao governo estipular as datas. 

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O comportamento nos últimos meses, porém, tem chamado a atenção da sociedade civil e mesmo dentro da ONU. 

"A partir do momento que o agendamento das datas não ocorre ou que haja cancelamento, isso mostra que há um desrespeito à prática do convite aberto", disse Camila Assano, representante da entidade Conectas. "Mais coerente seria o Brasil seguir o que diz esse convite aberto. Caso contrário, retirar esse convite e deixar claro que sua prática vai ser a de decidir caso à caso a entrada de relatores, o que é gravíssimo", completou. 

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