Pelo menos quatro pessoas morreram nas últimas semanas em conflitos gerados pela falta de pão em padarias populares na capital do Egito, Cairo. O governo não divulgou oficialmente o número de vítimas fatais, mas a crise da falta do produto está sendo considerada uma das mais sérias das últimas décadas no pais. "Demorei mais de quatro horas para comprar vinte fatias, mesmo assim, após uma dura disputa com outras mulheres aqui", afirmou à BBC Brasil uma consumidora em um dos pontos de venda de pão subsidiado do Cairo. "Tenho uma família de sete pessoas e é esse pão que nos impede de morrer de fome", disse ela. Trigo caro Estima-se que 20% dos cerca de 80 milhões de egípcios vivem abaixo da linha da pobreza e, outros 30%, pouco acima. Mais da metade da população do país recorre ao pão que é subsidiado pelo governo, muito mais barato do que o não subsidiado. A escassez do pão e as conseqüentes filas são problemas que vêm ocorrendo há cerca de um ano, quando o preço do trigo disparou no mercado mundial. Nesse período, o valor do trigo triplicou internacionalmente. O Egito importa mais da metade do trigo que consome e o aumento do preço do pão feito sem subsídios fez com que mais pessoas precisassem comprar o alimento subsidiado. Corrupção Muita gente no país culpa a corrupção de padeiros e atravessadores pela crise. A clientela da padaria visitada pela reportagem da BBC Brasil, repetiu o que parece ser a opinião de boa parte da população. "O governo manda os sacos de farinha para as padarias, mas eles nem chegam ao seu destino e são vendidos no mercado negro, muitas vezes mais caro", afirma um homem, que como os outros presentes, preferiu não se identificar. Na semana passada, o presidente do país, Hosni Mubarak, ordenou que o Exército interceda para por fim à crise. Muitos parecem acreditar que apenas os militares podem resolver a situação. "O Exército vai acabar com o contrabando de farinha. Se eles fizerem isso, vai haver pão para todos", afirma o consumidor. Histórico Um editorial do jornal estatal Al-Ahram afirma que "as nações que usam o trigo importado para fabricar o pão vão ter que conviver com o aumento dos preços por muito tempo" e pede para que o governo não subestime a gravidade da situação. Alguns analistas afirmam que a saída é viabilizar uma maior produção nacional do trigo, outros reforçam a tese de que a culpa é da corrupção. De qualquer forma, Mubarak já autorizou o uso de reservas egípcias para a compra da matéria-prima. A última crise provocada pela falta de pão tinha ocorrido em janeiro de 1977, quando o governo ameaçou aumentar o preço do produto subsidiado. Naquela ocasião, cerca de 70 pessoas morreram e, apesar de contar com um grande contingente de forcas de segurança acostumados a reprimir revoltas populares, o governo foi obrigado a recuar. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.