O antecessor de Obstfeld, o professor Olivier Blanchard, havia usado a palavra corrupção numa entrevista coletiva e os últimos relatórios produzidos sob sua orientação mencionaram as investigações sobre a Petrobrás. A fala de Obstfeld e o Panorama podem ter dado a impressão de um tratamento mais contido, embora crítico. Mas essa impressão durou pouco. Se um estrangeiro quiser uma informação básica sobre os escândalos, a crise política brasileira e seus efeitos econômicos, a leitura de dois longos e sólidos parágrafos do relatório sobre o hemisfério ocidental será muito útil.
Os dois parágrafos mostram como os erros da política econômica e a eclosão da crise política se juntaram na produção de um desastre. O mau estado da economia brasileira resultou principalmente de fatores internos, segundo o documento. Problemas externos, como a queda de preços dos produtos básicos, tiveram menor peso.
Essa avaliação, sustentada por analistas brasileiros, contrasta com a alegação repetida pela presidente Dilma Rousseff de que a crise foi causada basicamente por choques provenientes do exterior. Um erro de diagnóstico levou a uma política de estímulos à demanda, causando uma inflação bem acima da meta e acelerando a deterioração das contas públicas. Como desdobramentos vieram as medidas de aperto monetário e fiscal.
Ao mesmo tempo, assinala o relatório, uma grave crise política foi provocada por uma ampla investigação sobre a Petrobrás, seus fornecedores e políticos. O texto menciona também as suspeitas de irregularidades na campanha eleitoral e o exame das pedaladas fiscais pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
A interação das crises política e econômica afetou a confiança de consumidores e de empresários e levou a uma contração maior da atividade, afetando a arrecadação, aumentando a insegurança em relação à dívida e abrindo caminho para o rebaixamento do crédito ao nível de lixo.
Ao expor as entranhas da política brasileira no documento, os técnicos e dirigentes do FMI deixam muito claro um contraste. A origem da crise brasileira é principalmente interna, mas a repercussão dos erros e desmandos combinada com a bandalheira política é internacional. Os políticos envolvidos direta ou indiretamente na devastação econômica e financeira da Petrobrás subestimaram, com certeza, o alcance de seus atos.
A pilhagem da Petrobrás, o escândalo das propinas, a compra da refinaria de Pasadena, a ingerência nos preços dos combustíveis e os projetos mal concebidos, como o da Refinaria Abreu e Lima, são partes de uma única história. Essa narrativa se junta, inevitavelmente, aos desmandos e atos de corrupção cometidos em outras áreas, como de eletricidade. A pilhagem do patrimônio público, o loteamento de cargos, a interferência política em preços e tarifas, a concessão seletiva de benefícios fiscais e financeiros, o manejo desastroso do dinheiro público e o descontrole inflacionário são ramos e folhas da mesma árvore.
Os problemas fiscais, econômicos e políticos alegados como razões para o rebaixamento do crédito oficial do Brasil são aspectos dessa história. O corte da nota de crédito soberano resultou numa reclassificação da Petrobrás. Movimento em sentido inverso pode ocorrer: o enorme endividamento da Petrobrás é um fator de risco para o crédito soberano, de acordo com um dos estudos publicados do FMI. Juristas podem até defender a divisão de todos esses casos. Para os analistas econômicos e para o mercado a narrativa é uma só.
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