Você já viu bem a foto acima. Agora olhe o diretor Sérgio Rezende, fotografado no alto de um hotel de luxo em Ipanema. Seu cinema não tem olhos para a beleza dessa paisagem, comprometido que está em mostrar o que ele define como "a maldita realidade". A imagem do jovem diante da vitrine estourada é emblemática de Salve Geral. Rezende filmou-a em Campinas, uma das quatro cidades (Marília, São Paulo e Rio, as outras) que lhe permitiram recriar na tela o dia, o segundo domingo de maio de 2006, em que a megalópole paulista parou. O roteiro previa um ataque a banco. O diretor procurava uma locação quando deu com essa rua em que se localizam as lojas de artigos para casamentos."Imediatamente me pareceu que seria mais forte. Um ataque a caixa eletrônico, quer coisa mais óbvia? Estou contando a história de uma mãe e seu filho. O ataque é ao casamento, a base da família, que é a célula básica da sociedade. Foi uma cena complicada de filmar. Tivemos de revestir toda a vitrine com gesso, para evitar o risco de que o prédio queimasse com a explosão, mas valeu a pena."O repórter observa que todo o filme, a despeito das discussões que poderá provocar - se é simpático ou não ao PCC -, passa uma direção de cena forte. Sérgio Rezende acha que Salve Geral representa uma mudança para ele. "Vivo de cinema, não faço outra coisa, e a verdade é que gosto de filmar. E tanto faz que seja um filme grande como Canudos ou um pequeno como Quase Nada. Filmei O Cinema É Meu Jardim em 2004, só eu e a câmera, ninguém mais. Aquilo me deu um prazer imenso, tanto quanto gostei de isolar ruas para filmar a perseguição de Salve Geral. Mas, nos filmes anteriores, eu planejava tudo e queria controlar. Me pareceu que, para filmar o descontrole, teria de mudar. Em vez de engessar os atores com minha câmera, resolvi fazer o contrário. Deixei os atores mais livres e mandei que a câmera os seguisse. Isso deu ao filme essa construção mais nervosa, mais forte como você diz."Salve Geral tem uma protagonista e uma antagonista, Andréa Beltrão e Denise Weinberg. Ambas são poderosas em cena. "Escrevi o papel para a Andréa, mas a Denise veio depois. Havia inclusive pensado em outra atriz, mas é meu quarto trabalho com a Denise e eu sabia do que ela é capaz. São duas escolas de representação e um dos prazeres de fazer esse filme foi justamente o de ver essas atrizes criando, e não só elas. Os atores, também. O Eucyr de Souza, fantástico. Sinceramente, não entendo como existem diretores que recorrem a preparadores de elenco. O filme se cria nos atores, com os atores. Não conseguiria abrir mão dessa colaboração." A estreia encerra um processo que começou em maio de 2006, há três anos. Zuzu Angel ia estrear e a Globo usaria o filme - e Patrícia Pillar - para um especial sobre o Dia das Mães. "Ele não foi ao ar. Fiquei esperando e só o que via eram aquelas imagens de terror em São Paulo." O filme nasceu ali? "Não - só durante uma viagem de carro, sozinho, a Minas, foi que consegui desenvolver o conceito, o olhar feminino." Esse olhar, filtrado pela direção, passa agora pelo crivo do público e, quem sabe, chegará ao Oscar.
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