Após mais de três meses de protestos e suspensão das aulas, mais de duzentos mil universitários chilenos correm o risco de perder o primeiro semestre do ano letivo, segundo estimativas do Conselho de Reitores das Universidades Chilenas (CRUCH), que engloba as 25 universidades públicas do país. "As universidades públicas reúnem 260 mil alunos e 90% deles, ou seja 234 mil alunos, estão participando de alguma maneira das manifestações e realmente correm risco de perder o semestre", disse o CRUCH. Esse número aumenta para "mais de 300 mil" pelos cálculos da Confederação dos Estudantes Chilenos (Confech), que concentra as federações de universitários da rede pública do país. "Estas são nossas estimativas em relação às 25 universidades públicas e em relação às privadas que aderiram ao nosso protesto", disse à BBC Brasil o universitário Patrício Contreras, de 22 anos, um dos porta-vozes da Confech. Contreras está no último ano de Ciência Política e diz estar "disposto a perder o ano" se as demandas não forem atendidas. Outros 250 mil alunos dos ensinos fundamental e secundário (7% do total) também estão sem aulas, de acordo com o Ministério da Educação. Ano letivo O governo lançou, no início deste mês de agosto, o programa "Vamos Salvar o Ano Letivo", para evitar que os alunos 'repetissem' o ano. Até agora, 68 mil alunos do ensino fundamental e secundário se inscreveram. O protesto é realizado pelos estudantes secundaristas, mas, com as escolas ocupadas, aulas do ensino fundamental também foram suspensas. O ministro da Educação, Felipe Bulnes, disse por meio de sua assessoria que o governo espera que a adesão aumente até a quarta-feira, quando termina o prazo para a inscrição no programa, que prevê aulas em locais alternativos como bibliotecas e academias de ginástica ou a opção de estudar em casa e comparecer para a prova final. De acordo com o Ministério da Educação, mais de 200 colégios estão ocupados pelos estudantes, que participam dos protestos por melhorias na educação e por acesso gratuito ao ensino público. O Ministério não reúne dados sobre as universidades, administradas pelo Colégio de Reitores. Na quinta-feira, o Conselho divulgou comunicado pedindo ao governo e aos estudantes que "retomem o diálogo com urgência". Também pediu aos alunos que concluam o primeiro semestre, para que o segundo semestre tenha início em outubro. Durante o último fim de semana, os universitários realizaram um novo congresso e decidiram aceitar o convite do presidente Sebastián Piñera para discutir, esta semana, a questão da educação. Piñera os convidou na sexta-feira, um dia após a morte do estudante Manuel Gutiérrez Reinoso, de 16 anos, no fim de dois dias de greve. "Quero pedir a todos que a reunião permita um diálogo com a defesa de nossas posições, mas com boa vontade, com disposição para resolver o problema", disse Piñera, neste domingo. O presidente disse ainda que os estudantes conseguiram colocar a educação "no centro do debate", nestes três meses de "manifestações, greves e greve de fome". Segundo Piñera, 500 policiais militares e outros civis saíram feridos no período. O presidente afirmou que enviará ao Congresso Nacional projeto para reduzir a taxa de juros para o crédito educativo, exigido para pagamento nas universidades públicas. Plebiscito Os estudantes afirmaram, após a reunião do fim de semana, que esperam que suas demandas sejam atendidas e avisaram que os protestos vão continuar. "O convite é um bom sinal, mas não significa que vamos suspender nosso movimento sem ter as demandas atendidas", disse Camilla Vallejo, presidente da Confech. Na mesma linha, Contreras afirmou: "Esse sistema educativo durou 30 anos, foi criado pela ditadura (durante o regime de Augusto Pinochet), e deixou as famílias chilenas endividadas. Se o governo não nos oferecer a educação gratuita, os protestos vão ser ampliados e vamos pedir um plebiscito nacional", disse Contreras, que é de Puerto Mont, no sul do país. Sobre o comunicado dos reitores, ele disse ser "difícil" atender à sugestão do possível retorno às aulas sem uma resposta do governo. No primeiro semestre, recordou, os universitários tiveram aulas em março e até metade de maio quando os protestos começaram incrementando-se a partir de junho. Os protestos estudantis dividiram o país e até mesmo o governo. Na semana passada, o ministro da Economia, Pablo Longueiras, disse que também participaria dos protestos "se não tivesse dinheiro para pagar educação para os filhos". Um dos representantes dos universitários da cidade de Valparaíso, Sebastián Farfac, também integrante da Confech, disse à BBC Brasil que para eles o "exemplo" é o México, onde estudantes protestaram por meses, nos anos 1980. "(Eles) perderam o ano escolar, mas conseguiram suas demandas", disse. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.
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