Exigir visto de brasileiros não conterá imigração ilegal, dizem especialistas

Exig^Çenc ia Visto não é eficiente; Desaceleração da economia britânica é obstáculo real à chegada de brasileiros.

PUBLICIDADE

Por Fernanda Nidecker
3 min de leitura

A exigência de vistos para turistas brasileiros que desejam visitar a Grã-Bretanha não será eficiente no combate à imigração ilegal, avaliam especialistas ouvidos pela BBC Brasil. "É certamente um obstáculo, mas não vai desestimular a imigração. O que pode desencorajar os brasileiros a emigrar para a Grã-Bretanha é a desaceleração da economia e a menor oferta de empregos, e não a imposição de vistos", avalia Francesco Panizza, especialista em política latino-americana da London School of Economics (LSE). Na semana passada, o Ministério do Interior britânico anunciou que poderá exigir vistos de turistas brasileiros a partir do ano que vem como parte de um programa que visa diminuir "os riscos" que o Brasil, além de outros dez países de fora da União Européia, representam para o país. Na avaliação do especialista, a Grã-Bretanha está se tornando menos atraente para imigrantes da América Latina à medida que os mercados de emprego da região estão se erguendo. "O desemprego está diminuindo no Brasil e em outros países da América Latina. A isso, se soma a valorização do real. Hoje um imigrante já não ganha tanto quanto há dois anos", afirma Panizza. Fuga de talentos Se implantada, a nova lei britânica aumentará a tensão criada entre países europeus e latino-americanos depois que uma lei que prevê medidas duras contra imigrantes ilegais na União Européia foi aprovada no mês passado. "A nova regra britânica só vai aumentar o mal-estar já instalado e se soma à lista de medidas injustas que vêm sendo criadas contra imigrantes", diz o especialista. Panizza se refere à nova lei de imigração instaurada em fevereiro na Grã-Bretanha, que criou um sistema de avaliação a partir de pontos para permitir que "apenas os melhores imigrantes" entrem no país. "Ao querer atrair apenas a mão-de-obra qualificada, eles drenam os cérebros da América Latina e isso cria um problema para a região porque gera uma fuga de talentos", afirma o analista. O governo britânico disse que pretende estreitar relações com os 11 países incluídos na lista nos próximos seis meses para "reduzir o risco que eles representam" e tentar evitar a implantação da lei. Eles foram avaliados a partir de quesitos como o uso de passaporte falso, imigração ilegal (número de deportados, barrados nas fronteiras e trabalhadores ilegais), índices de criminalidade, ameaça de terrorismo e a forma como seus governos estão lidando com essas questões. Efeito moral Na avaliação do cientista político Timothy Power, diretor do Programa de Estudos Brasileiros da Universidade de Oxford, "não há nada que o governo brasileiro possa fazer para atender as exigências britânicas". "O governo não tem como impedir que as pessoas apresentem documentos falsos para conseguir o visto ou barrar sua saída do país. Campanhas de conscientização custam caro e não surtem efeito nesses casos", opina Power. "O melhor que o Brasil pode fazer é se preparar para a política de reciprocidade, o que será uma dor de cabeça para os britânicos, que também precisarão de vistos para entrar no Brasil". Ele também defende a tese de que o crescimento econômico do país, acompanhado por inflação baixa e valorização do real, estimula as pessoas a ficar no país. "E quem chegou aqui (na Grã-Bretanha) há quatro ou cinco anos também não vai voltar agora porque o dinheiro que está guardando perdeu valor com a queda da libra. Agora eles têm que ficar até que a situação se reverta", acredita. O especialista pondera, no entanto, que por ser uma ilha, o país poderá barrar com mais facilidade a chegada de brasileiros sem visto. "Isso não acontece nos Estados Unidos, por exemplo, onde muitos imigrantes irregulares conseguem burlar a exigência de vistos entrando pelas fronteiras com o México e o Canadá", afirma Power. Na opinião de Nizar Messari, do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC), a imposição de vistos "terá um efeito moral, mas não reduzirá o número de imigrantes ilegais". Messari concorda que o melhor que Brasil poderá fazer caso a nova lei britânica entre em vigor é aplicar ações de reciprocidade. "A política de reciprocidade geralmente dá resultados, como ocorreu em 2004, quando o Brasil foi um dos poucos países a decidir coletar as impressões digitais de todos os americanos que desembarcavam no país, em retaliação a uma medida semelhante imposta pelo governo Bush", afirma o especialista. Ponto de atrito Ele diz que a iniciativa brasileira de reciprocidade é sempre muito elogiada no mundo inteiro e mostra que o país "não coloca os interesses comerciais na frente de questões relativas à sua soberania". "Essa postura sempre joga a favor do Brasil porque reafirma as ambições do país de se ser uma peça importante no cenário internacional", diz Messari. O especialista acredita que a polêmica envolvendo a questão dos vistos pode abalar as relações bilaterais. "Em um plano mais abrangente isso não deve provocar grande impacto nas relações (diplomáticas), mas certamente criará um ponto de atrito nos próximos encontros de Lula com autoridades britânicas", avalia Messari. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.