O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) colocou mais lenha na fogueira da discussão sobre as privatizações, tema que está acirrando o cenário eleitoral neste segundo turno e dividindo tucanos e petistas. Ao comentar o assunto, em entrevista concedida nesta terça-feira à Rádio CBN, FHC declarou: "Não sou contrário à privatização da Petrobras", mas argumentou que "ninguém irá privatizar a estatal", numa tímida defesa do candidato de sua legenda à Presidência da República, Geraldo Alckmin, que vem sendo acusado pelo adversário do PT, presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de ter planos de privatizar essa e outras estatais, caso seja eleito nessas eleições. Na entrevista à CBN, o ex-presidente Fernando Henrique classificou de arcaica toda a polêmica em torno do tema privatizações. E criticou duramente a gestão Lula: "A Petrobrás tem que ser outra coisa, uma empresa pública. E não como está sendo usada, para fins políticos. Pode ver para quem eles dão publicidade, pode olhar, é para fins políticos." E utilizou o mesmo argumento para falar do Banco do Brasil: "O Banco do Brasil tem que ser uma empresa pública e não (ser utilizado) para o valerioduto. Isso está errado. Tem empresas que devem ser do governo, mas não devem ser usadas por um partido. E empresas que não tem sentido em estar no governo e devem ser privatizadas." Na defesa das privatizações realizadas por sua administração, o ex-presidente tucano disse que se os bancos estaduais não tivessem passado por este processo, estariam hoje envolvidos em corrupção e contribuindo para o aumento da inflação. Ele disse também que a Embraer (privatizada no governo Itamar Franco) e a Companhia Vale do Rio Doce (privatizada no seu governo) são hoje exemplos para o mundo, "para a glória nacional". A respeito da privatização que sua gestão fez no setor de telefonia, alfinetou: "Se foi errado, porque o governo Lula não mexeu e não reestatizou? Isso é demagogia." Ainda nas críticas ao governo Lula, o tucano afirmou que eles (petistas) estão mentindo ao País, ao dizer que privatizar é vender patrimônio público. "Estão mentindo ao País e estimulando uma visão atrasada do que é o Brasil. Estamos perdendo tempo e vamos ficar para trás discutindo o passado." A respeito do questionamento do dinheiro da venda das estatais em sua gestão, o ex-presidente voltou a atacar: "Um presidente (Lula) que ainda pergunta isso não pode ser presidente da República, porque ele sabe para onde foi, o dinheiro foi para diminuir as dívidas do Brasil. O dinheiro foi para o Tesouro. Todo mundo poderia perguntar isso, menos quem é dono do Tesouro." E emendou: "E se não foi, (Lula) deveria processar todo mundo. Se calou. Agora é demagogia." Preconceito contra pobres e nordestinos Ele criticou duramente Lula ao rebater as afirmações que o petista vem fazendo nesta campanha eleitoral, dentre elas a de que os tucanos têm preconceito contra pobres e nordestinos. "Como Presidente da República, (Lula) deveria ter a responsabilidade moral de não dizer uma inverdade desta. É acirrar uma visão equivocada e marcar o preconceito." FHC argumentou que no passado defendeu o petista quando se dizia que alguém sem curso superior não deveria governar o País. "Eu fui o primeiro a dizer: isso não é verdade. Era o mesmo preconceito que se jogava contra ele e agora ele faz o contrário, jogando contra os tucanos." E alfinetou: "Francamente eu acho lamentável. A decepção que eu tenho com o presidente Lula é muito grande porque ele virou um político comum. Um político banal que usa essas coisas para ganhar eleição. Tudo bem pode ter até o efeito de ganhar a eleição, mas é isso que se faz num País, é isso o que um estadista faz, é assim que se constrói uma nação? Não é." Na entrevista à rádio CBN, FHC rebateu também as afirmações feitas pela oposição de que o PSDB é um partido das elites. "A oligarquia brasileira toda no Norte e Nordeste votou no Lula. Isso é pobre? Esta análise é superficial (de que os tucanos representam a elite)," ironizou. Ao comentar as comparações que estão sendo feitas com seu governo, disse que são "fantasiosas" e questionou: "O presidente Lula disse que criou tantos empregos, não é verdade, olha a taxa de desemprego que é a mesma. Quantas usinas hidrelétricas e portos ele construiu? Quantas estradas? Até a inflação voltou a crescer em 2002 por causa do efeito Lula, da crise que ele mesmo criou. Ele roubou os aplausos do Kofi Anan (no programa eleitoral do PT) e até a inflação de quem a estabilizou. Não dá, né?" Assassinando o símbolo Em cerca de quinze minutos de entrevista, o ex-presidente tucano disse ainda que Lula está assassinando o símbolo que ele representa. "É lamentável para quem começou como líder renovador, se transformar num político como outro qualquer. É uma perda histórica, o presidente Lula está assassinando o símbolo que ele representa pela incapacidade de entender seu momento de grandeza na história, que não é só ganhar as eleições." E destacou que Lula está se igualando ao que há de mais atrasado na política brasileira. "De coração aberto, lamento, porque vi o que Lula era no passado." E ironizou: "Este era o líder que todos prezávamos? Tenho sentimento de perda neste caso." Além das críticas a Lula, o tucano também não poupou o Partido dos Trabalhadores. "O PT virou quase uma empresa, se organizou, se burocratizou, contratou gente, e deu no que deu. Precisava de dinheiro, não tinha dinheiro, acabaram arranjando dinheiro em alguns setores de maneira escusa, através do lixo, através de transportes coletivos e depois chegaram ao governo federal, deu no que deu." Ainda na entrevista à CBN, Fernando Henrique cobrou explicações sobre a origem do dinheiro que seria utilizado na compra do dossiê Vedoin. "Eu não acho que seja apenas uma questão eleitoral. É uma questão muito mais grave", pelo envolvimento de pessoas próximas ao petista. Sobre a eventual operação abafa, divulgada pela revista Veja neste final de semana, o tucano disse que não está acompanhando de perto o caso e que, por isso, não gostaria de ser leviano. Porém, considerou: "Acho que a polícia (Polícia Federal) que tem demonstrado tanta eficiência e tanta rapidez deveria mostrar que não existe (a tal operação abafa), dando nomes aos bois. Não é possível que depois de um mês (da apreensão de R$ 1,7 milhão) não tenha descoberto os caminhos do dinheiro, que deixam rastros para todos os lados. Mas não quero julgar (a polícia)." Este texto foi alterado às 22h03 com inclusão de informação