Fome é risco por trás de mudanças do clima em Bangladesh

Secas prolongadas e perda de território podem comprometer segurança alimentar no país.

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Por Eric Brücher Camara
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Para alguns países, um dos maiores riscos de uma eventual elevação dos oceanos provocada pelo aquecimento global é o aumento da fome. Em Bangladesh, esse risco já levou a cientistas a calcularem quanto das terras agriculturáveis do país poderiam ser perdidas e o impacto disso na produção de alimentos. Hoje, o país que depende pouco de importação de alimentos, apesar de sua população de mais de 140 milhões de pessoas em um território de pouco menos de 144 mil quilômetros quadrados. Desse território, cerca de 50% pode ser usado para agricultura. No entanto, estima-se que, dependo da projeção que se faça para a elevação do nível do mar, ocorra uma perda de 15% a 20% do território nas próximas décadas. Com isso, o país que hoje produz comida suficiente para alimentar a sua população perderia essa autonomia. A combinação da falta de comida com a pobreza pode ter conseqüências graves para a população. "A potencial necessidade de importação de alimentos pode comprometer o crescimento econômico do país. Mesmo hoje, já existe uma influência significativa na taxa de produção de alimentos do país devido à degradação ambiental", afirmou, à BBC Brasil, Mohammad Sifayet Ullah, representante da Federação Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho em Bangladesh. Sifayet Ullah afirma que as estimativas atuais são de que todos os problemas climáticos e catástrofes naturais que o país já enfrenta reduzem o crescimento anual em quatro pontos percentuais - hoje, o Produto Interno Bruto do país está se expandindo a uma taxa de 7%. O avanço do mar sobre o território bengalês não causaria apenas a perda direta de terras, já que a salinidade infiltrada no solo também afeta o cultivo de grãos, principalmente o arroz, que é o principal componente da alimentação em Bangladesh. Exemplos disso já podem ser encontrados hoje. No vilarejo de Kuakata, no sul do país, as colheitas de arroz já estariam sendo afetadas pela salinidade do solo. "Há uns sete ou oito anos, terras que não eram atingidas por marés altas passaram a sofrer com a salinidade. Hoje, o plantio é mais pobre", afirmou, à BBC Brasil, o morador Alamgir Hossain Dulal. A situação deve ser ainda mais agravada pela maior demanda de irrigação de plantações em diversas áreas. A maior exploração das águas na superfície e a diminuição do afluxo nos rios em conseqüência da perda das reservas congeladas na cordilheira do Himalaia - que abastece os principais rios do país - devem comprometer 250 mil hectares cultiváveis no país, segundo os cientistas. Mas a perda de território por causa do mar é apenas uma das conseqüências das mudanças climáticas previstas pelos cientistas para Bangladesh. No norte do país, o problema maior seriam as secas. A previsão dos cientistas do país é de que a redução da umidade do solo obrigue os lavradores a abandonar os grãos tradicionalmente cultivados na região por não serem mais "economicamente viáveis". De acordo com o representante do Crescente Vermelho, Siffayet Ullah, no noroeste bengalês, agricultores foram forçados a abandonar o arroz pela batata, que necessita de menos água. No entanto, em dez anos, a previsão é de que nem batatas cresçam na região, o que obrigaria os lavradores a mudar mais uma vez a produção para espécies ainda mais resistentes, como o milho. O governo estuda espécies de arroz mais resistentes à salinidade para plantio em áreas afetadas pela elevação do nível do mar No plano de ações para enfrentar as mudanças climáticas do governo de Bangladesh, estão previstas pesquisas de variedades de grãos resistentes tanto a uma salinidade mais alta no solo quanto a períodos de seca prolongada. O governo prevê também auxílio para adaptar a agricultura em quase todo o país a mudanças como intensidade maior de enchentes relâmpago nas regiões norte e central do país, além de sistemas para adaptar as atividades pesqueiras em comunidades ribeirinhas que dependem de espécies de água-doce. Entre as estratégias do plano, estão também planos para levar água potável aos povoados próximos ao mar, já que o aumento da salinidade pode comprometer as reservas dessas áreas. Ao todo, o plano do governo bengalês tem 15 pontos com o objetivo de adaptar o país aos cenários previstos atualmente pela ciência. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.