Com duas manifestações que reuniram multidões em dois pontos diferentes da capital argentina nesta terça-feira, o governo da presidente Cristina Kirchner e os ruralistas retomaram a disputa após um período de trégua. Os protestos em Buenos Aires ocorreram um dia antes da votação no Senado da proposta do governo que prevê o aumento dos impostos sobre as exportações do setor agropecuário. O projeto de lei, que já foi aprovado no início do mês pela Câmara dos Deputados, é motivo de uma queda-de-braço entre o governo e o setor rural desde que foi lançado, em março. Segundo dados extra-oficiais divulgados pela emissora de televisão Todo Noticias (TN), o comício em apoio à medida, liderado pelo ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), marido de Cristina, reuniu 95 mil pessoas em frente ao Congresso Nacional. Entre a multidão, marcaram presença os "tocadores de bumbo" - homens que tocam o instrumento e são um símbolo dos protestos do peronismo. De acordo com a TN, 225 mil pessoas participaram da manifestação organizada pelos representantes do setor agropecuário, no bairro de Palermo. O protesto reuniu também políticos opositores de diversas legendas. "Já não é mais um protesto contra e outro a favor dos fazendeiros", disse o cientista político Roberto Bacman, do Instituto Ceop. "O setor rural passou a reunir os opositores ao governo." Kirchner Em um discurso de quase 30 minutos, o ex-presidente Kirchner fez fortes críticas aos ruralistas. "Quiseram destituir o governo nacional e popular (de Cristina)", disse o ex-presidente. "Damos a outra face, porque estamos em defesa do povo." O ex-presidente afirmou que o aumento de impostos permitirá que os argentinos não sofram com a alta dos preços dos alimentos no mercado internacional. Durante a longa disputa entre governo e ruralistas, Kirchner chegou a dizer que os ruralistas ficariam "de joelhos". Suas palavras provocaram uma resposta do presidente das Confederações Rurais Argentinas (CRA), Mario Llambias, no comício de apoio aos ruralistas desta terça-feira. "Disseram que nos queriam de joelhos. Mas essa multidão mostra que estamos firmes", disse Llambias. "Somos nós que podemos colocar a Argentina de pé." Apelo aos senadores Os líderes ruralistas fizeram um apelo aos senadores para que não aprovem o projeto de lei. "Legisladores nacionais, vocês têm a possibilidade de votar pelo povo", disse Alfredo di Angelis, da Federação Agrária da província de Entre Ríos, o primeiro a falar no comício de apoio ao campo. "Essa medida não pode ir adiante", disse o presidente da Sociedade Rural, Luciano Miguens. "É injusta, confiscatória e inconstitucional." Em seu discurso, o presidente da Federação Agrária Argentina, Eduardo Buzzi, se referiu a acusações feitas por Néstor Kirchner e recentemente também por Cristina. "Quem pode imaginar que queremos desabastecer os argentinos? Nos culpam pela inflação, pela baixa arrecadação e nos acusam de conspirar (contra o governo), o que não temos capacidade de fazer", disse Buzzi. Protestos Os protestos do setor rural argentino vêm sendo realizados desde março, quando o projeto de aumento de impostos foi lançado pelo governo, com alguns períodos de trégua. Historicamente, o setor agropecuário sempre foi o principal da economia argentina. Atualmente, o setor representa mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB). As manifestações já incluíram bloqueio de estradas e panelaços nas cidades e chegaram a provocar desabastecimento. Os protestos também motivaram a saída do ministro da Economia, Martín Lousteau, e são considerados a maior crise enfrentada por Cristina Kirchner desde que assumiu o poder, em dezembro passado. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.
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