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Às vezes, sinto uma nostalgia dos ideais que guiaram o surgimento das redes sociais, por volta do ano 2000. Como alguém que trabalha nesse meio desde os primeiros sites, no início de 1995, me pego analisando os mecanismos que levaram aqueles ambientes digitais idílicos e bem-intencionados a evoluírem para máquinas perfeitas de manipulação, criando as empresas mais poderosas da história.
Não dá para voltar para aquela realidade pueril, e isso nem faria sentido! Apesar do controle que essas plataformas exercem sobre nós, elas trazem mais benefícios que prejuízos. Pode-se até argumentar que "para se fazer uma omelete, é preciso quebrar os ovos". E bota ovo sendo quebrado nessas duas décadas!
Nosso desafio, em tempos de algoritmos de relevância e inteligência artificial, recai em aproveitarmos o que eles trazem de positivo, esquivando-nos das armadilhas digitais.
Há alguns dias, estudava o deus grego Hermes, filho de Zeus e da ninfa Maia. Considerado o mensageiro dos deuses, esse mito ajuda a entender como as redes sociais se tornaram tão importantes e, ao mesmo tempo, responsáveis por tantos problemas, e como essas empresas conseguem resistir a tentativas de regulamentação.
Hermes era essencial para o funcionamento do Olimpo. Além de possuir supervelocidade, era astuto e eloquente. Mas também trapaceava, seduzia e mentia, com um caráter dúbio. Tanto que também era o deus dos ladrões.
Zeus sabia dos delitos do filho, mas raramente o punia severamente. Na maioria das vezes, ele aproveitava suas habilidades em tarefas difíceis ou perigosas, que exigiam astúcia e inteligência.
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As redes sociais agem de forma semelhante. Tornaram-se essenciais para a sociedade, mas também disseminam desinformação, polarizam o debate público e deterioram a saúde mental dos usuários.
Como no mito de Hermes, a questão principal em torno delas não é sua existência, mas como lidar com sua moral ambígua. E as sociedades modernas se veem impotentes diante dos abusos das big techs, que operam com pouca ou nenhuma supervisão.
A mitologia nos ensina que não há mundo perfeito, mas que se pode buscar uma boa convivência com criatividade e tolerância. Infelizmente a sedução algorítmica das redes atrapalham isso, ao criar "bolhas" que nos isolam de quem pensa de forma diferente.
Zeus podia se dar ao luxo de tolerar os malfeitos de Hermes, por ter o poder para corrigir qualquer desequilíbrio que causasse. Nós não temos isso! Portanto, não podemos ser displicentes com essas plataformas.
Precisamos investir em educação midiática e digital, para que os cidadãos sejam menos suscetíveis ao seu controle. Mas essa é uma tarefa dificílima, justamente pela evolução exponencial desses algoritmos, impulsionados pela inteligência artificial.
Ao mesmo tempo, governos e órgãos judiciais precisam criar mecanismos de regulamentação dessas plataformas. Eles não devem impedir seu desenvolvimento, mas precisam proteger os cidadãos em primeiro lugar. Essas empresas devem ser corresponsáveis pelo mal que emana de conteúdos abusivos em suas páginas, e precisam obedecer amplamente aos princípios de transparência, explicabilidade e rastreabilidade de seus algoritmos.
Diante disso, é inviável cogitar o resgate daqueles sentimentos dos primórdios das redes sociais. Mas podemos querer algo melhor para o nosso mundo, em que não há ação divina interferindo nos abusos das big techs. Cabe às leis dos homens organizarem esse enorme poder, para que um "Hades digital" não reclame tantas almas para o seu submundo.
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