
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) proibiu, na terça da semana passada (2), que a Meta (empresa dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) usasse os dados de seus usuários para treinar sua plataforma de inteligência artificial. Mais que uma decisão administrativa pontual, esse movimento dispara um sério alerta e promove um debate importante sobre a privacidade de todos nós, algo que pode ser questão de vida ou morte para algumas pessoas.
Empresas dos mais diversos segmentos guardam um oceano de informações sobre seus clientes. Por mais que esses dados sejam trabalhados por elas e até essenciais para a oferta dos seus serviços, essas plataformas não são donas deles: pertencem aos indivíduos!
Ainda assim, as companhias respondem pela segurança dessa informação. Se acontecer algo ruim a partir dela, seja porque esses negócios abusaram desse poder, por um acidente e até mesmo por uma invasão, essas empresas devem ser responsabilizadas por isso.
Não se pode subestimar o potencial destrutivo de algo assim sobre a vida de uma pessoa. Além de enormes prejuízos morais e financeiros, um vazamento de dados pode causar danos permanentes aos indivíduos.
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Um exemplo emblemático aconteceu em agosto de 2015. Hackers invadiram o site de relacionamento extraconjugais Ashley Madison e baixaram todas as informações de seus usuários. Os criminosos ameaçaram divulgar tudo na Internet se o serviço não fosse descontinuado. Como a exigência não foi atendida, cumpriram a promessa.
Estava tudo lá: os nomes verdadeiros de 37 milhões de pessoas, seus cartões de crédito, com quem conversaram na plataforma, o que falaram e até as fotos que foram trocadas! Tudo organizado e buscável!
Para frequentadores de um serviço que promove traições, aquilo foi devastador! Tanto que há pelo menos dois casos de suicídio associados ao incidente.
O Ashley Madison sofreu consequências na época, como multas, mudança na sua liderança e um severo dano na sua reputação. Para um serviço que deveria primar pela segurança e discrição, sua tecnologia era amadora e o descaso com seus clientes, flagrante!
Apesar de tudo isso, ele continua funcionando até hoje, e com o mesmo slogan: "a vida é curta, curta um caso" (na versão brasileira). É uma situação bem melhor que as das pessoas que se mataram pelo vazamento de suas informações, sem falar nos incontáveis relacionamentos que podem ter chegado ao fim pelo mesmo motivo.
Esse tipo de problema é característico de uma sociedade cada vez mais digitalizada e de empresas e instituições que não respeitam seus clientes. Isso sequer existia há três décadas, quando a Internet comercial foi liberada. Mas hoje é um risco a que estamos submetidos continuamente, por mais corretos e cuidadosos que sejamos.
Para nosso desespero, o Brasil se tornou o "paraíso dos vazamentos de dados". De tempos em tempos, a mídia noticia que gigantescos volumes de informações pessoais foram expostos publicamente, incluindo registros sensíveis. Mas muito além disso, dados são copiados, usurpados ou traficados diariamente, sem que sequer fiquemos sabendo.
Dessa forma, fico muito feliz em ver esse movimento da ANPD cobrando da Meta seriedade e respeito aos seus próprios clientes. Isso demonstra um amadurecimento da agência e, por extensão, da sociedade.
Que isso inspire outras empresas, instituições e os próprios usuários a encarar esse problema de frente. Esse debate precisa ser entendido, ampliado e utilizado por todos.
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