Morador de Copacabana há 42 anos, desde que nasceu, o advogado Horácio Magalhães nunca foi de frequentar o Morro da Babilônia. A distância entre seu prédio, na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, e a favela é de cerca de 3 quilômetros, mas parecia bem maior até três meses atrás, quando a Unidade de Policiamento Pacificadora (UPP) se instalou por lá. A presença da polícia 24 horas pôs fim à venda ostensiva de drogas e à presença de traficantes armados nas ruas. E gente como Magalhães passou a se sentir segura para circular por ali. Há uma semana, o advogado integrou um grupo de 300 pessoas que participou de uma caminhada ecológica a 220 metros de altura. Foi a 10ª edição da caminhada, mas nunca tantos moradores da zona sul participaram. "Eu já tinha ido à favela para tratar de questões comunitárias, mas nunca até a parte mais alta. Com o morro pacificado, fui tranquilo", conta Magalhães, que preside a Sociedade Amigos de Copacabana.A sensação é justificável. Na mesma favela onde há pouco mais de um ano os tiroteios eram intensos, não há qualquer sinal de perigo. A Babilônia e o Chapéu Mangueira, morros vizinhos no Leme, têm a mais nova UPP do Rio. Em dezembro de 2008, a polícia havia ocupado o Dona Marta, a comunidade-modelo da UPP. A paz possibilitou que eventos que antes não subiriam o morro de Botafogo chegassem até lá. Neste fim de semana está sendo realizado o Red Bull Downhill Urbano no Dona Marta. A competição de mountain bike reunirá 16 atletas, que passarão com suas bicicletas sobre vielas, rampas montadas sobre casas e escadarias. É a primeira vez que um evento esportivo internacional tem como cenário uma favela. "A favela nunca foi um lugar proibido. Só que antes nenhuma empresa chegava aqui. É bom que esses eventos venham, mas ainda tem muita gente desempregada", pondera o rapper Fiel, liderança natural no Dona Marta. "Quando as pessoas dizem que o morro está tranquilo, eu não entendo dessa forma. A comunidade em si sempre viveu em harmonia."O fotógrafo Guillermo Planel, que é de Laranjeiras, sempre se sentiu bem-vindo na comunidade de Botafogo. Virou frequentador no ano passado, enquanto filmava o documentário Vivendo Um Outro Olhar, sobre fotojornalistas que trabalham em coberturas em favelas. Acabou por se tornar habitué do bar do Zé Baixinho, uma simpática birosca no morro. Acompanhado do filho, João Pedro, de 4 anos, ele continua indo lá, mesmo terminadas as filmagens, para tomar cerveja e bater papo. "É extremamente seguro. Não levo meu filho com uma orientação política ou filosófica, para que ele conviva com pessoas da favela, mas porque é natural." Amigo de Planel, o cientista político e jornalista Evandro Euriques, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), volta e meia está em outra comunidade livre da violência: a Tavares Bastos, no Catete. Lá, o que faz com que não haja traficantes pelas ruas é o quartel do Bope.Euriques tem amigos na Tavares Bastos e costuma visitá-los com a filha, de 10 anos. "Esse tipo de convívio é importante. Precisamos apagar esses fantasmas para reconstruir a cidade", afirma. "A ida da classe média à favela abre uma janela para a transformação social." Cezar Zerbinato, líder comunitário da Babilônia, acredita que, para muitos moradores do Leme e de Copacabana, o medo deu lugar à curiosidade. "As pessoas só tinham notícia ruim do morro. Agora, elas querem tirar 40 anos de dúvidas, mesmo morando aqui do lado. Era perto, mas era longe." Ele prepara, aos sábados, uma feijoada cujo tempero e preço (R$ 6) já desceram a Ladeira Ary Barroso, acesso à Babilônia. "Vem gente do Leme e de Copacabana comer na minha laje, com vista para o mar."Instalado há três anos numa espaçosa casa na Babilônia, o austríaco Matthias Lemprecht montou o Chill Hostel Rio, albergue com 11 quartos. Ele crê que, com a UPP, vá deixar de receber somente estrangeiros. "Acho que só agora os brasileiros vão passar a vir." Ele é casado com uma carioca de Copacabana. "Ela prefere o apartamento da Rua 5 de Julho. Eu prefiro ficar aqui do que em qualquer outro lugar."
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