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Na contramão da Fifa, Uefa proíbe venda de álcool em estádios

Comissão aprova consumo de cerveja na Copa de 2014; na Euro 2012, venda será proibida.

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Por Daniel Gallas

Enquanto a Fifa pressiona o Congresso brasileiro para permitir a venda de bebida alcoólica em estádios durante a Copa do Mundo de 2014, a Uefa segue o caminho oposto e proíbe a comercialização de álcool em seus eventos na Europa. Na terça-feira, a comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou o projeto da Lei Geral da Copa, que permite a venda de cerveja, em copos de plástico, em todos os setores dos estádios durante a Copa do Mundo de 2014. Nas áreas VIPs, outras bebidas alcoólicas serão comercializadas segundo o texto, que ainda depende de novas votações no plenário e no Senado e da sanção presidencial. A decisão é diferente da medida adotada pelos organizadores da Eurocopa deste ano, que será realizada na Ucrânia e na Polônia. A proibição à venda de bebidas está no estatuto de segurança adotado em 2006 pela Uefa - a entidade europeia de futebol que é responsável pela Eurocopa e por outros dos torneios mais lucrativos do mundo, como a Liga dos Campeões da Europa e a Liga Europa. A restrição vale apenas para eventos da Uefa. Fora do âmbito da entidade, cada país europeu trata a venda de bebida em estádios de forma diferente. Na Alemanha, a venda de bebida alcoólica é totalmente liberada em todos os jogos do campeonato nacional. Já na Itália, a comercialização é proibida em todos os jogos de futebol. A Inglaterra adota um sistema misto para a Premier League, que permite que torcedores bebam durante determinados períodos e em partes do estádio com visão restrita do gramado. Em tese, a venda de bebida é proibida em todos os jogos de futebol ingleses, mas os estádios recebem licenças especiais, que permitem a comercialização 15 minutos antes do começo do jogo, nos 15 minutos anteriores ao final do primeiro tempo e nos 15 minutos após o início do segundo. Diferenças Apesar de a Eurocopa e a Copa do Mundo serem eventos esportivos muito semelhantes, a Fifa e a Uefa adotam argumentos bastante distintos para defender posições opostas sobre a venda de álcool em estádio. Em uma audiência na Câmara dos Deputados, em novembro, o secretário-geral da Fifa, Jerome Valcke, disse que o consumo de bebida alcoólica em estádios nunca causou problemas em Copas do Mundo. Ele diz que a entidade tem uma parceria com a cervejaria Budweiser para venda controlada de cervejas nos estádios da Copa, o que significa que é obrigatório usar copos de plásticos. O professor de direito Geoff Pearson, da Universidade de Liverpool, avalia que a proibição da Uefa é baseada no senso comum de que bebida alcoólica leva à violência nos estádios e que é mais conveniente para a entidade estabelecer uma regra geral, em vez de analisar caso a caso. Pearson acrescenta que a diferença de postura entre a Fifa e a Uefa pode ser meramente um reflexo de opiniões distintas dos indivíduos que comandam os comitês de segurança de cada órgão. Mas ele não descarta a influência de interesses comerciais. "Pode ser que a cervejaria que patrocina a Liga dos Campeões seja muito menos 'institucionalizada' na Uefa, enquanto a patrocinadora da Copa do Mundo pode pensar: 'nós temos que pagar milhões de dólares para vocês, e nós não podemos nem vender nosso produto no seu estádio, porque você acha que isso pode gerar hooligans descontrolados'. Não seria o melhor tipo de marketing para uma cervejaria", diz Pearson. "Não tenho dúvida de que existe pressão comercial para permitir a venda de cerveja", acrescenta o professor de direito. Ele ainda aponta outro fator contraditório na política da Uefa. Em eventos como a Liga das Campeões, é permitido o consumo e venda de bebidas em áreas VIP e executivas. "Se você paga uma certa quantia pelo seu ingresso, eles confiam que você pode beber, mas um torcedor comum, não", argumenta. Soberania Pearson, que está lançando um livro sobre violência e torcedores ingleses, afirma que a relação entre álcool e violência nos estádios é uma questão cultural, e precisa ser definida por legisladores de cada país. No livro An Etnography of English Football Fans: Cans, Cops and Carnival, que será lançado ainda neste ano, o professor defende que não existe nenhuma prova de que a proibição à venda de álcool em estádios ingleses reduziu a violência no país. Nem mesmo a polícia inglesa pedia a proibição, afirma Pearson. Ele avalia que outras medidas - como marcar clássicos perto do meio-dia, dando pouco tempo no dia para os torcedores se embebedarem - foram mais eficazes para reduzir a violência no futebol inglês. Já na Escócia, a própria polícia pediu para que o álcool fosse proibido, o que segundo Pearson é um sinal de que a proibição pode ter ajudado a reduzir a violência lá. Um especialista britânico que está trabalhando em um projeto para alterar a legislação inglesa - liberando a venda de cerveja em estádios - concorda que cada país precisa analisar se, dentro da sua cultura, o álcool desempenha um papel importante na violência nos estádios. Mas ele diz que o esforço da Fifa para liberar a venda pode gerar um ônus maior para as autoridades brasileiras, que são responsáveis pela segurança durante a Copa do Mundo. "O comitê organizador da Copa e as autoridades brasileiras são responsáveis pela segurança nos estádios, não a Fifa", disse à BBC Brasil o especialista, que já trabalhou como consultor de segurança para a Uefa. "Como isso pode ser assim? A Fifa diz ao Brasil: 'vocês são responsáveis por segurança, mas vocês precisam vender cerveja nos estádios, querendo ou não'." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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