EntrevistaGustavo Loyola: sócio da Tendências Consultoria e ex-presidente do Banco Central
Ex-presidente do Banco Central (BC) Gustavo Loyola, considera que o mercado foi contaminado pelo otimismo do governo em relação à retomada da economia. Isso explicaria o descasamento tão grande entre as projeções para o PIB e o efetivo resultado do terceiro trimestre. "Está mais claro que o otimismo do governo era muito mais torcida do que informação", disse o economista, sócio da Tendências Consultoria, ao Estado. Segundo ele, a Tendências manterá a projeção de crescimento de 5% para 2010, mas vai recalibrar a estimativa para 2009, de avanço de 0,2% para recuo de 0,2%. Ele continua apostando em uma política monetária mais apertada no fim de 2010, com a eventual retomada da alta dos juros. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Porque o PIB veio tão distante das previsões?
Na Tendências, a previsão era de 1,6%. Veio distante, mas não tanto assim. O mercado como um todo, de fato, fez previsões muito otimistas. Talvez a explicação seja que o mercado foi contaminado pelo otimismo do governo, que - hoje está mais claro - era muito mais torcida do que informação. O mercado acreditava que, eventualmente, havia alguma informação de que o PIB estava mais forte. Acho que houve certa frustração nos números, mas sem que isso altere fundamentalmente as trajetórias previstas para 2010. No ano que vem teremos crescimento. Nossa previsão, de 5%, não será revista. O que os números mostraram é que a economia está se recuperando um pouco mais lentamente do que o previsto pela maioria. Mas alguns resultados foram positivos.
Quais?
A Formação Bruta de Capital Fixo em relação ao trimestre anterior. Embora o crescimento ainda seja lento, já há sinais de reversão. O resultado do PIB não alterou fundamentalmente as perspectivas para o ano que vem.
Nem em relação aos juros?
Os números mostraram que ficou mais remota a possibilidade de alta de juros já a partir do início do ano que vem, como previam alguns analistas. Nossa aposta já era de previsão de aumento de juros mais para o final de 2010, a partir de outubro. Mas uma parte importante do mercado antecipava o aumento, inclusive para o primeiro trimestre. Essas previsões ficarão um pouco fora de esquadro, porque a economia não está bombando como se imaginava. As previsões são consistentes: aquelas pessoas que esperavam que a economia estivesse crescendo mais esperavam que, com isso, o hiato do produto estivesse fechando, ou seja, a capacidade ociosa da economia estivesse sendo reduzida muito rapidamente e isso poderia gerar pressão inflacionária. Portanto, o Banco Central deveria agir de maneira antecipada. Aqueles que previam, como nós, uma recuperação um pouco mais lenta postergavam o efeito de fechamento do hiato mais para o final do ano.
É possível crescimento superior 5% no quarto trimestre para garantir resultado positivo no ano?
Dificilmente o PIB deste ano será positivo. Pode ficar próximo a zero, ou pouco abaixo disso. Uma previsão positiva ficou mais complicada. Nós, da Tendências, devemos rever nossa previsão, que era de ligeiro crescimento, de 0,2%. Vamos passar para encolhimento de 0,2%. A perspectiva de 2010 não muda, mas a de curto prazo, sim, porque nem há tempo de recuperar. Isso só seria possível se houvesse revisão desse terceiro trimestre.
Essas revisões tão acentuadas não colocam em xeque o próprio critério estatístico?
Revisões de PIB acontecem no mundo inteiro. Quando bem explicadas e dentro de uma certa lógica, indicam até seriedade no cálculo do PIB.