O Obama republicano

Senador Marco Rubio é o astro jovem do GOP e seus apoiadores garantem: ‘Yes, He Can’

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Por Carolina Rossetti
4 min de leitura

A corrida maluca republicana fez volta na Flórida e o senador Marco Rubio, que poderia ser um copiloto valioso para Newt Gingrich ou Mitt Romney, se retirou para as arquibancadas. “Não quero brincar de favoritos”, disse, em tom diplomático, o astro jovem do Tea Party, abstendo-se de apoiar publicamente um dos dois líderes na disputa das prévias. 

A estratégia foi interpretada por alguns como cálculo matuto deste que é considerado o menino prodígio do GOP e que nutre, diz-se, o sonho de ser o primeiro presidente americano de origem latina. Um Barack Obama para os hispânicos. Seus apoiadores garantem que “Yes, He Can”. Por hora, Rubio, aos 40 anos e em seu primeiro mandato no Senado, é candidato favorito para vice na chapa republicana, seja quem for o nomeado na convenção de Tampa Bay, em agosto. 

Na avaliação de analistas da imprensa americana, o apoio do jovem senador (com 51% dos votos dos latinos da Flórida) era decisivo para uma virada de Gingrich, que perdeu por 14 pontos, e segue para Nevada numa situação bem mais complicada, na traseira de um insuflado Romney. “Sr. Presidente, é hora de você sair do caminho”, disse Romney, depois do anúncio de sua vitória dessa semana. 

Praticamente um desconhecido dois anos atrás, Rubio foi alçado ao estrelato político com o discurso de restaurar a disciplina fiscal e reformar a torpeza moral de Washington (lembra alguém?). Calcula-se que o carisma do descendente de cubanos e representante da classe trabalhadora, se usado a favor de Romney, pode ser ímã potente para atrair eleitores independentes, alguns chateados com a declaração de imposto de renda de Romney. Ao que consta, Mitt contribui com menos da metade do americano médio e, agora, tenta desvencilhar-se dos rótulos de “elitista” e “presidente do 1%”.

Na semana em que o primeiro escalão do partido se digladiou com propagandas inflamatórias e táticas nada cristãs, Rubio recebeu elogios de Newt e Mitt, e sorriu para entrevistas. Numa conversa com a âncora do jornal da manhã da CNN, Soledad O’ Brien, o senador, de topete aprumado, jogou verde. “Não acho que vou ser convidado para vice. E estou focado no meu trabalho no Senado. Mas fico lisonjeado com suas palavras. Vou gravar isso e mostrar para minha mãe”.

Sempre que pode, ele fala da mãe. A trajetória da família Rubio é capítulo fundamental, e motivo de controvérsia, da narrativa política do senador, que construiu sua persona pública em quatro atos.

Um, pai de família responsável, casado com uma ex-líder de torcida do Miami Dolphins com quem tem quatro filhos. Dois, um self-made man, de origem humilde, batalhador, que trabalhou numa firma de advocacia de prestígio em Miami e só entrou no ensino superior graças a uma bolsa de atleta (ainda hoje ele sustenta ombros de jogador de futebol americano). Três, cristão praticante, contra o aborto e a pílula anticoncepcional. Quatro, e a pièce de résistance no maior eleitorado de origem cubana dos Estados Unidos, o “filho de exilados”. Slogan amplamente repetido na campanha para o Senado. 

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Marco Rubio é filho de Mario Rubio e Oria Garcia, que vieram de Havana em condições pouco confortáveis. O pai trabalhou como bartender em Miami. Ela, mãe dedicada de três filhos, fez bicos como doméstica e caixa na megaloja de departamentos Kmart. Em outubro, o jornal The Washington Post desenterrou os registros de entrada dos Rubios, mostrando que eles desembarcaram nos Estados Unidos em maio de 1956, dois anos e meio antes da revolução castrista e seis meses antes do nascimento do senador. Não em 1959. O fato, de aparente desimportância, ganhou proporções maiores por constranger o senador que gosta de dizer como os pais vieram aos EUA fugidos do comunismo, não apenas em busca de melhores oportunidades econômicas. Discurso que casava bem com o político conservador que se opõe à “anistia” aos imigrantes ilegais e defende a lei de imigração do Arizona. Como escreveu o articulista Ruben Navarrette, “Marco Rubio é o super-homem do Partido Republicano. E a questão da imigração, se não manejada com cuidado, é sua criptonita”.

Rubio tentou se defender. Argumentou que não estava, tecnicamente, errado, pois a família tinha intenção explícita de voltar para Cuba um dia, mas, com Fidel, isso se tornou impossível. “Sempre me baseei na história oral de minha família. Não em datas”, justificou, em nota. 

David Frum, figura histórica do Partido Republicano e ex-redator de discursos de Bush filho, deu uma puxada de orelha no menino. “Rubio exagerou. Foi pego. Deve corrigir o erro, não é o fim do mundo. Mas argumentar que a história é ‘essencialmente’ verdade abre uma porta que conservadores deveriam manter fechada. Lembrem-se, esse é o partido que diz se opor ao relativismo moral e ética oportunista”.

O artigo do Post despertou ainda um debate de mesmo nível intelectual visto no episódio “cadê a certidão de Obama?”. Para os ditos guardiões da Constituição, Rubio também não é americano legítimo, porque os pais foram naturalizados dez anos depois de seu nascimento. O site oficial de Rubio corrigiu a data de entrada da família no país, ignorou totalmente o frágil argumento dos “birthers”, e deixou o mal-estar se dissipar. Tudo indica que ele superou o incidente e hoje é quase unanimidade entre os republicanos.

Rubio é tido como um dos quadros mais promissores da ala jovem do Grand Old Party, mas seus defensores na mídia americana, aconselham: mais cuidado com a ficção da história familiar e atenção aos deslizes financeiros. (Ele atrasou cinco meses do pagamento da hipoteca e quase perdeu a casa em Tallahassee, além de acumular US$ 16 mil no American Express do partido em gastos pessoais que incluíram o conserto do minivan da família e um corte de US$ 134 num barbeiro de luxo em Miami). Assim parece que o consenso em torno da nomeação do jovem senador da Flórida, elogiado por moderados e conservadores, para ser o número 2 ou, quiçá, o número 1 da Casa Branca, depende apenas de sua capacidade de amadurecer. 

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