Novo escândalo na Segurança Pública de São Paulo levou à prisão do delegado Robert Leon Carrel, um dos mais importantes chefes do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de São Paulo. Em meio à investigação sobre a máfia das carteiras de habilitação que agia no departamento, Carrel foi acusado em outro caso: o desvio de centenas de quilos de cocaína da época em que trabalhava no Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc). A decisão da Justiça amplia a crise em que se encontra a Polícia Civil, sacudida nos últimos 40 dias pelos escândalos dos achaques ao Primeiro Comando da Capital (PCC) e pelo caso da máfia das carteiras. Carrel estava sob investigação desde o começo do ano, quando o Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) recebeu um laudo que atestava o desvio da droga. Na época, o governador José Serra (PSDB) determinou ao secretário da Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, que o delegado fosse afastado do cargo, o que ocorreu em 23 de janeiro. Na época, o delegado ocupava a Divisão de Licenciamentos do Detran. Carrel ficou afastado até março. Antes que as investigações sobre o desvio de cocaína fossem concluídas, ele foi nomeado para dirigir outra divisão do Detran. Desta vez, assumiu a Divisão Renach, que cuida do registro de carteiras de habilitação. Entre suas funções estava cuidar do bloqueio e desbloqueio de carteiras de motoristas e de sua pontuação. Antes de começar a trabalhar no Detran, em 2006, Carrel permaneceu dez anos no Denarc, onde ficou conhecido pelos casos envolvendo a máfia nigeriana e os cartéis colombianos. O crime de que é acusado envolve o desvio de 200 quilos de cocaína de um cartel colombiano, apreendidos em Itu. A denúncia do Gaeco, acolhida na íntegra pela juíza Maria de Fátima de Oliveira, da 29ª Vara Criminal, afirma que Carrel, o delegado Luiz Henrique Mendes de Moraes e os investigadores Cleuber Gilson Bueno e Ricardo Ganzerla se apropriaram da cocaína na sede do Denarc, em 24 de setembro de 2003. Todos foram presos ontem. A droga tinha alto grau de pureza. Os policiais levaram a droga a uma casa em Santos, usada como depósito pelo grupo. Segundo os promotores, os policiais passaram a distribuir a droga para pequenos e médios traficantes no interior. Uma parte chegou a ser enviada para o exterior em navios. Os quatro policiais, de acordo com o Gaeco, passaram-se por integrantes de uma quadrilha local e iniciaram tratativas com diversos narcotraficantes estrangeiros - a maioria era colombiana. "Agindo como se estivessem legalmente infiltrados, adquiriram, num espaço de nove meses, paulatinamente a confiança dos criminosos, para convencê-los a trazer cocaína colombiana pura para aquisição", diz a denúncia. Sem autorização judicial para a infiltração, eles estabeleceram uma rotina de trabalho. Aos investigadores cabia a manutenção de contatos diários com traficantes, entre eles o americano Jacques Pierre Hernandes Delanoy. Os bandidos eram acompanhados no Brasil e no exterior. Carrel e o delegado Luiz Henrique apareciam "somente nos momentos mais críticos, para a negociação da compra da cocaína", como se fossem "donos do tráfico". Nos encontros, o grupo exibia malas com milhões de dólares aos colombianos como garantia. O traficante americano, convencido pelos policiais, trouxe 300 quilos de cocaína para São Paulo. Ele pousou no aeroclube de Itu, pilotando um Cessna Centurion 210, em companhia do traficante Mário de Jesus Alves da Silva. Foi nesse momento que os dois foram detidos por policiais do Denarc. Além deles, outros dois traficantes foram presos. No avião havia, segundo Delanoy, 330 quilos de cocaína. Mas, no auto de apreensão da droga, constaram apenas 98 quilos. Um ex-investigador contou ao MPE que 100 quilos foram desviados antes da chegada ao Denarc. O restante foi retirado depois da divulgação do caso para a imprensa. SEM ARREPENDIMENTO O diretor do Detran, delegado Ruy Estanislau Silveira Mello, contou que chamou Carrel de volta ao Detran depois de receber da Corregedoria "uma comunicação formal de que ele havia sido inocentado". Mello disse não estar arrependido de ter chamado o colega para um novo cargo e afirmou não ver motivos para investigar sua atuação no Detran.
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