No ano em que completa 30 anos de existência, o Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que começava a analisar a necessidade de se reestruturar, se modernizar e de reavaliar as metas, terá agora de fazer isso de qualquer maneira. Essa é a análise de alguns pesquisadores ouvidos pela reportagem que vêm realizando pesquisas na região.
A Estação Comandante Ferraz, destruída ontem em um incêndio, abrigava somente uma parte das pesquisas brasileiras realizadas na região, mas servia ao menos como apoio para outras e principalmente tinha um papel político importante por ser a única base brasileira no local. A avaliação dos cientistas é que é fundamental ter um espaço como esse na região e que talvez seja caso de aproveitar a oportunidade para repensar como ela deve ser feita.
"A estação não estava suprindo a demanda.
Poderiam pensar em fazer uma nova estação no continente, não na ilha, como era agora", opina o físico Newton La Scala Jr., da Unesp de Jaboticabal. Ele colabora com um grupo liderado pela Universidade Federal de Viçosa que analisa o solo antártico a fim de medir quanto de gás carbônico hoje aprisionado no gelo pode ser emitido com um eventual derretimento provocado pelo aquecimento global.
Esse tipo de trabalho, particularmente, não depende muito da estação. Para fazer as coletas, a equipe segue de navio até o local de estudo e depois acampa por lá. Mas eventualmente os cientistas contavam com algum apoio da base. Colaboradores que estavam em navios no continente estão também voltando para o Brasil.
Outros estudos também são mais independes, como os de glaciologia. O pesquisador Jefferson Simões, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e líder da expedição "Deserto de Cristal" - a primeira missão brasileira a penetrar o interior do continente -, estima que algo entre 35% e 40% das pesquisas brasileiras feitas na Antártida vinham sendo realizadas na própria estação. Mas a maior parte não depende dessa logística e talvez não sejam interrompidas. "A Estação Comandante Ferraz não é o Programa Antártico Brasileiro. A perda da estação é uma catástrofe, a maior tragédia que o programa já sofreu, mas ele continua", afirma.
Por outro lado, pesquisas de biodiversidade de peixes e aves e de biociência em geral, medidas de ozônio e principalmente os monitoramentos meteorológicos feitos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) ao longo do ano serão prejudicados. As pesquisas feitas sob o chapéu do INCT-Antártico, coordenado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, e que avaliam, entre outras coisas, o impacto das mudanças globais, naturais e antrópicas no meio ambiente marinho antártico, também devem ser paralisadas.