Trauma pós-guerra ensina alunos no ABC

Professoras usam história de brasileiro que lutou no Afeganistão para estimular aprendizado de jovens

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Por Fernando Otto
2 min de leitura

Quando voltou do Afeganistão, Mauricio Moreira, brasileiro naturalizado americano, não pôde levar seu cão e "assistente" Renegade, mas não desistiu do amigo. As professoras Mary Zanin e Mirian Sofiatti usaram a história da dupla para desenvolver o o projeto Uma História de Vida: Ouvir, Entender e Reescrever, que introduz temas como religião, direitos humanos e interpretação de textos a crianças com necessidades especiais. "Nós apresentamos a história a eles e perguntamos: 'Será que nós podemos ajudar?'", explica Mary, professora do Colégio Metodista de São Bernardo do Campo na Grande São Paulo. Desde maio, dez alunos do curso regular da escola frequentam aulas fora do horário normal focadas nas crianças com dificuldade de aprendizado. "Temos alunos portadores de dislexia, distúrbio do déficit de atenção e hiperatividade, que precisam do conteúdo passado de uma forma diferente", diz a orientadora psicopedagógica Keila Araújo. As professoras propõem aos alunos que montem uma apresentação de slides que reconte a história de Mauricio e Renegade para ajudá-lo a superar o trauma pós-guerra. Até temas como biologia são abordados: Mirian usa o período em que o cão teve de ficar em observação no Paquistão para lecionar sobre transmissão de doenças. "Quando eles começam alguma coisa, vão com dedicação total", diz. Ao fim do projeto, os alunos mandaram por e-mail as apresentações para Mauricio, "É incrível ver como um cachorro pode fazer tudo isso", admira-se ele.Renegado. Aos 2 meses e ainda sem nome, Renegade, cachorro de raça não definida, ainda pertencia ao Exército afegão. Ele seguiu o Platoon Renegade (pelotão de Mauricio) em uma patrulha pelas ruas de Kandahar, segunda maior cidade afegã, e foi adotado. O cão ficava solto mas, por vontade própria, passou a acompanhar as missões do batalhão. Mauricio era o "squad leader", militar que anda à frente da tropa para fugir das minas terrestres. Quando previa perigo, ele mandava o companheiro andar na frente. "Era difícil, mas necessário", diz. Seguindo o caminho traçado pelo cachorro, a tropa nunca foi atingida por nenhum ataque. Em julho de 2011, a missão de Mauricio no Afeganistão terminou e, com isso, ele teve de deixar o cão lá. Após um mês de trabalho, ele recorreu à ONG Puppy Rescue Mission, especializada em resgates de animais. Eles arrecadaram US$ 3,5 mil em doações e trouxeram Renegade de volta.O cão ficou cinco horas em um táxi para Cabul, a capital afegã. De lá, voou para o Paquistão, onde passou por três dias de quarentena até rumar para Nova York. "Quando fui buscá-lo no aeroporto, ele tinha quebrado a porta da gaiola. Os carregadores estavam com medo, por isso tive que buscá-lo dentro do bagageiro" lembra. Hoje, Mauricio recruta soldados para o Exército no Texas. "É estranho olhar para ele hoje e lembrar de tudo que já passamos", diz Mauricio, que não planeja voltar ao Brasil.