Uma aposentada que ficou milionária. Uma criança que sobreviveu ao segundo transplante. Adultos que aprenderam a ler. Um ex-detento que conseguiu emprego. Um executivo que se tornou psicanalista. Essas histórias foram vividas em 2009 por pessoas comuns, dessas que não costumam aparecer no noticiário nem são reconhecidas por aí. A santista Adilea Barros de Sá, por exemplo, ficou rica aos 68 anos. Viúva e mãe de dois filhos, ela comprou um carro Chevrolet Meriva e acabou sorteada pelo programa Nota Fiscal Paulista - criado pelo governo do Estado para combater a sonegação fiscal. Seu prêmio, recebido no dia 17, foi de R$ 1 milhão. Nervosa, ela compareceu à cerimônia de entrega mas não quis conversar com a imprensa.Riqueza não é o motivo da alegria do pequeno carioca Kauã Nogueira de Paula, de 6 anos. Enquanto sua mãe conversa com a reportagem, ele corre, irrequieto, para cima e para baixo no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas (HC). "Antes, busquei vários hospitais do Rio e não conseguia descobrir qual era o problema", conta a mãe, Gisele Nogueira Pacheco, de 28. As constantes dores de barriga do menino eram causadas por cirrose hepática. Desde 2005, mãe e filho praticamente se mudaram para São Paulo - ficam na casa de um tio, no Bom Retiro - para que o tratamento fosse feito no HC. Há três anos, Kauã fez o primeiro transplante, de fígado. Em seguida, os rins começaram a apresentar problemas. Novo tratamento, novo transplante, em 28 de novembro deste ano. "Agora ninguém mais me segura", diz Kauã, eufórico. Mas como os universos particulares são tão distintos em uma mesma cidade, é preciso lembrar que, se Kauã já lê e escreve, muitos adultos não têm tal habilidade. Alguns correm atrás do tempo perdido. Só a organização AlfaSol atendeu, em 2009, 2 mil paulistanos nessa situação - foram 98 mil em todo o Brasil. Gente como a doméstica pernambucana Gersina Felipe dos Santos, de 60 anos, e seu colega de turma, o servente de pedreiro baiano Constantino Cardoso Macena, de 41 - ambos moradores da região do Capão Redondo, zona sul. "Agora consigo pegar um ônibus sem ter de pedir ajuda", diz ela, feliz pela conquista pessoal. "Tudo o que sempre quis na vida era aprender a ler", conta ele. TUDO NOVOPara o vendedor autônomo paulistano Elias (nome fictício, a pedido dele), 2009 ficará marcado como o ano da volta por cima. Perto de completar 60 anos, ele saiu da prisão - onde ficou por 3 anos, por envolvimento com drogas - e já está trabalhando. No período em que esteve detido em uma penitenciária do interior paulista, acabou se tornando voluntário, como professor dos colegas. "Isso me fez ganhar o respeito deles", afirma. "Virei um paizão na cadeia."Também é de mudanças - embora bem diferentes - a história do psicanalista paulista Osório Roberto dos Santos, de 58 anos. Mudanças que começaram há dez anos, quando ele pediu demissão do ABN Amro Bank, do qual era diretor executivo. "Na época, financeiramente foi ruim. Mas passei a fazer mais com o que eu ganhava", lembra. "Antes, precisava comprar muitas coisas para compensar minha ausência em casa." Tornou-se psicanalista, com uma clínica nos Jardins. Mas a consolidação da mudança só veio em agosto deste ano: inaugurou em Embu, na Grande São Paulo, em uma chácara de 8 alqueires na qual investiu R$ 10 milhões, um espaço para receber grupos de pacientes. Arrependeu-se da guinada na carreira? Jamais. "O que estressa o ser humano é o desprazer da luta contra o tempo", filosofa. "Em minha atual atividade, não tenho isso. A agenda e a forma como eu lido com o trabalho são espontâneas."