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Está em consulta pública até 27/3 uma nova resolução da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) com mudanças no atendimento a pessoas com deficiência, identificadas no texto como passageiros com necessidade de assistência especial. E uma audiência pública sobre o tema está prevista para 13/3.
Dois pontos da proposta se destacam: a alteração do conceito sobre quem é esse passageiro com necessidade de assistência especial, chamado de PNAE, e a permissão à empresa aérea de decidir de maneira unilateral qual pessoa com deficiência tem autonomia e independência para viajar sozinha. A Anac também quer dar ênfase à importância da informação prévia por parte dos passageiros, das companhias e dos aeroportos.
Conceito - A resolução estabelece que (artigo 3) "passageiro com necessidade de assistência especial (PNAE) ao serviço de transporte aéreo é entendido como qualquer pessoa que, por alguma condição específica, tenha limitação na sua autonomia ou mobilidade como passageiro e que requeira assistência especial", ou seja, toda e qualquer pessoa que se apresente com essas características.
É fundamental ressaltar aqui que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (n° 13.146/2015) considera pessoa com deficiência (artigo 2) "aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas". Isso significa que, para a atual legislação brasileira, a pessoa com deficiência tem direito garantido à acessibilidade que garante a sua cidadania e não é responsável pela construção e oferta desses recursos.
Contraditório - No trecho que trata da autonomia e da independência do passageiro com necessidade de assistência especial, a proposta da Anac é, no mínimo, preocupante, além de contraditória.
A resolução afirma que esse passageiro com necessidade de assistência especial (artigo 14) "possui autonomia e livre arbítrio acerca de seus próprios cuidados pessoais, cabendo-lhe a decisão de viajar desacompanhado ou acompanhado", (artigo 15) "o transportador aéreo não pode restringir o transporte desacompanhado sob alegação de incapacidade dos próprios cuidados pessoais, podendo ser exigida autodeclaração assumindo plena responsabilidade por esses cuidados", e a pessoa (artigo 17) "com condição severa de limitação de autonomia ou mobilidade é impedida de viajar desacompanhada por avaliação do transportador aéreo sempre que, (item III) em virtude de limitação motora severa, não esteja apto a participar fisicamente da sua própria evacuação da aeronave em caso de emergência".
Como isso funcionaria na prática? Uma pessoa paraplégica que usa cadeira de rodas, por exemplo, pode ter autonomia para fazer tudo sozinha, inclusive entrar em sair do aeroporto e do avião pelos meios de acessibilidade exigidos por lei, fazer a própria movimentação entre a cadeira de rodas e a poltrona do avião, e não precisa de nenhum acompanhante. Alguém com amputações e que usa, ou não, próteses, também pode ser plenamente capaz de se cuidar sozinha. Um indivíduo que se locomove apoiado em muletas também pode ser independente. Então, quais seriam os critérios para determinar essa "limitação motora severa"?
Nesse sentido, a sequência da resolução estabelece que (artigo 19) "o passageiro é responsável pela informação prévia ao transportador aéreo acerca de sua aptidão e saúde física e mental para realização de voo", mas esse passageiro pode ter o embarque impedido se (item IV) "causar perigo ou desconforto a outros passageiros devido sua condição física ou comportamental".
Especialmente neste trecho, a proposta da Anac mostra-se capacitista e discriminatória. Qual "perigo ou desconforto" uma condição física pode gerar a outros passageiros?
Anac responde - Pedi explicações à Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac declarou que não há agenda para porta-voz no momento e enviou informações por escrito.
"A abertura da consulta, em 24 de janeiro, e a realização de audiência pública, em 13 de março, para a discussão das propostas de revisão da Resolução nº 280/2013, têm o propósito de levar o assunto para debate e propor aprimoramentos para o regulamento. O objetivo é escutar a sociedade civil, pessoas com deficiência e seus representantes, setor de aviação civil, empresas e especialistas com vistas a aprimorar a regulação e assegurar que passageiros com necessidade de assistência especial tenham condições de viajar com independência e dignidade, reduzindo barreiras e fortalecendo soluções que promovam a autonomia dos usuários do transporte aéreo
A proposta normativa de atualização da Resolução nº 280 da Anac reforça que passageiros com necessidades de assistência especial devem informar previamente suas condições à empresa aérea, possibilitando uma análise detalhada para providenciar assistência personalizada. Além disso, os transportadores aéreos devem providenciar informações e comunicação de forma acessível.
Nos casos em que o transportador aéreo não autorizar a viagem desacompanhada devido a limitações graves de autonomia ou mobilidade, como, por exemplo, passageiros com dificuldades motoras graves ou com severo Transtorno do Espectro Autista (TEA), que impossibilite a compreensão das instruções de segurança de voo e for indispensável a presença de um acompanhante (assistente de segurança operacional), a proposta normativa prevê a isenção do custo total da passagem desse assistente, com exceção da tarifa de embarque.
A construção da proposta contou com a colaboração de usuários, agentes do setor aéreo, órgãos de promoção dos direitos das pessoas com deficiência e unidades técnicas da Anac. Esse processo busca assegurar que a regulação atenda de forma abrangente as necessidades de todos os envolvidos e seja um marco na promoção da acessibilidade e da inclusão no transporte aéreo.
A Anac ainda enfatiza a importância da participação da sociedade neste processo, tanto por meio do envio de contribuições para a consulta pública, disponível na plataforma Participa+Brasil, quanto por participação direta na audiência pública de 13 de março".