Em tempo recorde, a Assembleia Nacional venezuelana, dominada quase totalmente por partidos que apoiam o presidente Hugo Chávez, aprovou na quinta-feira à noite uma reforma da lei sobre expropriações que tem como objetivo dar valor legal à estatização da rede franco-colombiana de hipermercado Êxito. Pela nova norma, apresentada pelo Instituto de Defesa das Pessoas no Acesso a Bens e Serviço (Indepabis), uma espécie de agência reguladora de expropriações vinculada ao Executivo, a expropriação de qualquer bem poderá ser efetuada sem que o Parlamento declare sua condição de "utilidade pública"."A cadeia Êxito não vende apenas alimentos ou outros produtos de necessidade, mas também uma série de bens de consumo, como TVs, geladeiras, fogões, brinquedos, que não poderiam ser considerados como artigos de utilidade pública", declarou ao Estado o economista da Fundação de Defesa Liberal da Venezuela, ligada à oposição, Rafael Barríos. "Mais uma vez, a máquina chavista altera o ordenamento jurídico para favorecer uma ação de Chávez."A rede Êxito, que tem seis lojas espalhadas pela Venezuela, foi expropriada por decreto no domingo, sob a acusação de aumentar preços controlados e especular com a sonegação de mercadorias após a decisão de Chávez, no dia 8, de alterar a cotação oficial do bolívar forte, que passou a ter dois valores: 2,60 por US$ 1, para negociações de artigos essenciais, e 4,60 por US$ 1, para os demais produtos e serviços. Antes, a cotação era de 2,15 bolívares fortes por US$ 1."Ainda não está clara a definição do que é ou não é produto essencial", explicou o economista. Temendo uma alta de preços generalizada, os venezuelanos lotaram o Êxito nos últimos dias para comprar todo o tipo de produto.MERCADOSA norma aprovada pela Assembleia Nacional também estabelece que técnicos do Indepabis terão a atribuição de estabelecer o valor da indenização correspondente ao bem apropriado. Antes, o valor era fixado pelo Judiciário, por meio de laudos técnicos.O governo esclareceu ontem que a administração do Êxito será entregue a uma recém-criada entidade estatal, a Corporação de Mercados Socialistas, Comerso. A PDVAL e a PDVSA Agrícola deverão prover a Comerso com mercadorias. As duas empresas são subsidiárias da estatal Petróleos de Venezuela S.A., cujos recursos têm sido desviados para o financiamento das políticas sociais de Chávez - ao custo, segundo vários especialistas, da redução de sua capacidade de investimento e produção de petróleo.O grupo francês Casino, sócio majoritário do Êxito, negou que as filiais venezuelanas tivessem adotado práticas especulativas. Em uma das lojas da rede em Caracas, porém, o movimento era rotineiro, exceto pela presença de soldados da Guarda Nacional do lado de fora. "Nosso trabalho segue normalmente e não houve nenhuma mudança em nossos procedimentos ou alguma ordem diferente do normal emitida por nossos diretores", disse o gerente, que se identificou apenas como Jorge.MARCHAO ministro do Interior venezuelano, Tarik al-Aissami, declarou ontem que apenas a Polícia Nacional, a Guarda Nacional e a Polícia do Estado de Miranda - onde fica Caracas - estão autorizadas a atuar durante as marchas de hoje, que serão promovidas pela oposição e pelo Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV, de Hugo Chávez). As demais forças policiais, principalmente as metropolitanas de Chacao e Libertador - distritos de Caracas considerados Estados -, só poderão agir em suas jurisdições na organização do caótico trânsito da capital. Aissami disse ainda que nenhum policial envolvido na segurança das marchas poderá portar armas de fogo. Além disso, o ministro estabeleceu uma lei seca durante o período das marchas e suspendeu o porte de armas dos participantes. Ambas as passeatas começam hoje às 9 horas (11h30 de Brasília) e grupos chavistas e opositores devem se encontrar em alguns pontos da cidade.
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