Há aproximadamente dois mil anos, o Império Romano estava florescendo. Mas algo sinistro pairava no ar. Literalmente.
Uma poluição generalizada na forma de chumbo atmosférico estava afetando a saúde e a inteligência, relataram pesquisadores na semana passada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.
Durante cerca de dois séculos, a partir de 27 a.C., um período de relativa estabilidade e prosperidade conhecido como Pax Romana, o império se estendia por toda a Europa, Oriente Médio e norte da África. Sua economia dependia da cunhagem de moedas de prata, o que exigia enormes operações de mineração.

No entanto, extrair prata da Terra produz muito chumbo, disse Joseph McConnell, cientista ambiental do Desert Research Institute, um grupo sem fins lucrativos baseado em Nevada (EUA), e o principal autor da nova pesquisa. “Se você produzir uma onça (unidade de medida que equivale a 28,35 gramas) de prata, teria produzido algo como 10 mil onças de chumbo.”
E o chumbo tem uma série de efeitos negativos no corpo humano. “Não existe um nível seguro de exposição ao chumbo”, disse Deborah Cory-Slechta, uma neurotoxicologista do Centro Médico da Universidade de Rochester que não esteve envolvida na pesquisa.
McConnell e seus colegas agora detectaram chumbo em camadas de gelo coletadas na Rússia e na Groenlândia que datam da época do Império Romano. O chumbo entrou na atmosfera a partir das operações de mineração romanas, pegou carona em correntes de ar e eventualmente caiu da atmosfera como neve no Ártico, supõe a equipe.
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Os níveis de chumbo que McConnell e seus colaboradores mediram eram extremamente baixos, aproximadamente uma molécula contendo chumbo por trilhão de moléculas de água. Mas as amostras de gelo foram coletadas a milhares de quilômetros do sul da Europa, e as concentrações de chumbo teriam sido altamente dispersas após uma jornada tão longa.
Para estimar a quantidade de chumbo originalmente emitida pelas operações de mineração romanas, os pesquisadores trabalharam de forma reversa: usando poderosos modelos computadorizados da atmosfera do planeta e fazendo suposições sobre a localização dos locais de mineração, a equipe variou a quantidade de chumbo emitido para corresponder às concentrações que mediram no gelo.
Em um caso, eles assumiram que toda a produção de prata ocorria em um local de mineração historicamente importante no sudoeste da Espanha conhecido como Rio Tinto. Em outro caso, presumiram que a mineração de prata estava igualmente distribuída por dezenas de locais.
A equipe calculou que de 3.300 a 4.600 toneladas de chumbo eram emitidas na atmosfera a cada ano pelas operações de mineração de prata romanas. Os pesquisadores, então, estimaram como todo aquele chumbo seria espalhado pelo Império Romano.

“Executamos o modelo na direção correta para ver como essas emissões seriam distribuídas”, disse McConnell.
Com essas concentrações de chumbo na atmosfera em mãos, os pesquisadores usaram dados dos dias modernos para estimar quanto chumbo teria entrado na corrente sanguínea das pessoas na Roma antiga.
McConnell e seus colegas se concentraram em bebês e crianças. Os jovens são particularmente suscetíveis a absorver chumbo do ambiente por meio da ingestão e da inalação, disse o Dr. Bruce Lanphear, médico de saúde pública da Universidade Simon Fraser na Colúmbia Britânica que não esteve envolvido na pesquisa.
Nas últimas décadas, os níveis de chumbo no sangue das crianças foram correlacionados com uma série de métricas de saúde física e mental, incluindo QI, disse Cory-Slechta. “Temos dados reais sobre os escores de QI em crianças com diferentes concentrações de chumbo no sangue.”
Usando essas relações dos dias modernos, McConnell e sua equipe estimaram que as crianças em grande parte do Império Romano teriam cerca de 2 a 5 microgramas adicionais de chumbo por decilitro de sangue. Tais níveis correspondem a declínios de QI de aproximadamente 2 ou 3 pontos.
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Para comparação, as crianças americanas nos anos 1970 tinham aprimoramentos médios nos níveis de chumbo no sangue de cerca de 15 microgramas de chumbo a mais por decilitro de sangue antes da eliminação gradual da gasolina com chumbo e das tintas com chumbo. Seu correspondente declínio médio de QI foi de cerca de 9 pontos.
Mas a exposição ao chumbo teria tido outros efeitos negativos nos romanos também. Níveis mais altos de chumbo no sangue também foram vinculados a maiores incidências de partos prematuros e funcionamento cognitivo reduzido na velhice. “Isso te segue ao longo da vida”, disse Lanphear.
Alguns estudiosos desenvolveram a hipótese de que o envenenamento por chumbo desempenhou papel importante no declínio do Império Romano. Mas essa ideia tem sido questionada, pelo menos no que diz respeito à água contaminada por tubulações de chumbo. Um estudo de 2014 mostrou que, embora as tubulações usadas para distribuir água em Roma aumentassem os níveis de chumbo, era improvável que a água fosse verdadeiramente prejudicial.
Esses novos achados fazem sentido, disse Hugo Delile, geoarqueólogo do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, que não esteve envolvido na pesquisa. “Eles confirmam a extensão da poluição por chumbo resultante das atividades de mineração e metalurgia romanas.”
De acordo com McConnell, a pesquisa também confere uma honra duvidosa à mineração romana. “Até onde sei, é o exemplo mais antigo de poluição industrial generalizada.”
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