
“Para mim, trazer beleza ao mundo é quase um ato político.” A frase define o impulso criativo de um dos artistas franceses mais celebrados da atualidade, Jean-Michel Othoniel. O artista vem construindo, com vidro e luz, uma obra marcada pela delicadeza, escala e envolvimento físico do espectador. Sua mais recente exposição no Brasil, em cartaz no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, até dia 26, reafirma esse compromisso com a presença: “Gosto da potência de ocupar espaços grandes com obras leves, feitas de materiais frágeis e luminosos. Quero que as pessoas se sintam atravessadas”, afirmou em entrevista exclusiva à coluna em seu ateliê nos arredores de Paris.
Arte como esperança: Jean-Michel Othoniel, o francês que desenha ondas com tijolos de vidro
Artista francês está em cartaz no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, até dia 26
Esse desejo de criar experiências sensoriais atravessa décadas de trabalho, em ateliês na França e na Índia, onde são fabricados os tijolos de vidro que marcam sua produção atual. “Tenho obsessão pela escala. Gosto da relação corpo-espaço, gosto do público dentro da obra”, diz ele. Mais do que impactar pela monumentalidade, o artista busca criar atmosferas de suspensão, silêncio e movimento. “A arte precisa ser sensorial. Em tempos de inteligência artificial, é urgente trazer as pessoas de volta ao mundo real. Quero que se reconectem ao que é físico.”
O uso do vidro, que começou na década de 1990, tornou-se uma assinatura. “É um material sensual, vivo, que reflete a luz, cria sombras, muda com o tempo do dia”, afirma. Os tijolos usados em suas esculturas e instalações vêm de Firozabad, cidade indiana próxima ao Taj Mahal, onde ainda são produzidos com técnicas milenares. “São soprados como há dois mil anos, no chão, com instrumentos antigos. Cada um é diferente. São únicos.”
Além do MON, onde expõe pela primeira vez, o artista se prepara para uma série de mostras que ocuparão dez museus em Avignon, na França em 2025, com mais de 240 obras. Também está à frente de um projeto inédito nos jardins de Versalhes, onde assina uma instalação permanente, a primeira desde o século XVI. “Ganhamos uma competição com 180 participantes. Levamos quatro anos desenvolvendo esse projeto. Como artista francês, ter uma obra permanente em Versalhes é talvez o maior desafio — e a maior honra — da minha vida.”
A relação com o Brasil é antiga. Sua primeira vinda foi nos anos 2000, para uma coletiva no CCBB do Rio de Janeiro. “Fui ao estúdio do Oscar Niemeyer, ele tinha 96 anos. Foi impactante. A vista era para o mar, o céu, as estrelas”, lembra. Desde então, estreitou vínculos com a arte e a paisagem brasileiras, e afirma ter uma admiração especial por nomes como Tarsila do Amaral e Lygia Clark. “Quando cheguei ao Brasil, senti a força da terra. Mesmo em São Paulo, essa energia está presente. É impressionante.”
A obra do artista também tem transitado por outras linguagens e públicos. Em colaboração com arquitetos e marcas de moda, ele desenvolveu peças que aproximam o espectador da arte em seu cotidiano. “Fiz uma edição limitada para a Dior, um frasco de perfume, e pensei: minha obra está no banheiro das pessoas. É uma relação nova, íntima. É outro tipo de presença.” Em tudo, permanece o mesmo propósito: criar espaços de pausa e contemplação em um mundo acelerado. “A beleza é uma mensagem de esperança. E precisamos disso.”