Acesso à verdade é o maior bem que temos hoje

O diretor Ridley Scott fala ao Estado sobre Rede de Mentiras e das filmagens no Marrocos, a Hollywood da África

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Há algumas semanas, quando conversou com o Estado, Ridley Scott não escondia a empolgação ao falar da ?Hollywood da África? , ou seja, o Marrocos. Foi no país, uma espécie de porta de entrada do mundo islâmico, que o diretor americano rodou nada menos que Gladiador, Falcão Negro em Perigo, Cruzada, e agora Rede de Mentiras, que estréia hoje em todo o País. "É incrível como o Marrocos tem infra-estrutura, paisagens magníficas e visão de mercado. Quase todos os filmes que se passam no Oriente Médio são rodados no país. Você tem de visitar um dia", comentava ele. Sugestão aceita. Veja trailer de Rede de Mentiras Em visita há uma semana aos estúdios da CLA, na cidade de Ouarzazate, durante o Festival de Cinema de Marrakesh, encerrado no domingo, foi possível descobrir porque Scott é forte candidato a ?cidadão honorário? da Hollywood da África. Ao entrar nos estúdios, a primeira visão é uma placa apontando a direção do set de Rede de Mentiras, rodado no segundo semestre de 2007, na mesma época em que ocorre o Festival de Cinema de Marrakesh. Leonardo DiCaprio, a estrela de Rede de Mentiras, não só fez questão de se hospedar num hotel local, o Berbere, como parou as filmagens para receber uma homenagem do festival. E também não foi à toa que a eterna musa de Scott, Sigourney Weaver, foi a homenageada desta edição do festival, e que Alien (um dos maiores sucessos do diretor) tenha sido exibido em praça pública para mais de 30 mil pessoas. "O Marrocos é notável. Além dos estúdios, o príncipe Moulay Rachid é cinéfilo dos bons. Ele e o rei Mohammed VI entenderam que cinema é também um grande negócio", afirmou o cineasta. Moulay Rachid, filho do rei Hassan II, que governou o país até 1999 quando morreu, e irmão do rei Mohammed VI, que assumiu, então, o trono, é também presidente da Fundação do Festival de Marrakesh. O fato é que o Marrocos detém a maior infra-estrutura para abrigar cenas como as que Ridley Scott fez questão de registrar por vezes com até seis câmeras simultâneas. "Ridley quase me enlouqueceu. Principalmente em cenas que envolviam câmeras aéreas. Quando eu via, lá estava eu em pleno deserto marroquino, com seis canhões em minha direção. Não sabia de onde viria o tiro, mas Ridley sabia controlar com maestria as câmeras, driblar a dificuldade de se filmar naquela imensidão árida e, ao mesmo tempo, me dirigir", contou DiCaprio. Scott admite que usar seis câmeras simultâneas faz parecer um tanto de exagero digno de fimagens de épicos históricos, mas justifica: "Essa é uma história tão multifacetada que só mesmo filmando em vários ângulos seria possível contá-la com o máximo de verdade que o cinema permite." A história em questão é a de Roger Ferris, agente da CIA infiltrado em uma rede de ações terroristas em Amã, capital da Jordânia. Sua missão é trabalhar com agentes locais e caçar um líder da Al Qaeda que planeja atacar os EUA. Enquanto aprende que, para sobreviver nesta rede de mentiras, o melhor a fazer é sempre dizer a verdade a seu principal aliado Hani Salaam (um irreconhecível Mark Strong, que atualmente vive o vilão do novo Sherlock Holmes de Guy Ritchie), também tem de se reportar o tempo todo a seu superior Ed Hoffman (Russell Crowe) por celular. Entre intrigas, atentados cinematográficos e cenas de tortura dignas de entrar em antologia de cinema, Ferris acaba se apaixonando por uma enfermeira que trabalha como voluntária em Amã e descobre que nem sempre seus inimigos são tão previsíveis quanto pensa. "Nesses tempos em que a informação que nos chega é sempre filtrada, principalmente nos Estados Unidos, ter acesso à verdade é o maior bem que temos. É disso que quero falar agora", explicou Scott, que precisou de mais de duas horas para ?desenvolver o assunto? na tela. Muito por isso, há quem tenha acusado o filme de ser um tédio sem-fim. Mas DiCaprio contesta. "Foi uma das coisas mais difíceis que já fiz na vida. É muito real. Conversei com vários ex-agentes da CIA no Oriente Médio para chegar o mais perto do que seria trabalhar com eles. E tendo um chefe como Russell (Crowe) não foi nada fácil também", brinca o ator que voltou a trabalhar com Russell Crowe mais de dez anos depois de Rápida e Mortal (de Sam Raimi). "Foi especial ver como os dois, mesmo anos sem dividir uma cena, têm uma sintonia incrível. Sou privilegiado por contar com eles", elogiou Scott. Questionado se a parafernália do filme é influência direta de sua experiência como diretor de mais de 3 mil comerciais (frutos de seu trabalho na RSA, a produtora de filmes para publicidade que criou há duas décadas e que até hoje mantém com o irmão, Tony Scott), ele explicou: "Se for, melhor para mim. Foi com o dinheiro da publicidade que paguei muitas contas e consegui me financiar como diretor. Sem contar que nunca deixei de dirigir. E, quando olho para trás e vejo que fiz filmes como Thelma&Louise, Alien, Falcão Negro em Perigo, Gladiador, eu penso: "Até que me saí bem, concorda?" Como não concordar? Serviço Rede de Mentiras (Body of Lies, Estados Unidos/2008, 128 minutos) - Drama. Direção Ridley Scott. 16 anos. Cotação: Bom

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