EDUARDO TOLENTINO: É retrocesso a mudança na atuação dos diretores artísticos no Rio, assim como foi um passo atrás em São Paulo, quando teve fim a residência artística nos distritais. A secretaria de Cultura do Rio não está ocupada por uma pessoa da área da Cultura, mas sim por algum acordo político. E paga-se o preço. Esse discurso de feudo é velho e equivocado. No mundo inteiro os teatros privados têm programação negociada de empresário para empresário e os espaços públicos têm diretores artísticos que definem o perfil da programação.Tem de haver sim uma comissão para avaliar se isso está funcionando ou não e com critérios que nada têm a ver com o fracasso de um espetáculo. É avaliação para ser feita a longo prazo e deve levar em conta uma série de fatores. Uma programaçãopara Teatro Carlos Gomes, no centro, não pode ser a mesma para o Teatro Villa-Lobos, em Copacabana. É um passo atrás mudar algo que funciona bem em outros países e aqui também. O problema é que se toma a exceção como regra. Peter Brook, Peter Hall, Kevin Space, Jorge Lavelli, Jérôme Savary foram ou são diretores de teatros públicos. Em Paris todos são dirigidos por artistas e cada um tem seu perfil de repertório. Quando Aderbal Freire-Filho ocupou o Gláucio Gil, em Copacabana, aquele espaço que estava abandonado ganhou outra dimensão e quando ele foi tirado de lá pelo poder público, o Gláucio Gil voltou a ser um inexpressivo teatro de bairro. Eu tremo quando tenho de entregar projetos a uma comissão porque sei o que vem; já um diretor artístico traz infinitas possibilidades. É só conferir a diversidade de repertório do espaço Parlapatões ou dos Satyros. Assim como a Fraternal movimentou o Paulo Eiró, em Santo Amaro, a Cia. Estável ao ocupar o esvaziado Flávio Império, em Cangaíba, mobilizou a comunidade e atraiu público. Feudos? Pois eles saíram, foram tirados, agora o teatro está de novo vazio. O problema do Brasil é que cada governo muda tudo. Peter Brook e Peter Hall foram diretores artísticos da Royal Shakespeare e essa política, de deixar a decisão da programação nas mãos de um diretor, não muda esteja o poder nas mãos de Margarete Thatcher ou Tony Blair. Tolentino é diretor do Tapa, que foi grupo residente do Teatro Artur Azevedo, na Mooca, entre 2003 e 2004 CELSO FRATESCHI: Acho pertinente que o repertório de um teatro seja decidido por grupos residentes ou diretores. Por outro lado, não considero que compartilhar a decisão com uma comissão seja necessariamente um ato de autoritarismo, pode redundar em colaboração e não litígio. Talvez haja um problema de composição, mas não vejo como um problema no mecanismo em si. Lá está Antonio Pedro, um homem com uma história no teatro, e de transgressão. Em São Paulo tivemos experiências de muito êxito, com a Fraternal, no Teatro Paulo Eiró; a Cia. Estável em Cangaíba - tinha toque de recolher lá quando eles chegaram -; o Tapa na Mooca. E também experiências muito ruins, que não deram certo. Por isso, também não reprovo que haja um prazo, desde que o contrato seja renovável em caso de êxito. Frateschi foi secretário municipal de Cultura de São Paulo (2001-2004), quando implementou projeto de residência artística nos teatros distritais. Atualmente é secretário de Cultura de São Bernardo GABRIEL VILLELA: Fui diretor artístico do Teatro Glória por três anos, de 1997 a 1999, sob a gestão de Helena Severo na Secretaria Municipal de Cultura, uma experiência pautada pelo exemplo europeu. Há dezenas de anos, países como Alemanha, França e Inglaterra ?albergam?, no sentido estético, artistas que têm a tarefa de estimular a frequência com uma pauta personalizada. Helena Severo baseou essa experiência no princípio da confiança e da liberdade com reciprocidade. Ela sabia exatamente o que queria, porém jamais interferiu na nossa programação; fomentava a discussão sobre a pauta por meio de reuniões com todos os diretores nas quais eram traçadas estratégias anuais. Eram encontros nos quais se celebravam os contrastes, a multiplicidade de idéias. Num dos anos, precisei fazer uma reforma no Teatro Glória e a verba foi usada para isso e não para um novo espetáculo. Abri as portas para programação eclética, o Paulo Autran reinaugurou o teatro, o Grupo Armazém passou por lá, procurei levar produções de São Paulo. Essa comissão engessa e espelha o espírito burocrático da nova Secretaria. Com Helena Severo trabalhamos sob a égide da democracia. Trechos de depoimentos concedidos à repórter Beth Néspoli