Estudo refinado sobre um ditador obcecado pelo ocultismo

Obra revela que o Führer usou livros sobre estrategistas para traçar planos de invasão e recorreu ao conhecimento esotérico

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Quando a 2ª Guerra acabou, mais de 10 mil livros da biblioteca particular de Hitler foram embarcados de Berlim para a então União Soviética. Nunca mais foram vistos. Outros 1.200 livros foram enviados para a Biblioteca do Congresso em Washington, onde raramente recebiam a visita de algum acadêmico curioso em busca de uma ou outra anotação capaz de revelar algo novo sobre o ditador. O inglês Timothy Ryback foi um deles. E teve bastante sorte. Encontrou os livros certos para esclarecer alguns pontos obscuros da história alemã, inclusive a polêmica omissão da Igreja Católica a respeito dos crimes praticados pelos nazistas. A esse respeito, analisando o exemplar de Fundamentos do Nacional-Socialismo, do bispo Alois Hudal, entregue a Hitler em 1936, mostra como as autoridades religiosas católicas estavam preocupadas com a crescente agitação anticristã na Alemanha nazista, justamente no ano em que Berlim foi sede das Olimpíadas e os negros foram campeões em quase todas as categorias - Hitler não aceitou a derrota ariana e se recusou a entregar medalhas. O bispo Hudal foi o líder de uma conspiração para dividir o movimento nazista e abalar o prestígio de Alfred Rosenberg, ideólogo anticristão, instrutor ideológico do Partido nazista e responsável pelo "bem-estar espiritual" do povo alemão. Rosenberg escreveu o livro O Mito do Século 20, em que pregava a esterilização forçada e a propagação do quinto Evangelho, entre outras heresias. O Vaticano protestou. Não queria o livro incluído nas bibliotecas escolares. Hitler, que parece não ter lido o livro, ignorou o protesto e manteve Rosenberg no lugar que ocupava. Quem teve de recuar foi o Vaticano. Bispos como o de Munique - na época, Michael Faulhaber - recusaram-se a cumprir ordens do governo e entregar nomes de judeus convertidos, mas Hitler ameaçou a Igreja Católica se ela continuasse sua luta contra o nacional-socialismo. O resto, como se sabe, foi o silêncio do Vaticano. Outro ponto que o livro de Ryback esclarece é a suposta influência da filosofia de Schopenhauer e Nietzsche sobre o ditador. O historiador defende que o nacionalismo de Fiche representou, sim, a antecipação da ideologia nazista e que um livro sobre o estrategista prussiano Alfred Graf, publicado em 1921 e anotado por Hitler, revela como o plano para a invasão da União Soviética 20 anos depois foi sugerido por essa leitura. Outra curiosidade sobre a biblioteca de Hitler é o número considerável de livros sobre espiritualismo e ocultismo, hoje na coleção de raridades da Universidade Brown. Neles, Ryback identifica anotações de um panteísta perdido entre os mundos científico e espiritual com especial interesse no estudo das mãos. Pena que não tenha analisado as próprias.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.