Para a TV, 2008 foi um ano de grandes cenas, tanto na tela quanto nos bastidores. Entra para a história o embate direto entre Record e Globo, que brigaram frente a frente pela audiência no horário nobre - a primeira com Os Mutantes, continuação de Caminhos do Coração de Tiago Santiago, e a segunda com o thriller A Favorita, de João Emanuel Carneiro. Há alguns anos obtendo boa repercussão de suas tramas e com uma produção de elevado nível técnico, a Record conseguiu, pela primeira vez, minar a estréia de uma novela da concorrente, em junho. Levou o primeiro capítulo de Os Mutantes - que, como Caminhos do Coração, já obtinha média de 16 pontos no Ibope às 22h30 - ao ar no mesmo dia e horário (21h) da estréia de A Favorita. Deixou a Globo com 34 pontos, a pior média de uma estréia de novela das 8 já registrada. Mas fora a dança dos medidores de audiência, a quebra da hegemonia da Globo no seu mais valioso produto expõe algumas conclusões. A primeira se tira com grande satisfação: o maior duelo pela preferência do público é protagonizado por dois jovens autores (João Emanuel tem 39 anos, Tiago, 45). A segunda vem da observação de que Os Mutantes - quer você goste de verdade, se divirta ou nada disso - apresentou uma alternativa real ao que a Globo costuma produzir, além da imitação. Em clima de seriado americano, com muitos efeitos especiais e cenas de ação, a novela de Tiago Santiago representa o modelo de produção que a emissora do bispo Edir Macedo vem desenhando - ágil, recheado de cenas de ação e acontecimentos mil. Chamas da Vida, de Cristianne Fridman, no ar desde julho, também é assim. Além de chamar a atenção pelo nível de suas produções, a emissora quer também produzir em quantidade, como faz a concorrente (leia entrevista ao lado). Por isso, está diversificando a produção - hoje apresenta o especial Os Óculos de Pedro Antão, baseado no conto de Machado de Assis, e, no dia 5, leva ao ar a série policial A Lei e o Crime. No mar de produção original que é a grade da Globo, não se pode deixar de citar a minissérie Queridos Amigos, de Maria Adelaide Amaral, excelente para o espectador que ousa pensar diante da TV. No mesmo embalo, foi o ano também de Capitu, de Luiz Fernando Carvalho. Mas, no fim das contas, quem conseguiu aliar a sofisticação com o gosto popular foi mesmo A Favorita. A novela virou assunto nacional justamente - e não por acaso - quando se tornou mais acelerada e abandonou a ambigüidade das protagonistas Donatela (Cláudia Raia) e Flora (Patrícia Pillar). Com uma vilã terrível para odiar, numa grande interpretação de Patrícia, lá foi a novela para os 48 pontos. Mas a novela não viveu só de Flora, teve grandes momentos. Silveirinha (Ary Fontoura, maravilhoso) jogando todo o seu rancor sobre Donatela. Dodi (Murilo Benício) e seu ar de Scarface da Vila Brasilândia. Milton Gonçalves como um político corrupto (Romildo), papel onde a raça não tem qualquer relevância. O beijo entre Irene (Glória Menezes) e Copola (Tarcísio Meira) - um dos casais mais conhecidos da TV, os atores teriam ensaiado para a cena, que graça. A morte de Gonçalo (Mauro Mendonça), em clima de Carrie, A Estranha. VIU O CQC ONTEM? Em outra praia, o Custe O Que Custar, da Bandeirantes, foi fenômeno de repercussão em 2008. Alternativa inteligente ao populacho do Pânico na TV (Rede TV!), o humorístico ressuscitou a sátira política com uma coragem pouco vista na televisão ultimamente. Teve grandes cenas e fez muito barulho, como o da campanha contra a expulsão de seus repórteres dos corredores do Congresso Nacional. Com equipe afiada, o programa fez diferença no humor televisivo, que antes dele parecia agonizar na UTI do Zorra Total (Globo). Alguns momentos foram hilariantes, como os do quadro Repórter Inexperiente, de Danilo Gentili. Quem não viu na TV, correu para o YouTube. O que leva a crer que de alguma forma o ibope dos moços (8 pontos) não combina com a repercussão deles na praça. Não há melhor exemplo destes tempos de pulverização da audiência.