Quando esteve em São Paulo, para a inauguração da Mostra, em outubro, Wim Wenders já antecipara, para o repórter do Estado, que seu novo filme, sobre Pina Bausch, estaria no Festival de Berlim. Há tempos que Wenders perseguia esse projeto, mas ele só se desenvolveu quando o autor descobriu que o 3-D lhe daria a ferramenta para projetar o espectador na vertigem da dança da notável coreógrafa. Pina: Dance, Dance, Otherwise We Are Lost integra realmente a programação da Berlinale, que começa na quinta. Justamente neste dia estará sendo lançado, na cidade, o álbum com as fotos da exposição Lugares Estranhos e Quietos, que Wenders apresentou durante a Mostra, no Masp.Os fãs de Wenders gostarão de incorporar o lançamento às suas coleções. As fotos do artista têm tudo a ver com seus filmes. São "autorais", como ele. No ano passado, Wenders orientou pessoalmente a montagem da exposição. Movimentando-se nos salões do Masp, ele orientava os operários em busca da melhor iluminação, preocupado com o sistema de fixação nas paredes. Eram fotos muito grandes, e pesadas.Quiet and Strange Places. A foto que ilustra a página lembra um quadro de Edward Hopper - a árida paisagem de uma cidade norte-americana que parece retirada de A Estrela Solitária, o belo filme com que Wenders reatou a parceria com o dramaturgo e, neste caso, também ator, Sam Shepard. A foto não é do filme, mas foi tirada em Montana, onde ele filmou. Outra foto mostra uma roda-gigante - na verdade, duas fotos, de diferentes ângulos e ambas coletadas do mesmo cenário, na Armênia.As fotos são ferramentas para a atividade do cineasta? Wenders esclarece que já tirava fotos bem antes de virar diretor. E nunca deixou de viajar sem suas câmeras. "A câmera fotográfica é um instrumento de exploração. Serve como instrumento de percepção dos ambientes e faz com que o viajante preste atenção aos detalhes e descubra novos ângulos", como definiu Marina Ludeman, quando outra mostra pioneira das fotos de Wenders aportou, em 1997, no Instituto Goethe.Um ano antes, as imagens de Wenders haviam chegado à 23.ª Bienal de São Paulo, por meio de electronic paintings. Reinventando-se em diferentes suportes, Wenders tem deplorado aquilo que define como "nossa incapacidade de olhar". Os olhos mudaram, ele adverte: "Hoje, as imagens são feitas para vender. Tudo está à venda". É contra esse movimento que ele fotografa. Os lugares que o atraem são parecidos - estranhos e quietos. Poucas fotos incluem pessoas. Na maioria, são imagens de paisagens desoladas, desertas, de lugares em busca de gente, um pouco como no seu cinema, definiu o repórter. "Um pouco, não; exatamente como no meu cinema", corrige Wenders."Talvez todo o espanto produzido por essas fotos venha mesmo do fato de o olhar do cineasta não percorrer lugares comuns", destaca Leon Cakoff, criador da Mostra de São Paulo, que revelou o cinema de Wim Wenders para o público brasileiro. Agora, ajuda a impor também o fotógrafo. Uma tiragem especial do livro foi numerada, manualmente, de 1 a 50, tendo nas páginas de guarda, um desenho dourado e a assinatura do cineasta. Esses exemplares especiais não se destinam à venda - serão distribuídos para bibliotecas públicas e instituições culturais, cujos acervos remetem à fotografia e ao cinema.Como advertência para o possível viajante no olhar de Wenders, fica um antigo aviso do autor, feito há muito anos. "Em comparação com o cinema, a fotografia foi a arte que mais conservou sua ética, consciência e moral." Vinda de um autor que já venceu os maiores prêmios do maior festival de cinema do mundo, Cannes - Palma de Ouro por Paris, Texas, em 1984; melhor direção, por Asas do Desejo, em 1987 -, a frase adquire um significado especial. Remete ao que dizia o pintor Derwatt em outro grande Wenders, O Estado das Coisas, de 1982: "Olhos não se compram".LUGARES ESTRANHOS E QUIETOSAutor: Wim Wenders. Editora: Imprensa Oficial (150 páginas, R$ 60). Lançamento: Masp. Avenida Paulista, 1.578, telefone 3251-5644. 5ª, às 19h30.