A palavra poesia apresenta certa flutuação de sentidos. Para alguns, soa ameaçadora, sugerindo ou lembrando exercícios difíceis dos tempos de escola. No universo literário, é tida como a mais refinada das paixões. Em princípio, imagina-se que poetas, assim como leitores de poesia, sejam indivíduos singulares, atacados por uma espécie de mania, dizem que hoje rara e inatual: a mania de ler literatura, mania de cultivar as letras. Cultivar as letras é querer saber das coisas, é cultivar o intelecto, a força do entendimento. A quem deseja enveredar por esse caminho, recomenda-se: leia os bons romances, descubra os filósofos sérios, aprenda a amar poesia. Na cama, na rede. Na poltrona, na mesa de trabalho. Sempre foi assim. É como nasce a tribo dos letrados. Os romances nos permitem viajar sem sair de onde estamos. Não apenas a lugares estranhos, próximos ou distantes. Mas viajar pelo outro, por nós mesmos, da maneira intensa e interiorizada que só o texto escrito pode oferecer. A filosofia é ginástica para o cérebro: nos ensina a pensar, quase por osmose. Ensina a indagar sobre o real significado das palavras. Entender parágrafos dos filósofos importantes é habilitar-se a entender qualquer outro tipo de parágrafo. Entender não apenas a informação que o parágrafo contém, mas o conceito que o sustenta. Para a tribo dos leitores, a poesia traz sobretudo promessa de prazer. É gostoso ler poesia. Para alguns, é até mais gostoso que ler romance. Por certo, é mais gostoso que filosofia. Poesia respira, joga com pausas, alterna silêncios e frases (os versos). Poesia é bonito na página, é festa tipográfica. Festa para os olhos. Ritmo visual que vira sonoro, quando lemos o poema em voz alta. Imaginação e sabedoria combinadas numa certa vertigem, a velocidade das estrofes. (Trecho de Como e Por Que Ler a Poesia Brasileira do Século 20)