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Coluna quinzenal da jornalista Luciana Garbin que traz foco para as questões femininas na sociedade atual

Opinião | Por que comemos mesmo sem fome? Ciência começa a desvendar os ‘quilos emocionais’

Novos livros chamam a atenção para a importância de identificar se você não está ‘ingerindo sentimentos’

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Atualização:

Responda com sinceridade: você alguma vez já afogou as mágoas num prato de risoto, macarrão ou outra comidinha que parecia apetitosa e irresistível?

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Saiba que não está sozinho.

Como diz o psiquiatra francês Stéphane Clerget em seu livro Quilos emocionais: Como se livrar deles sem dieta nem medicamentos (Editora Leya), o excesso de peso que aflige muitas pessoas hoje em dia não é apenas uma questão de ingestão de calorias, mas também de emoções. E elas impactam tanto no quanto ganhamos de peso como na resistência do nosso organismo em perdê-lo.

Se você quiser fazer as pazes de uma vez com seu corpo e sua autoimagem o primeiro desafio será, portanto, parar de usar a comida como compensação - e de reagir ao maldito do estresse.

Psiquiatra recomenda que, se você quiser fazer as pazes de uma vez com seu corpo e sua autoimagem, primeiro desafio será parar de usar a comida como compensação Foto: Juliaap/Adobe Stock

Clerget explica que o estresse atua por diferentes mecanismos que envolvem hormônios e neurotransmissores, afetando o comportamento alimentar, a mobilização física, o metabolismo basal e, em consequência, o armazenamento de gordura. “Algumas pessoas, em reação a uma situação estressante ou numa segunda fase após uma reação de estresse, consomem alimentos sem estar com fome. Os quilos emocionais muitas vezes são consequência de conflitos psíquicos, de frustrações, de autopunições. Se você comer verdadeiramente por prazer, por gosto, e não por uma pulsão, uma vontade repentina, por hábito, tédio, tristeza, raiva ou obrigação, há poucos riscos de acumular quilos emocionais.”

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Parece complexo?

Pois saiba que essa história de “comer sentimentos” remete à época das cavernas. Quem mostra isso é o também psiquiatra Judson Brewer no livro Desconstruindo o Hábito da Fome: Por que comemos quando não temos fome - e como parar (Editora Sextante).

“Nossos ancestrais passavam a maior parte do dia procurando comida e se lembrando de onde encontrá-la, mas tinham outra grande preocupação: não virar comida. Aprenderam isso pelo processo do reforço negativo, que funciona de modo similar ao positivo. Na sequência gatilho-comportamento-resultado, em vez de promover comportamentos compensadores (experiências agradáveis), aprende-se a evitar situações que parecem castigos (experiências desagradáveis)”, conta o especialista americano.

O problema, segundo Brewer, é que, mesmo passado tanto tempo, o cérebro ainda não sabe a diferença entre uma ameaça genuína à sobrevivência, como a iminência de um atropelamento, e uma pressão cultural, como os gritos de um chefe. “Quando encontramos um estressor, o cérebro lê ‘perigo’ e precisa dar um jeito de lidar com ele. Faz isso unindo medo e dor naquela categoria geral de sentimentos desagradáveis. O medo é desagradável. A dor é desagradável. A dor emocional é desagradável.”

Numa virada que o autor chama de “cruel”, o que aconteceu foi que, na ausência de ameaças à sobrevivência e diante do acesso fácil a alimentos calóricos, aprendemos a amortecer a dor emocional com algum prazer ou distração. E aí é que para muita gente entra a compensação pela comida.

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“Quando ficamos tristes ou zangados, o cérebro de sobrevivência começa a procurar o que pode nos animar ou distrair. Lamentavelmente, um dos poucos truques que ele conhece é o gosto requintado pela comida para nos entreter e permitir alívio imediato”, resume Brewer. “Quando estamos mal, o cérebro nos lembra que comer é gostoso ou, pelo menos, afasta temporariamente as emoções ruins.”

Está então armada a arapuca que pode se repetir mais e mais dependendo do sujeito. E que é perversamente turbinada por uma indústria alimentícia que lucra com alimentos cheios de gorduras, sal e/ou açúcar, muitas vezes crocantes, projetados para provocar desejo.

A boa notícia, porém, é que segundo os dois psiquiatras há formas de desmontá-la.

Clerget dá algumas dicas em seu livro. Ele explica que, quando se come por prazer (exceto no caso em que o prazer sentido também é fonte de culpa), não há necessidade de comer demais, pois as primeiras mordidas são as melhores. “Depois, o prazer vai diminuindo. E o prazer também vem do desaparecimento da sensação de fome assim que a glicemia aumenta.”

Não se deve, porém, confundir os prazeres. É preciso diferenciar, por exemplo, o prazer do paladar do prazer do convívio com amigos à mesa. “É bom desfrutar da conversa com amigos, rir, falar, mas sem confundir isso com um momento de comer sem limites, isto é, além da fome. A leveza desses momentos combina bem com a leveza do que se consome.”

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Comemorações com amigos ou família costumam ser terreno minado porque, além de comer mais do que o necessário, o caráter festivo e o consumo de álcool nesses eventos favorecem o exagero. “Estudos demonstraram que, em bares onde a música está alta demais para conversar, o consumo é maior, especialmente o de álcool”, segundo Clerget.

Outra dica é descobrir outros prazeres, além do da comida. “Experimente novas atividades ou tente redescobrir prazeres que já teve no passado e dos quais talvez tenha abdicado por várias razões (proibições familiares, incompatibilidade com a vida conjugal, filhos pequenos, falta de confiança em si mesmo ou limitações relacionadas à idade).”

“Quanto mais cruzamos estados de espírito com comida, mais esses comportamentos se tornam hábitos. Em vez de descruzá-los, nos culpamos, achando que tem algo errado conosco. Mas existe uma saída: aprender como o cérebro funciona”, confirma Brewer. “Comer pode ser uma fonte de saúde, um ato de autocuidado, um prazer, uma situação social. Mas não determina quem você é.”

Opinião por Luciana Garbin

Editora executiva no ‘Estadão’, professora na FAAP e mãe de gêmeos

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