Brancos. O Millôr contava que uma vez dera um autógrafo no interior de uma carteira de cigarro. Pedira desculpa pela precariedade do papel e ouvira como resposta “Não faz mal, quando chegar em casa eu passo a limpo”. Meu pai dava autógrafos em Portugal e, com a caneta pousada sobre a página em branco para fazer a dedicatória, perguntou “Que nome eu ponho?” E o português, tentando esconder sua decepção com a burrice do escritor: “O de vossa senhoria”.
*
Escritores em sessões de autógrafos têm em comum com tribos indígenas um justificável temor dos brancos. Não são boas as experiências dos dois grupos com brancos. No caso dos escritores o “branco” é a pane mental que lhes impede de lembrar o nome do melhor amigo, na hora da dedicatória, e seus efeitos são iguais aos dos brancos entre povos primitivos: confusão, mal estar e, muitas vezes, guerras.
*
Todo escritor que já deu autógrafos tem sua história de terror para contar. De pessoas que o cumprimentam efusivamente, e que portanto ele tem a obrigação de saber quem são, e que nome têm, e não sabe. De pessoas que ele está cansado de saber quem são mas não lembra o nome. E – o pior de tudo – de pessoas que ele lembra o nome, mas o nome errado. Como na vez em que dediquei um livro ao Paulo Hecker Filho para espanto de quem me pedira o autógrafo, Antônio Carlos Rezende.
*
Os “brancos” podem vir a qualquer hora.
– Desculpe, não estou lembrando o seu nome...
– Sou sua mãe!
– Eu sabia que começava com “eme”...
E não há como disfarçar um branco. Você pode perguntar “Para quem?”, tentando dar a entender, pela expressão ou o tom de voz, que sabe o nome da pessoa, claro, mas que talvez ela queira dar o livro de presente a outra. Uma técnica que perde qualquer sentido quando a pessoa diz “Para mim mesmo”, e, impiedosamente, não diz seu nome.
*
Já apelei para perguntas suicidas como “Seu nome é com “i” ou com “y”?”. Não adianta. Seja qual for a resposta, pode levar a indignação ou tapas se o nome dela for, por exemplo, Noelma. Mas pelo menos se ganha tempo para o cérebro funcionar. Vã esperança. O cérebro não costuma funcionar em sessões de autógrafos.