As coisas não andam nada bem para o cinema brasileiro, pelo menos em termos de bilheteria. As pessoas parecem arredias na volta às salas. Blockbusters não têm problemas. Rock in Rio, menos ainda. Mas o hábito de frequentar cinemas, pelo menos em busca daqueles filmes mais "empenhados", ou simplesmente pouco óbvios, parece que não retornou. Culpa do streaming? Da crise? Do medo ainda da pandemia? Um pouco de tudo isso, pelo jeito. Mas, em todo caso, os filmes vão chegando à tela grande. Na quinta passada estrearam três documentários:
O Grande Irmão, doc de Camilo Tavares sobre a participação brasileira no golpe do Chile em 1973. O diretor volta ao cinema político e faz agora o desenvolvimento do seu longa anterior sobre a ditadura brasileira, O Dia que Durou 21 Anos. Agora trata da colaboração brasileira na debilitação e derrubada do governo do socialista Salvador Allende, que caiu em 11 de setembro de 1973.
Depois do golpe, articulado pelos Estados Unidos e a extrema-direita chilena, com a gentil colaboração brasileira, o "convênio" continuou. Sob a forma de troca de informações, prisioneiros, dinheiro farto e intercâmbio de know-how de interrogatórios - técnicas de tortura, para dizer sem eufemismos. O dinheiro correu solto entre ditaduras irmãs. Entrevistado, Delfim Netto, então czar da economia brazuca, admite que, depois da derrubada de Allende, o Brasil emprestou uma fortuna ao Chile - 500 milhões de dólares em condições especiais. "Para ajudar os irmãos chilenos", diz candidamente Delfim.
O Território, de Alex Pritz, sobre a luta dos indígenas na proteção da Amazônia. (Semana passada saiu uma matéria enorme no Libération sobre a devastação da floresta sob o governo Bolsonaro). O filme ganhou o Sundance. Direção: Alex Pritz. Com foco na luta dos indígenas da Amazônia para preservar seu território invadido por madeireiros e mineradores ilegais.
Muito bem-feito, o documentário mostra que a luta dos indígenas se faz não apenas por protestos e pedidos a autoridades (completamente omissas). Cansados de esperar, eles empunham arcos e flechas, e também o mais que tinham à mão, para defender, na marra, seus direitos.
5 Casas, bonito doc memorialista do diretor Bruno Gularte Barreto. Direção de Bruno Gularte Barreto. Já escrevi sobre esse belo trabalho memorialístico mais de uma vez. Ele passou no Cine Ceará do ano passado e, agora há pouco, no Festival de Gramado, no qual recebeu o prêmio de melhor filme gaúcho. O diretor volta para sua cidade, Dom Pedrito, e (re)encontra suas lembranças num galpão atingido pelas chuvas. É um filme brilhante, feito de restos. Memória é resto. É reconstrução, tanto cognitiva quanto afetiva. Belíssimo filme.
Leia aqui: https://cultura.estadao.com.br/blogs/luiz-zanin/cine-ceara-2021-5-casas-ou-a-memoria-em-questao/