Entre as atrações verdadeiramente modernas do Free Jazz Festival, uma que vai certamente causar espécie é o cantor sueco Jay-Jay Johanson. É sem dúvida o mais cool, o mais classudo das estrelas do festival, embora relativamente desconhecido por aqui. Uma espécie de discípulo eletrônico de Chet Baker e Serge Gainsbourg, ele traz - revitalizada pela eletrônica - a tradição dos chansoniers de cabaré de volta ao mundo do pop internacional. "Acho que a tradição dos cantores, dos intérpretes, sofreu uma quebra de continuidade nos anos 80, com a predominância dos sintetizadores e teclados", disse Johanson, em entrevista por telefone. "Eu reconheço essa tradição em minha música, mas como produtor eu estou de olho nos sons contemporâneos", afirmou. Jay-Jay Johanson chega ao Brasil com seu novo disco, Poison, que está sendo lançado aqui agora pela BMG. Nele, o crooner eletrônico canta temas pungentes e típicos do trip hop moderno, como Keep It a Secret e Alone again, com aquela levada de scratches e guitarras tocadas em soquinhos, em semi-riffs. Mas também capricha no climão anos 50, em canções como Believe in Us. Em outras canções, como a suingada Changed, ele roça ali na música francesa dos anos 60, procurando um cenário futurista no qual, apesar da tecnologia, Jane Birkin possa dar sussurros sem sustos. E, em outras, como Far Away, rende-se escancaradamente ao jazz e à onipresença de Chet Baker. Johanson tem três discos lançados: Whiskey (1997), Tattoo (1998) e Poison (2000). "Do primeiro a este novo trabalho, há uma grande distância, eu evoluí muito", conta o músico. "Quando fiz Whiskey, eu nunca tinha entrado em um estúdio antes, e agora eu estou cantando melhor, produzindo melhor e tocando melhor", ele pondera. Tocando melhor é modéstia de Johanson. Afinal, sua experiência musical começa aos 7 anos, em Trollhätan, Suécia, onde nasceu. Ele começou tocando piano, depois passou para a flauta, a clarineta, o saxofone, a guitarra e chegou enfim aos teclados, que abandonou para cantar. "Nunca pensei em ser um cantor, mas me obriguei a cantar porque outra pessoa não conseguiria tratar coisas tão pessoais quanto as que eu escrevi para mim", ele pondera. Ainda assim, é difícil imaginar outra profissão para Johanson que não a de cantor. Não é dono de uma voz poderosa, de barítono, mas de uma vozinha miúda, bem colocada, constante. Entre seus conterrâneos, poderia ser colocado ali ao lado dos irmãos Neneh Cherry e Eagle-Eye Cherry, também suecos e cantores mas ele não gosta desse emparelhamento. "Gosto de Neneh Cherry no início da carreira e de Eagle-Eye como compositor, não como cantor", ele diz. "Mas eles vão numa direção oposta à minha, eu sou mais ligado à eletrônica e ao hip-hop, eles são ligados a um pop mais tradicional", pondera. Jay-Jay Johanson chega ao Brasil acompanhado de um tecladista, um baixista, um guitarrista e um DJ - o único que não é sueco, mas americano. Ele não toca nenhum instrumento. "Nessa turnê, é só a voz", conta. Pretende mesclar canções de seus três discos na noite de domingo, dia 22 de outubro, que será aberta pelo brasileiro Marcos Suzano e terá ainda o produtor hindo-britânico Talvin Singh. O primeiro disco de Johanson, "Whiskey", tinha presença forte de bossa nova e dos tropicalistas, que ele diz ter aprendido a ouvir de maneira análoga ao jazz. "Acho que jazz e bossa nova não são coisas essencialmente distintas, um e outro têm uma relação orgânica, de troca", ele diz. "Mas eu espero, no Brasil, ter contato com algum outro ramo da bossa nova que não seja o mainstream, porque por aqui nós conhecemos muito pouco, apenas Tom Jobim e João Gilberto", ele adianta. E o que é que Johanson costuma ouvir, quando não está ocupado apenas com Chet Baker, François Hardy e Michel Legrand, influências confessas? Ele diz que tem uma queda por trilhas sonoras de filmes. Comemora o uso de um sampler da trilha de "Afogando em Números", de Peter Greenaway, para o qual chegou a pedir autorização de uso ao compositor Michael Nyman. "Mas gosto particularmente das trilhas dos filmes de Hitchcock", confessa o cantor. Ex-DJ, ele esteve à frente dos pick-ups por um tempo considerável, entre 1992 e 1995, em Estocolmo, quando a moda na Europa era a disco italiana. Depois, bandeou-se para a música eletrônica com base de hip-hop. Por fim, um pouco movido pela influência de outros músicos da cena européia que experimentavam voltar-se para uma tradição esquecida (como Elvis Costello, que gravou canções de Burt Bacharach e standards de Charles Mingus), Johanson foi em busca de uma experiência ainda mais radical. Foi confundido com mais um asceta do trip hop, mas seu som escala um degrau adiante.