Quando as três mais populares estrelas do canto lírico aparecem juntas no palco, a figura do maestro tende a ser relegada a um segundo plano. No entanto, adaptar partituras e ficar atento às modulações e mudanças que os três fazem nas partituras é tarefa das mais complicadas. Em São Paulo sábado, no Estádio do Morumbi, caberá ao maestro italiano Marco Armiliato reger o concerto, que terá a participação da Orquestra Sinfônica Municipal. Em entrevista ao Estadão, Armiliato não poupa elogios aos cantores que, segundo ele, inventaram uma nova maneira de fazer música lírica. "São os três maiores tenores do século", afirma. A razão do sucesso do trio, que há dez anos se apresenta ocasionalmente, está ligada, segundo Armiliato, não apenas ao repertório de forte apelo popular, mas aos tipos vocais de cada um. "São tipos diferentes de tenor, tanto musical quanto dramaticamente." Em José Carreras, ele ressalta o fraseado. "Ele tem uma clareza incrível na pronúncia das frases e, quando canta, cada nota e palavra significa alguma coisa." Pavarotti, para ele, encarna o estilo característico do tenor italiano. "Sua voz é inacreditável e toda vez que eu o ouço ele me surpreende." Malabarismos - No que diz respeito a Placido Domingo, Armiliato evoca uma discussão bastante presente no mundo da ópera: fazer, com perfeição, malabarismos vocais e atingir notas supostamente inatingíveis, nem sempre transforma o artista em um grande músico. "A técnica e o coração têm de andar juntos para que se possa dizer que alguém canta bem." Nesse sentido, não poupa elogios a Domingo, que se tem dedicado bastante ao trabalho de regente. "É o maior músico do mundo e tem uma voz incrivelmente calorosa." Armiliato respeita as críticas que dizem que Carreras, Domingo e Pavarotti subvertem o mundo da ópera e até mesmo do bom gosto, a cada concerto juntos. Para ele no entanto, essas críticas não têm fundamento. "Trata-se de uma maneira diferente de aproximar-se da ópera, mostrando que o gênero pode e deve ser para todos", afirma - e ressalta que, para o público jovem, esse tipo de concerto é fundamental. "Essa mistura de gêneros mexe com os jovens e permite que eles possam conhecer, sem preconceitos e medos, o mundo do canto lírico." Jovens - Sobre a ampliação do público, Armiliato acredita, também, que abrir as portas dos teatros para os jovens pode ajudar. "A aproximação do público é mais fácil quando as pessoas podem, por exemplo, assistir a ensaios e participar do processo de construção de uma montagem." Armiliato, que vai reger pela primeira vez Carreras, Domingo e Pavarotti juntos, segue para Nova York, onde dirige Turandot, no Metropolitan, depois vai para Viena reger Tosca , e para Toulouse, onde paticipa de uma nova montagem de Rigoletto. "Na correria de um teatro para o outro, tomo cuidado para não incluir muitas novas óperas porque não vou ter tempo de estudá-las." O cuidado com o repertório deve existir, também, com os cantores. "Hoje os artistas estão se deixando levar pelos negócios e destruindo a voz, explorando um repertório nem sempre adequado." Essa é, aliás, uma das críticas feitas a Pavarotti, que na última década gravou papéis inadequados para seu registro vocal, como Otello. "Mas Pavarotti é Pavarotti, pode fazer o que bem entender."