Padrões europeus dominam País, acusa pesquisador

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Por Agencia Estado
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A década de 90 representou uma grande abertura para a classe artística negra do País, segundo o pesquisador da USP, Joel Zito Araújo, autor do livro e do documentário A Negação do Brasil - O Negro na Telenovela Brasileira. Mas Zito considera que o processo de conscientização ficou estagnado e não teve tanto progresso quanto se anunciava. Quando a novela A Próxima Vítima, de Silvio de Abreu, foi exibida, em 1995, o núcleo de atores negros formado por Antonio Pitanga, Zezé Motta, Lui Mendes, Camila Pitanga, Norton Nascimento e Isabel Fillardis acabou por gerar uma grande empatia com o público, que até hoje assimila aquela produção como a primeira a trazer personalidades negras em papéis não-estereotipados. "Mas tudo era tão certinho naquela família que não parecia real. Ela era tão conservadora como as famílias mais tradicionais do início dos anos 80", lembra. Embora muitos pensem que esta foi a primeira novela a colocar atores negros interpretando personagens bem sucedidos, Araújo destaca que o autor Teixeira Filho já havia feito isso em 1969, criando um personagem de classe média para Zé Ketti. Em 1984, Zezé Motta também deixou seu lado Xica da Silva para viver a arquiteta e decoradora Sônia, em Corpo a Corpo. Dias Gomes também criou um núcleo de classe média com atores negros em Mandala, em 1989, na tentativa de prestar uma homenagem a Grande Otelo, que era o chefe da família que ainda contava com Milton Gonçalves e Aida Lerner. "Mas não foi uma coisa muito legal, porque parte do personagem era inspirado no próprio Otelo, lembrando um pouco a história do teatro rebolado. Como seria uma homenagem ao Otelo, ele acabou ficando chateado depois que a paixão do personagem pela bebida foi mais acentuada. A homenagem acabou pegando muito mal", ressalta. Vale lembrar ainda casos como o da atriz Taís Araújo, que ganhou notoriedade nos Estados Unidos graças ao sucesso da novela produzida pela extinta TV Manchete, Xica da Silva. "Foi o primeiro papel de protagonista dado a uma atriz negra em novela", considera Araújo. Para Zezé Motta, que fez a heroína escrava no cinema, o pesquisador faz uma ressalva. "Fico chateado em ver atrizes como a Zezé tendo de fazer papéis secundários apenas por não estarem dentro do padrão ´branco´", exemplifica o pesquisador, salientando que a atriz voltará à telinha em fevereiro, em Porto dos Milagres, no papel de uma mãe-de-santo baiana. "O grande problema do Brasil é estar preso a uma estética branca e européia, assim como ocorre em todo o restante da América Latina. No México também acontece isso, onde 70% da população é formada por índios e mestiços, mas nas novelas só se vêem atores brancos", salienta o pesquisador, que classifica o padrão adotado em toda a América Latina como um "desejo de branqueamento pela estética". "Quando se pensa em um personagem pobre, lembra-se do negro, porque os papéis de bem-sucedidos são para os brancos. Isso acaba causando principalmente problemas de identidade entre os afro-descendentes".

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