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‘A economia pode sair da UTI para a convalescença'

Para Eduardo Giannetti, o maior risco para o novo governo é o grau de envolvimento dos seus integrantes na Lava Jato

Por Luiz Guilherme Gerbelli

O economista Eduardo Giannetti acredita que o presidente em exercício Michel Temer assume o governo num momento de inflexão econômica: a queda da inflação, o ajuste do setor externo e a atual ociosidade do parque industrial devem ajudar na retomada da atividade. “A economia brasileira está na UTI e eu acho que agora tem uma chance de ela passar para um estado de convalescença”, diz.

Para Giannetti, os primeiros sinais da nova equipe econômica são positivos e, se tudo der certo, o novo governo pode se assemelhar à gestão de Itamar Franco, também um governo de transição, cujo legado foi a criação do Plano Real. “Agora, não é o problema de estabilização macroeconômica, mas de organização do descalabro que é o legado das contas públicas do governo Dilma”, diz. A seguir os principais trechos da entrevista.

Gianetti: programa 'Uma ponte para o Futuro' aponta na direção correta Foto: Janete Longo|AE

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Como o sr. avalia os primeiros sinais do governo Michel Temer?

Os primeiros sinais são positivos e eles permitem o vislumbre de um ponto de inflexão. A economia brasileira está na UTI e eu acho que agora tem uma chance de passar para um estado de convalescença. Não quer dizer que tudo vai estar normalizado, mas eu acho que podemos ter chegado num ponto de inflexão.

O que faz o sr. acreditar nesse ponto de inflexão?

São três fatores que, no curto prazo, devem favorecer o timing da entrada do novo governo. Primeiro, a inflação está em queda, o que abre espaço para uma redução consistente da taxa de juros no segundo semestre. O segundo ponto é que as contas externas brasileiras estão ajustadas. A recessão e a desvalorização do real levaram a uma queda das importações e a diminuição dos gastos dos brasileiros no exterior. As exportações começam a reagir e os preços das commodities também estão ajudando. Então, o déficit em conta corrente está bem menor, o que dá tranquilidade na frente externa. O terceiro ponto é a ociosidade no parque produtivo. Isso permite um crescimento no curto prazo sem grande implicações, porque tem máquinas e equipamentos não utilizados e mão de obra qualificada desocupada. Quando tem os fatores de produção já existentes, é mais simples mobilizá-los para aumentar o nível de oferta.

Tudo isso colabora para a retomada da confiança na economia?

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A palavra mágica é confiança. É preciso que a varinha mágica da confiança volte a tocar a economia e animar os consumidores a adquirir bens que requerem crédito. Ao mesmo tempo, os projetos de investimento que já estão feitos e foram adiados estão prontos para ser deflagrados. Se houver essa volta da confiança que o governo Temer pode trazer, acho que existe espaço para um alento de expansão da oferta mesmo no curto prazo.

Boa parte desses fatores que ajudam Temer estariam aí independentemente da troca de governo.

Pois é. O timing da chegada favorece esse governo.

Do que o Temer sinalizou até agora, o que o sr. considera como fundamental que seja feito até 2018?

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Entendo que eles vão tentar fazer basicamente as medidas que estão delineadas naquele programa “Uma Ponte para o Futuro”. Tem medidas de curto prazo quase emergenciais e medidas de longo prazo, mas que afetam expectativas desde já.

Quais ações podem ser adotadas no curto prazo?

A medida de mais impacto no curto prazo é a desvinculação de receitas orçamentárias. De cada R$ 10 arrecadados pelo governo federal, R$ 9 já estão gastos. Ele só tem R$ 1 para administrar e fazer escolhas. Isso não dá. Engessa o Orçamento de uma maneira descabida, ainda mais num momento em que há um descontrole de gasto público e a dívida bruta crescendo a uma taxa explosiva. Além das desvinculações das receitas orçamentárias, o desbloqueio das concessões é importante. Acho também muito importante a nova ênfase que vai receber o comércio exterior no Brasil, com o País tendo uma atitude mais agressiva para abrir mercados e se libertando das amarras que o Mercosul acabou impondo para acordos bilaterais.

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Tudo isso prepara o terreno para um novo governo em 2018?

Se tudo correr bem, eu acho que o Temer pode ser para Dilma algo semelhante ao que Itamar foi para o Collor. Agora, não é o problema de estabilização macroeconômica, mas de organização do descalabro que é o legado das contas públicas do governo Dilma. É curioso lembrar que o conflito entre a Dilma e o Meirelles já se anunciou durante o governo Lula, quando ela bloqueou aquela medida de limite do crescimento do gasto corrente como proporção do PIB, dizendo que aquilo era rudimentar. Já estava desenhado ali o descalabro das contas públicas que veio com o governo dela.

O crescimento pode voltar em 2017?

Eu acho que podemos sair dos números negativos e ter um leve crescimento em 2017. É um cenário bastante plausível. Pode ocorrer no segundo semestre uma redução do quadro recessivo. Na margem, o PIB vai caindo cada vez menos e depois já começa 2017 num cenário de crescimento muito baixo ainda, mas com a queda do PIB estancada.

Vai ser fundamental para o sucesso do governo Temer sinalizar que ele não será candidato a reeleição se permanecer até 2018?

De tudo o que estou falando, o que mais me preocupa é o risco político deste governo. O PMDB tem muitas contingências e o prosseguimento das investigações (da Operação Lava Jato) deve implicar nas pessoas do primeiro escalão do novo governo. Aí mora o perigo. A grande ameaça para um governo Temer bem-sucedido é o grau de envolvimento da cúpula do PMDB que integra esse governo nos processos que a Lava Jato está apurando. E, para ser franco, me preocupa muito a figura do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha acuado e podendo usar as informações que ele certamente detém para, de alguma maneira, obter proteção com o novo governo.

A montagem do ministério, com integrantes mais ligados ao Congresso, pode ajudar a aprovar as reformas consideradas necessárias?

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Certamente o Temer conhece como poucos o modus operandi do nosso presidencialismo de coalizão. Ele tem conhecimento detalhado e foi muito cuidadoso na montagem do ministério tendo em vista essa realidade. Num primeiro momento, o Temer tem um capital político para poder deflagrar pelo menos algumas reformas relevantes. Agora, uma coisa é certa: conforme o tempo passa, o capital político se deprecia e os partidos parasitas vão aumentar o preço da adesão e do apoio para qualquer nova medida no Parlamento.

Mas o Temer vai ter respaldo popular para adotar medidas duras?

Ele já anunciou que não vai mexer nos gastos sociais relevantes. Agora, tem muito desperdício para ser eliminado. Tem um espaço que não é nada impopular, pelo contrário, será altamente popular se ele garantir que as transferências de renda promovidas pelo Estado brasileiro cheguem a quem precisa e somente a quem precisa, e não sejam capturadas no meio do caminho ou desviadas para outras funções. Eu acho que tem de passar um pente muito fino para garantir um uso eficiente e justo das transferências.

Há quem defenda uma revisão no Bolsa Família. O sr. concorda?

O Ricardo Paes de Barros, que desenhou o Bolsa Família, acha que tem espaço para uma revisão criteriosa e melhoria da eficiência do programa. Agora, vamos lembrar o seguinte: a carga tributária bruta é 36% do PIB e o Estado brasileiro gasta 10% do PIB a mais do que arrecada. Portanto, nós estamos falando de um Estado pelo qual transitam anualmente 46% da renda nacional e o Bolsa Família é 0,5% do PIB.

É nada...

É a migalha que cai da mesa. É incrível que se faça chantagem dizendo que se tiver de cortar alguma coisa vai ser aí (Bolsa Família). Isso é uma chantagem barata. Temos de lembrar que o Estado drena os 46% do trabalho dos brasileiros, mas a saúde pública, a educação e o saneamento são deploráveis. Tem alguma coisa profundamente errada nas finanças públicas brasileiras.

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Nesse governo, o sr. vê possibilidade de diálogo com todos esses grupos de interesses para resolver a questão das contas públicas?

Eu acho que os primeiros sinais são positivos. Gostei muito do programa “Uma Ponte para o Futuro”. Aponta na direção correta. Eu acho que podemos estar no limiar de um ponto de inflexão. Não quer dizer que vai melhorar da água para o vinho subitamente, mas pelo menos se estanca a hemorragia e a situação emergencial da economia.

O sr. vê alguma possibilidade da presidente Dilma retornar ao poder?

Eu volto ao ponto do risco político, que é a cúpula do PMDB. Se houver alguma coisa inesperada no plano das investigações, isso pode aumentar a chance de a votação final no Senado reconduzir Dilma para a Presidência.