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A lei que proíbe o consumo de álcool antes de dirigir, fez água

Por Antonio P. Mendonça
Atualização:

Quando a lei de tolerância zero entrou em vigor, um dos argumentos mais usados para dar-lhe sustentação foi a promessa da queda do preço do seguro de veículos, em função da redução dos acidentes envolvendo motoristas embriagados. Desde essa época, coloco sérias dúvidas sobre isso, porque o preço do seguro de automóvel depende de uma série de variáveis, nem todas impactadas por uma hipotética queda do número de acidentes, em função da redução do número de motoristas embriagados trafegando pelas ruas e estradas brasileiras. De cara, a lei foi um sucesso. Ao longo do primeiro mês de vigência, as polícias de todo o país pegaram pesado, montando comandos para flagrar os motoristas embriagados. O resultado foi uma enxurrada de matérias na imprensa, explicando como a nova lei seria a panaceia para os 50 mil mortos por ano em acidentes de veículos. De lambuja, motoristas embriagados sendo presos eram mostrados, como se estas prisões fossem o início de uma nova era, onde o brasileiro passaria a respeitar a lei e o país se livraria de todas as mazelas que nos custam uma verdadeira fortuna. Em pouco tempo começaram a surgir relatos de policiais corruptos achacando motoristas que haviam ingerido álcool. Logo depois havia até uma tabela, levando em conta a gravidade da infração e o teor alcoólico no sangue. Antes que se encerrasse o primeiro ato, ficou claro que a lei não era tão poderosa assim e que os motoristas que o desejassem, amparados pela Constituição Federal, poderiam se negar a fazer os exames para provar a ingestão de álcool. Ao voltar para os noticiários, as primeiras matérias sobre os efeitos da lei de tolerância zero para motoristas que ingerissem álcool apresentaram um cenário positivo, com a queda dos acidentes, principalmente no Estado de São Paulo. Mas esta realidade não durou muito e logo as estatísticas mostravam outro quadro, bem mais próximo dos números anteriores à lei, como consequência dela não ser levada a sério nas outras unidades da Federação. Agora, pesquisa recente, avalizada pelo Ministro da Saúde, dá conta que os efeitos da lei estão superados e que os índices de consumo alcoólico pelos motoristas em geral voltou aos níveis de 2007. De outro lado, a redução dos acidentes causados por motoristas embriagados não teve qualquer efeito no preço dos seguros de veículos. Nem poderia ter. Em primeiro lugar, o número de acidentes envolvendo motoristas embriagado está longe de gerar valores comparáveis aos decorrentes dos furtos e roubos de automóveis, estes sim, os grandes responsáveis pelo preço do seguro. Em segundo lugar, a Justiça não pacificou o direito das seguradoras negarem o pagamento das indenizações nos casos envolvendo motoristas embriagados. Como se não bastasse, a dura realidade é que não há mais fiscalização constante, visando tirar das ruas os motoristas embriagados. Para que a lei tivesse impacto no preço dos seguros de veículos seria necessário que ela pegasse e, evidentemente, ela não pegou. Mas, mesmo que pegasse, só seria possível se falar em redução do preço do seguro de automóvel, com base nela, depois de um período no qual fosse possível medir seus resultados, em termos da diminuição de acidentes causados por bêbados no volante e dos valores desembolsados pelas seguradoras. Antes que estes números fossem quantificados, ficou óbvio que a lei não é mais respeitada. A razão fundamental para isso é que não há uma fiscalização séria fora do Estado de São Paulo. O que nós assistimos, ao longo deste tempo, foi a promulgação de mais uma lei ruim, para "inglês" ver. Como ou o brasileiro está cheio de manobras políticas desta natureza ou realmente não respeita mais as regras legais e convenções sociais em vigor, a lei de tolerância zero para os motoristas embriagados acabou nos únicos lugares lógicos para ela: esquecida ou desrespeitada, para não dizer desmoralizada, ou um bom exemplo do que não deve ser feito, se não for para ser levado a sério. *Antonio Penteado Mendonça é advogado, sócio de Penteado Mendonça Advocacia, professor da FIA-FEA/USP e do PEC da Fundação Getúlio Vargas e comentarista da Rádio Eldorado.

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