Agenda China de Lula frustrou setor privado

Balanço do programa comercial do ex-presidente mostra que fatia de manufaturados prioritários perdeu espaço nas vendas para chineses

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Foto do author Raquel Landim

Lançada com pompa em Brasília em julho de 2008, a Agenda China, estratégia do governo Lula para a relação comercial com o gigante asiático, teve resultados decepcionantes. Dois anos e meio depois, os produtos manufaturados eleitos como prioritários no esforço exportador perderam espaço nas vendas para a China. Em 2008, representavam 2,3% do total exportado. No ano passado, caíram para 1,3%.A presidente Dilma Rousseff viaja para a China em abril para uma nova rodada de negociações e em busca de sua própria agenda comercial.O objetivo da Agenda China de Lula era triplicar as exportações para o país asiático até 2010 e elevar os investimentos chineses no Brasil. Em estudo de 92 páginas, técnicos do governo identificaram produtos que a China importa do mundo e também são produzidos pelo Brasil. Com base nisso, elegeram 147 itens prioritários que seriam alvo de ações de promoção comercial.As exportações para a China efetivamente triplicaram entre 2007 e 2010, passando de US$ 10,75 bilhões para US$ 30,79 bilhões. Os investimentos chineses no Brasil também decolaram. Mas praticamente não teve relação com o esforço exportador do governo. Segundo os especialistas em comércio exterior, o crescimento foi impulsionado pelo apetite do gigante asiático por matéria-prima.Levantamento do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes), feito a pedido do Estado, isolou 106 produtos manufaturados da lista de itens prioritários feita pelo governo, retirando commodities como carnes ou petróleo. As vendas do grupo cresceram apenas 31% entre 2008 e 2010, puxadas por plásticos (146%) e algodão (333%), que, apesar de passarem por processamento, também são insumos industriais. A participação desse grupo nas exportações totais para a China caiu para 1,3%, porque o aumento das vendas ficou abaixo da alta média de 86% dos embarques totais. O levantamento do Cindes considerou o período de 2008 a 2010, sem incluir 2007. Para os analistas do instituto, não faz sentido incluir 2007, porque a Agenda China foi lançada em julho de 2008, logo eventuais efeitos das medidas só seriam sentidos no ano seguinte.As exportações de máquinas e tratores para a China, por exemplo, recuaram 30% entre 2008 e 2010. Esse setor era considerado promissor pelos técnicos do governo. As vendas de aparelhos e equipamentos eletrônicos caíram 9%. Também houve um recuo de 2% nas exportações de químicos. Apenas os setores de autopeças e de instrumentos de precisão registraram resultados positivos, embora inferiores à meta de triplicar as vendas: alta de 19% e 20%, respectivamente."O resultado foi decepcionante", diz Sandra Ríos, diretora do Cindes. Ela ressalta que exportar para a China é muito mais difícil que para outros países, dados os baixos custos de produção no gigante asiático. "A promoção comercial tem um papel secundário na estratégia com a China. A agenda tem de ser macroeconômica para elevar a competitividade do Brasil."Crise. De acordo com Alessandro Teixeira, secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento e ex-presidente da Agência de Promoção de Exportações (Apex) na gestão Lula, as metas da Agenda China foram cumpridas, mas a qualidade dos resultados foi comprometida pela crise global. A China seguiu crescendo forte, mas parte das exportações do país que iam para EUA e Europa permaneceu no mercado local, aumentando a concorrência e dificultando o esforço exportador do Brasil.Fontes envolvidas na elaboração da Agenda China contam que a estratégia não saiu do papel porque faltou continuidade. Não foram liberados os recursos necessários para os estudos complementares que seriam feitos para cada setor. Na página criada na web pelo governo para a Agenda China, era possível se cadastrar para ter acesso a informações extras. O problema é que essas informações nunca foram enviadas.O documento da Agenda China foi apresentado em Brasília, em um evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI) para 200 pessoas. Nos meses seguintes, foram distribuídos 12 mil exemplares pelo País. O esforço, no entanto, praticamente parou por aí. Os técnicos do governo contataram empresas com potencial para exportar para a China, mas concluíram que não havia interesse nesse mercado pela distância e pela pesada concorrência. Na avaliação dos técnicos, também "falta estímulo e conscientização" dos empresários.

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