Onze mil obras de arte que formavam o acervo de Edemar Cid Ferreira estão sob regime de sequestro judicial desde 18 de fevereiro de 2005, quando o ex-banqueiro foi condenado a 21 anos de prisão por crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro. Quase todas as peças já estão sob custódia e à mostra em museus de São Paulo. Outra parte do patrimônio, cerca de 900 itens que ainda ornam a mansão da qual Edemar foi desalojado, terá o mesmo destino por ordem do juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6.ª Vara Criminal Federal.De Sanctis confiscou a coleção - pinturas, quadros, fotografias e vasto registro de arqueologia e etnografia - para evitar seu desmonte e ocultação.O juiz tem paixão por obras de arte. Conhece e já visitou e revisitou os mais portentosos museus do mundo. Considera que as criações devem ser mantidas em permanente exposição pública. São inúmeros os feitos por ele presididos em que manda arrestar trabalhos artísticos de propriedade de seus réus - em dezembro, no curso de um processo em que o acusado fez delação premiada, mas não tinha recursos para reparar o Tesouro, De Sanctis lhe tomou dois quadros e os entregou aos cuidados do Museu de Arte de São Paulo (Masp).Desde o início da ação contra o ex-controlador do Banco Santos, o juiz já destinou cerca de 10 mil peças "para guarda provisória e obrigação de expor" a museus e centros culturais de São Paulo - Museu do Ipiranga/USP, Museu de Arte Sacra, Centro Cultural da Marinha, Museu de Arqueologia e Etnografia, Instituto de Estudos Brasileiros da USP, Museu de Arte Contemporânea (MAC) e Secretaria de Estado da Cultura.Após o trânsito em julgado - sentença definitiva - as obras deverão ser integradas para sempre à galeria dos museus. Será este também o destino das riquezas que estão na antiga residência de Edemar, então fiel depositário. "A luta por essas obras é de todos nós", assinala De Sanctis, de 46 anos, há 20 na magistratura, que hoje toma posse como desembargador do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF3). "Obra de arte tem uma importância vital para toda a sociedade. É cultura, é educação, reafirmação de valor. É registro histórico, é tudo."Ele não fixou valores. "Obra de arte não tem valor econômico, mas valor artístico. Em nenhum momento eu abri mão da valorização do patrimônio cultural que não pode ser alijado do acesso da população."Arqueológicos. Uma parte dessas preciosidades é formada por três mil itens arqueológicos. O juiz proibiu sua venda. Ele acentua que a meta é "conferir eficácia" à Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial e Cultural da Conferência Geral da Unesco.No dia 18 de setembro, De Sanctis recebeu ofício da 2.ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais sobre providências necessárias para a repatriação de obras de Edemar localizadas nos Estados Unidos em face de pedido de cooperação jurídica em matéria penal.Ao destinar essas obras ao Museu de Arte Contemporânea, o juiz asseverou. "Em alguns momentos não cabe às autoridades apenas a tutela do capital, ao contrário, espera-se o reforço de valores, notadamente culturais, que dizem com a identidade universal. Somente se pode falar em ressarcimento, na espécie, quanto a todos, aí incluídos eventuais interessados privados, e isto se efetiva mediante ações positivas que permitam acesso público do patrimônio mundial à coletividade, e não a alguns poucos, e a sua difusão para futuras gerações. Olhar que não pode ser restrito ou parcial.""Se todos ganham, ganham, inclusive, os credores da massa falida", destaca o juiz. "Não há perdas quando a coletividade é a grande beneficiada. Com este único espírito, após o trânsito em julgado, aguarda a sociedade a tomada de futuras decisões pelo juízo falimentar, independentemente de eventual interesse manifestado pelo Estado na aquisição do rico acervo."Valor artísticoFAUSTO MARTIN DE SANCTISJUIZ DA 6ª VARA CRIMINAL FEDERAL"Obra de arte tem uma importância vital para toda a sociedade. É cultura, é educação, reafirmação de valor. É registro histórico, é tudo""Obra de arte não tem valor econômico, mas valor artístico. Em nenhum momento eu abri mão da valorização do patrimônio cultural que não pode ser alijado do acesso da população""Não há perdas quando a coletividade é a grande beneficiada" "Se todos ganham, ganham, inclusive, os credores da massa falida"
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