Argentina: Wall Street celebra desmonte cambial, mas alerta para pressão em preços

Economistas consideram medida importante para atrair investimentos; FMI projeta crescimento de 5,5% em 2025 e 4,5% em 2026 e inflação entre 18% e 23% neste ano e entre 10% a 15% no próximo

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Foto do author Aline Bronzati
Atualização:

NOVA YORK - O fim dos controles cambiais na Argentina foi celebrado em Wall Street, que enxerga na medida, iniciada nesta segunda-feira, 14, um passo crucial para o país caminhar para uma normalização depois de anos de profunda crise econômica. Economistas acreditam que o passo seja importante para o governo de Javier Milei atrair investimento estrangeiro e promover um crescimento mais rápido, mas alertam que pressões inflacionárias no curto prazo são ‘inevitáveis’ e que reformas estruturais são necessárias.

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O dia foi de forte ajuste no câmbio. O dólar oficial e o dólar Banco Nación chegaram ao fim da tarde com valorização de cerca de 12%, cotados a 1233,36 e 1230,00 pesos argentinos na venda, respectivamente. Já o dólar blue, negociado no mercado paralelo, recuou mais de 6%, para 1285,00 pesos argentinos, de acordo com o jornal Ámbito Financiero.

A partir de agora, o mercado cambial da Argentina passa a operar entre bandas de 1,0 mil a 1,4 mil pesos argentinos, com ajustes de cerca de 1% por mês. O anúncio foi feito na última sexta-feira, dia 11, graças a um novo socorro de Fundo Monetário Internacional (FMI) no valor de US$ 20 bilhões e duração de 48 meses, após uma greve geral que paralisou o país e entes da visita de hoje do secretário do Tesouro americano, Scott Bessent.

O presidente da Argentina, Javier Milei, recebeu na Casa Rosada o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, nesta segunda-feira, 14 Foto: Presidência da Argentina/AFP

Este é o 23º acordo do organismo com a Argentina. Do valor, US$ 12 bilhões serão desembolsados de imediato. Em junho, o fundo deve fazer uma revisão e, caso o governo Milei cumpra os pré-requisitos, terá acesso a mais US$ 2 bilhões. Em novembro, está previsto mais US$ 1 bilhão.

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A Capital Economics se surpreendeu com o momento do anúncio, pois imaginava que muitas dessas medidas seriam adiadas para depois das eleições de meio de mandato, que acontecem em outubro, em uma tentativa de reforçar a popularidade de Milei.

Na visão da consultoria britânica, porém, o peso permanecerá supervalorizado e serão necessárias novas medidas para enfraquecer a moeda. “Um peso mais fraco deve contribuir para restaurar a competitividade externa da Argentina, embora os parâmetros cambiais anunciados ainda deixem o peso supervalorizado”, diz a economista da Capital Economics para a América Latina, Kimberley Sperrfechter.

O Morgan Stanley avaliou as medidas como “positivas” e acredita que a suspensão completa dos controles cambiais sobre os fluxos na Argentina deve ajudar a atrair investimento externo direto para o país e impulsionar o crescimento. Alerta, contudo, para pressões nos preços. “Pressões inflacionárias temporárias são provavelmente inevitáveis”, diz o economista do Morgan Stanley para a América Latina, Fernando D Sedano.

Segundo ele, reformas estruturais parecem necessárias para impulsionar o crescimento a longo prazo e devem contribuir para reduzir a carga tributária sobre o setor privado, mantendo a prudência fiscal. O cronograma está bem dividido, com essas mudanças deixadas para as eleições de meio de mandato na Argentina.

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“Temos uma impressão positiva dos anúncios feitos pelo Banco Central e pelo FMI”, reforçou o economista do Goldman Sachs, Sergio Armella. O fim da amarra cambial também surpreendeu o gigante de Wal Street, que vê ganhos para a sustentabilidade a médio prazo do programa de ajuste macroeconômico implementado pelo governo Milei. “A Argentina precisa de uma taxa de câmbio que permita ao banco central acumular reservas de forma sustentável”, afirmou.

O ‘Dia da Libertação’ argentino

O BTG Pactual pegou carona no presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e classificou as medidas na Argentina como o verdadeiro “Dia da Libertação”, em alusão ao nome que o republicano deu para o anúncio das tarifas recíprocas, detalhadas no dia 2 de abril. O acordo é “muito melhor” do que o banco esperava, mas também fez um alerta para pressões nos preços no curto prazo. “Embora acreditemos que o câmbio deva se acomodar abaixo da faixa superior, o enfraquecimento implícito do peso argentino impactará a inflação durante o segundo trimestre e poderá reduzir o crescimento na margem”, diz o analista do BTG Pactual, Andres Borenstein.

O repasse de preços tende a ser, porém, “moderado” e a inflação da Argentina deve continuar em tendência de baixa após a alta inicial, conforme ele. O BTG diz que está “otimista” e espera que a inflação do país alcance 32,5% neste ano e de 10% a 15% em 2026.

Por sua vez, o FMI vê a Argentina crescendo 5,5% em 2025 e 4,5% em 2026 e a inflação entre 18% e 23% neste exercício e 10% a 15% no próximo, conforme projeções divulgadas antes do novo socorro ao país. “Ambos, mas particularmente a inflação até o fim de 2025, parecem otimistas para nós”, avalia o Goldman Sachs, em relatório a clientes.

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Na Argentina, Bessent se reuniu nesta segunda-feira, 14, com Milei. No encontro, afirmou apoio total dos EUA às reformas econômicas do presidente argentino e elogiou o novo socorro do FMI e do Banco Mundial, conforme nota à imprensa, publicada nesta tarde. Tarifas recíprocas também estiveram na pauta.

Indagado a comentar sobre o governo Milei, Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central do Brasil, disse que o argentino parece estar no caminho certo, próximo de colher os primeiros frutos após adotar um ajuste “forte e impopular”.

“Houve uma contração muito forte da economia no último ano, mas na ponta agora parece que está indo para cima”, afirmou ele, em palestra recente, lembrando que a Argentina ainda tem questões para serem resolvidas, principalmente o equilíbrio cambial.

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