O Ministério da Fazenda e o Banco Central tem visões diferentes sobre a desvalorização do dólar. Ao dizer que a valorização do câmbio é uma fonte de preocupação para o governo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tenta colocar pressão sobre o Banco Central para que não reduza o ritmo de queda na taxa básica de juros, a Selic. Já o BC avalia que o dólar está se desvalorizando não só no Brasil e que, portanto, a taxa de câmbio não está diretamente ligada à variação dos juros. Embora reconheça que a melhora no humor externo esteja ajudando a valorizar o real em relação ao dólar, a avaliação majoritária dentro do Ministério da Fazenda é que o BC pode ajudar a conter esse movimento cortando agressivamente a taxa de juros. Fontes ouvidas pela Agência Estado dizem que há espaço para a Selic chegar à casa de 8% ao ano sem qualquer risco para a inflação. A queda agressiva na Selic, em ritmo mais acelerado que o previsto pelo mercado, poderia, na visão da Fazenda, diminuir o estímulo para as operações de arbitragem, em que os investidores se aproveitam da diferença de juros no Brasil e no exterior. Eles captam recursos lá fora a juros baixos para aplicá-los aqui, a taxas altas. Esse mecanismo seria um dos principais motivos do forte ingresso de dólares na economia que têm valorizado o real. A preocupação da Fazenda com o câmbio hoje é ainda maior do que era quando a moeda chegou, no ano passado, à casa de R$ 1,50 a R$ 1,60 porque, naquele momento, antes da quebra do banco Lehmann Brothers, os preços de commodities estavam próximos do pico e a economia mundial ainda experimentava um ritmo de crescimento robusto, o que garantia receita para os exportadores apesar do câmbio adverso. O cenário atual é diferente. Por isso, Mantega tratou de tirar o tema dos bastidores e levá-lo para uma discussão pública, tentando deixar o BC mais pressionado para explorar o espaço que tem para cortar juros. Na quinta-feira, Mantega e o presidente do BC, Henrique Meirelles, se reuniram e a valorização do câmbio foi tema da conversa, segundo uma fonte da Fazenda, que não deu mais detalhes sobre o encontro. Segundo uma fonte ligada ao BC, há uma forte tendência de desvalorização do dólar em relação a várias moedas, do euro ao real. Um dos motivos é a desconfiança sobre a situação fiscal americana, por causa dos enormes gastos com os programas de estímulo à economia. Para o BC, há ainda outra questão: no auge da crise os investidores migraram em massa para aplicações de grande liquidez, a começar pelos títulos do Tesouro americano. Agora que a situação melhorou, os dólares começam a irrigar outros mercados, mudando as cotações de moedas em vários países. Além disso, a cotação do dólar no Brasil estaria mais ligada aos movimentos dos preços das commodities exportadas pelo País do que às taxas de juros. Por esses motivos, o Banco Central já não baseia suas análises sobre câmbio unicamente na relação com o dólar. Leva em conta também o euro.
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