O mergulho dos preços do petróleo nas bolsas internacionais parece ter passado a impressão de que estão resolvidos os problemas produzidos pelo atraso dos preços dos combustíveis no mercado interno. Longe disso, as distorções são tantas que é preciso mais para restabelecer o equilíbrio.
Terça-feira, os analistas do Credit Suisse concluíram que aos níveis próximos dos US$ 85 por barril (159 litros) de petróleo tipo Brent, como os de hoje, e o dólar ao câmbio atual, os preços dos combustíveis no mercado interno estão até um pouco acima dos preços internacionais. (Veja gráfico abaixo.) É mais ou menos a mesma conclusão a que chegaram outras consultorias. Estas não calcularam o quanto teriam de subir no mercado interno para "indenizar" a Petrobrás pelo pedaço da conta do consumidor pago ao longo de todos esses anos.

Independentemente disso, o problema de base não é a tal "defasagem" dos preços internos em relação aos externos, mas a falta de regras claras e firmes para a definição do valor de comercialização dos combustíveis no Brasil. A Petrobrás não precisa operar com preços que variem diariamente, de acordo com as cotações internacionais convertidas em reais pelo câmbio do dia. Mas precisa de um critério, que hoje não tem, que dê um mínimo de previsibilidade.
As correções internas são definidas pelo que passa na telha de quem manda no governo. Hoje, por exemplo, os preços dos combustíveis cumprem a principal função de ajudar a impedir o estouro da inflação. Fazem parte de uma política heterodoxa de preços.
A definição de um critério é importante não apenas para dar racionalidade à economia. É importante, também, para garantir investidores para as novas refinarias de cuja construção a Petrobrás já não está dando conta. Não haverá nunca interessados em compor sociedade com a Petrobrás nesse negócio, enquanto os preços a serem cobrados na ponta da refinaria estiverem sujeitos a subsídios ao consumo, como aconteceu até agora.
Outra variável a ser levada em conta é a competitividade do setor do etanol. A menos que o governo queira desestimular a produção de combustíveis renováveis, o que parece inconcebível, a gasolina não pode continuar a ser vendida a preços tão baixos que inviabilizem o setor da cana-de-açúcar. Hoje, há 63 usinas na UTI da recuperação judicial (antigo regime de concordata), porque seu produto não é rentável.
Para que o etanol concorra em igualdade de condições com a gasolina é preciso que seus preços não ultrapassem 70% dos preços da gasolina. Esses 70% são exigência técnica: um carro a etanol percorre quilometragem 30% mais baixa do que um carro a gasolina.
Para garantir esse nível de paridade, foi criada a Cide, cujo nome e sobrenome é Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. É um imposto regulatório (sem função arrecadatória) que, no caso dos combustíveis, põe os preços da gasolina em nível tal que deixe retorno razoável para o produtor de etanol. Hoje, para cumprir a função já mencionada de segurar artificialmente a inflação, a Cide foi zerada na estrutura de preços dos combustíveis.
CONFIRA:

No gráfico, a evolução das vendas no varejo. É cedo para garantir que a recuperação de agosto seja sustentável.
Deflação? Os observadores vêm advertindo que, se perdurar, a derrubada dos preços do petróleo conjugada com a das commodities agrícolas poderá provocar deflação nos Estados Unidos e na Europa. Convém pontuar que, se for confirmada, a deflação não terá sido provocada apenas por essa queda de preços, mas pela crise que vem deprimindo preços e custos em toda a economia. A derrubada das cotações do petróleo seria apenas a pá de cal.