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Jornalista e comentarista de economia

Análise | Energia elétrica, jabutis e subsídios

Perda de capacidade de formulação da política energética pelos organismos técnicos abre brecha para que lobistas e o Congresso criem distorções no setor elétrico

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Foto do author Celso Ming
Foto do author Pablo Santana

É em momentos de crise severa, como a produzida pela seca recorde de 2024, que se percebe como o setor elétrico brasileiro vem acumulando problemas que corroem sua resiliência e encarecem a conta de luz.

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Os interesses de quem atua para acumular benefícios próprios e o enorme poder de interferência do Congresso vêm prejudicando a capacidade de organização e de regulação dos órgãos técnicos do setor.

O exemplo mais recente desse desequilíbrio foi a votação do marco regulatório da energia eólica offshore (em alto-mar). O texto aprovado seguiu para sanção presidencial enxertado de jabutis, como são chamadas as matérias contrabandeadas na letra da lei que nada têm a ver com a proposta central. Pelos cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, o custo adicional desses penduricalhos foi estimado em R$ 20 bilhões por ano, o que, até 2050, perfaria R$ 545 bilhões – impacto de 9% ao ano a ser descarregado sobre a conta de luz. O presidente Lula vetou esses jabutis. Cabe agora ao Congresso decidir se derruba ou mantém esses vetos presidenciais.

Edvaldo Santana, ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica, adverte que “a política de subsídios continua desgovernada. O problema principal é o de que a discussão sobre a diversificação da matriz energética está dominada pelo Congresso, onde predominam “os interesses locais, que impõem o planejamento, determinam quanto deve ser instalado e de qual fonte”.

Os subsídios do setor elétrico corresponderam no ano passado a 13% da conta de luz paga pelo consumidor. Para este 2025, o total deve chegar a R$ 40,6 bilhões. Destes, R$ 36,5 bilhões serão pagos pelo consumidor, aumento de 18,2%. É um modelo tarifário injusto, aponta Santana, porque a conta pesa mais no bolso de quem não usufrui de nenhum benefício.

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Além disso, a criação e a prorrogação desses subsídios acabam gerando distorções na estrutura de incentivos do mercado de energia que, por sua vez, prejudicam a confiabilidade do sistema, em que é essencial a operação integrada e equilibrada entre as fontes renováveis e intermitentes e as outras fontes. O excedente de energia impulsionado pelos subsídios vem forçando o Operador Nacional do Sistema (ONS) a cortar a geração solar e eólica (curtailment) em determinados momentos para não sobrecarregar o sistema elétrico e evitar apagões, como o de agosto de 2023.

Para o professor da UFRJ Nivalde de Castro, coordenador-geral do Grupo de Estudos do Setor Elétrico, o saldo de 2024 foi negativo. Esses cortes programados na geração criam um “ovo da serpente”, pois abrem brechas para judicialização e novos desarranjos. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça julgou a favor da Aneel o recurso contra liminar que estabelecia um ressarcimento aos geradores pela incidência desses cortes que, segundo as principais associações do setor, ultrapassou R$ 1 bilhão em prejuízos.

Nivalde acredita que a solução para essas distorções passa pela retomada da formulação da política energética pelo Ministério de Minas e Energia (MME), o que não dispensa o diálogo com o Congresso e com os agentes do setor. “Recuperar esse protagonismo é fundamental para viabilizar que as decisões técnicas se sobreponham às decisões políticas motivadas por vieses econômicos”.

Análise por Celso Ming

Comentarista de Economia

Pablo Santana

Repórter da editoria de Economia, atua na Coluna do Celso Ming desde 2021. Formado pela Universidade Federal da Bahia, com extensão em Jornalismo Econômico realizada durante o 9º Curso Estado de Jornalismo Econômico.

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