Na última quinta-feira, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou os primeiros decretos que envolvem o setor das criptomoedas. O sinal é de criação de um regime regulatório pró-inovação que seja menos intervencionista.
As decisões proíbem o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) de desenvolver uma moeda digital de banco central (CBDC, na sigla em inglês). E determinam a criação de grupo de trabalho sobre ativos digitais com o objetivo de apresentar propostas ao Congresso e ao presidente em 180 dias sobre o que fazer. Trump quer também a criação de um estoque estratégico nacional de moedas digitais.
As expectativas para as primeiras decisões eram altas, uma vez que, dias antes da posse, Trump lançou duas criptomoedas próprias: a $TRUMP e a $MELANIA. A primeira chegou a atingir US$ 15 bilhões em valor de mercado, mas, em questão de dias, perdeu metade desse valor.
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Em relatório publicado recentemente, analistas da gestora Bernstein viram no lançamento das moedas do casal Trump o início de uma era caótica para a indústria de criptomoedas, ainda que estimule legislações mais favoráveis em outros países.
O lançamento também chegou a ser visto com descrédito porque esses ativos, baseados em “memes”, personalidades ou tendências da internet, oferecem pouco valor intrínseco, não apresentam lastro tangível e estão altamente sujeitos à volatilidade – situação que reforça as críticas sobre a grande vulnerabilidade que o mercado de criptomoedas pode causar aos investidores, especialmente quando atingem conjuntamente valor de mercado de US$ 3,6 trilhões, como mostram dados do agregador CoinMarketCap.

Além disso, uma política sem amarras para as criptomoedas, como pretende Trump, pode aumentar o número de transações ilegais que envolvem as stablecoins e outros ativos digitais, tais como evasão fiscal, extorsão e lavagem de dinheiro.
Em 2024, o valor total das operações com criptomoedas movimentadas pelo crime foi de US$ 51 bilhões, como consta em relatório da empresa de análise de blockchain Chainalysis. Esse volume corresponde a apenas 0,14% do total das transações globais com criptoativos, mas é um movimento que exige dos reguladores mais controle e criação de ferramentas para dar mais transparência.
Além disso, sobram dúvidas em relação ao estoque de ativos digitais que Trump pretende criar. Começa por saber qual ativo seria adotado. Se for o bitcoin, o carro-chefe do setor, parece inevitável o impacto sobre seus preços ou se a reserva servirá como instrumento de proteção econômica, especialmente se outros países não seguirem nessa linha.
Pergunta-se, também, se essa concorrência na composição de reservas não imporia algum desgaste ao dólar; se não geraria desprestígio ao Fed; ou, então, se não comprometerá as receitas de senhoriagem.
Embora Trump tenha proibido a criação de uma CBDC, com o argumento de que contrariaria a privacidade e a liberdade econômica dos cidadãos americanos, a indústria tem se preparado para a criação de infraestruturas de sistemas de blockchain a serem reguladas pelos bancos centrais. Na avaliação do especialista Gustavo Cunha, CEO da FinTrender, será o grande legado para acelerar o acesso a serviços financeiros inteligentes e para a transformação de qualquer bem em ativo digital (token).
" O que estamos vendo hoje é a utilização desta tecnologia [de blockchain] para dar um upgrade na infraestrutura de mercado no mundo. Como ela é linear para todos os setores, será possível tokenizar o dinheiro, imóveis, commodities, então todos os setores serão impactados por essa infraestrutura, que irá trazer mais eficiência e transparência para as operações e o regulador do Brasil está muito à frente neste quesito, explica Cunha.