Os R$ 9 bilhões de ofertas subsequentes (follow-on, na sigla em inglês) chegaram à Bolsa neste conturbado início de 2022 graças ao interesse de investidores estrangeiros e dos que compõem a base de acionistas das próprias empresas, enquanto o investidor local está mais retraído para comprar ações. No geral, as ofertas prioritárias para os atuais acionistas das companhias responderam por ao menos 60% total das operações, e a participação dos sócios tem sido importante.
Os estrangeiros, de modo geral, têm ficado com pelo menos metade das ofertas, considerando os papéis que vão efetivamente ao mercado, nível acima do que vinham fazendo nos últimos anos - na casa dos 20% a 30%. Na transação da BRF, eles responderam por 80%, enquanto na Equatorial Energia, a fatia subscrita por estrangeiros foi de 60%.
A expectativa era que a indicação de alta do juro nos Estados Unidos provocasse uma saída de recursos estrangeiros do País. "Mas aconteceu exatamente o contrário, com os estrangeiros vendendo tecnologia lá fora e comprando papéis com potencial de valorização na Bolsa brasileira, que estava barata", diz o responsável pelo banco de investimento do Bradesco BBI, Felipe Thut.
O diretor de Corporate & Investment Banking do Itaú BBA , Cristiano Guimarães, relata que além de a participação de estrangeiros ter crescido nas ofertas subsequentes neste começo de 2022, os compradores não têm sido apenas os hedge funds, fundos com perfil mais especulativo. "Alguns fundos 'long only' (com visão de longo prazo) importantes estão voltando a investir no País", afirma ele, falando dos fundos que operam comprados, ou seja, acreditando na valorização da ação.
Bolsa barata
No contexto da Bolsa barata, a depreciação do real frente ao dólar e o diferencial do juro brasileiro em relação ao norte-americano também ajuda a atrair os estrangeiros. Na oferta da Braskem, houve demanda importante de estrangeiro, mas como não havia oferta restrita, todo o lote foi para o mercado e as fontes argumentam que esse foi um fator a pressionar ainda mais para um desconto. A operação acabou não saindo.
"Nos últimos dois a três anos, a Bolsa brasileira foi uma das que pior desempenhou globalmente e agora está barata, passando a ter o melhor retorno, influenciada pelo recuo do dólar e a volta das operações de carry trade (arbitragem com juro e câmbio)", observa o presidente do Morgan Stanley no Brasil, Alessandro Zema. As operações de carry trade ou arbitragem são favorecidas pelo diferencial de juro, que já está subindo, com a taxa brasileira sendo aumentada em ritmo mais forte que seus pares emergentes.
Geopolítica
Parte importante dos estrangeiros que compra Brasil neste momento não estão necessariamente interessados no País. O fluxo de recursos que se desloca para a Bolsa brasileira é passivo, ou seja, acompanha aumento na alocação de fundos que investem em mercados emergentes e que têm um porcentual composto por Brasil. Além disso, a perspectiva de um conflito militar na Ucrânia, encabeçado pela Rússia, atrai investidores que saem dos papéis russos para o Brasil.
"Acho que o movimento dos estrangeiros é muito mais tático, oportunístico, do que uma convicção de investir no Brasil", diz Thut. Ele lembra que a perspectiva de eleições traz incerteza e que dificulta a construção de uma convicção sem uma clareza sobre o resultado do pleito.
"Imaginamos que em março, o Fed potencialmente vai elevar o juro e isso poderia causar uma correção maior na bolsa dos Estados Unidos, podendo provocar um novo fluxo de estrangeiros", afirma. No entanto, o responsável pelo banco de investimento do Bradesco BBI diz que existe um ponto de equilíbrio. "Ainda achamos que a Bolsa está barata, pelo múltiplo em dólar, mas em algum momento deixa de ser tão barata quanto esteve quando o Ibovespa estava em 100 mil pontos", acrescenta.
O responsável pelo banco de investimento do Citi no Brasil, Eduardo Miras, nota que, no momento, os estrangeiros ainda estão alocando de forma gradual e optando por empresas com grande liquidez. "Observamos que os investidores internacionais estão se posicionando de forma tímida, por enquanto".
No atual contexto de maior volatilidade, o executivo não vê espaço para ofertas de novas ações (IPO, na sigla em inglês) saindo, mesmo com essa maior presença dos estrangeiros. "O maior inimigo dos IPOs é a volatilidade e ela continua alta", justifica.
Já os fundos e gestoras locais seguem mais retraídos a comprarem ações nos follow-on e principalmente nos IPOs, de acordo com os banqueiros de investimento. A razão é que os saques nos fundos de ações e multimercados, que perderam bilhões em 2021, continuam fortes neste início de 2022. Só em janeiro, essas duas categorias tiveram saques líquidos de R$ 8,7 bilhões, de acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
Esta reportagem foi publicada no Broadcast no dia 22/02/22, às 15h31.
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