
O nível de inadimplência nas carteiras dos bancos está sendo acompanhado de perto pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), especialmente com a revisão para o segundo semestre de 2023 das projeções dos agentes do mercado de corte na taxa Selic e com o aumento da exposição dos poupadores às instituições menores. O FGC é uma entidade privada que faz parte da rede de proteção do sistema financeiro, formada por 221 instituições.
Segundo o diretor-executivo do FGC, Daniel Lima, o volume de depósitos entre as instituições financeiras menores, classificadas pelo Banco Central como S2, dobrou em pouco mais de dois anos, velocidade nunca vista anteriormente. Ele afirma que dos R$ 1,86 trilhão dos depósitos que estão dentro do limite de cobertura do fundo, R$ 320 bilhões são de instituições fora do S1. Esse risco era de cerca de R$ 150 bilhões antes da pandemia, acrescenta.
"É um aumento que precisa ser observado. O risco está crescendo e tem mais depósitos no mercado em instituições não S1", diz. Ele pondera que esse crescimento fora do S1 é natural, como reflexo da popularização das corretoras e distribuidoras de valores mobiliários e da agenda BC#. "Antes quem queria captar tinha de gastar muita sola de sapato, agora está mais fácil", lembra.
O FGC começou a publicar mensalmente o detalhamento da exposição de sua cobertura entre as instituições financeiras S1, de porte igual ou superior a 10% do PIB, e as S2, abaixo disso, mas superior a 1% do PIB. De acordo com o executivo, o fundo sempre teve essa visão segmentada de sua exposição, mas resolveu tornar pública para aumentar a transparência e dar ferramentas de análise de risco ao mercado.
Tema permeia discussões em todo o sistema financeiro
A inadimplência, afirma, é uma questão que tem permeado as preocupações de todo o sistema financeiro, que, por sua vez, já vem se preparando para a nova realidade de pelo menos um ano e meio de inflação mais alta e de taxa de juro em patamar mais elevado. "Temos conversado bastante com as associadas, não enxergamos nenhum risco grande, mas é um período em que temos de estar de olho e para se acompanhado de perto", diz.
Lima observa ainda que, com a inadimplência no radar, os bancos anteciparam a gestão de suas carteiras, com mudanças nas linhas de concessão para aquelas mais seguras, renegociações de contratos e tomada de mais garantias, especialmente de empresas. "Mas as instituições terão de trabalhar muito ainda", acrescenta.
Fundo tem reciclado seu patrimônio
Atento à sua própria liquidez, Lima diz que o FGC tem reciclado seu patrimônio, tendo vendido metade das matrículas da carteira de imóveis do fundo e carteiras de crédito, entre 2020 e 2021. O executivo diz que o FGC não abre esses números detalhadamente em seu balanço, inclusive para preservar a estabilidade do sistema e não gerar especulações.
De qualquer forma, Lima afirma não haver nenhuma grande carteira a ser vendida, já que as maiores foram desovadas. "O grande número a se acompanhar é o montante de quase R$ 80 bilhões de liquidez imediata, esta é a informação relevante", acrescenta.
Alta da Selic favoreceu balanço do FGC no 1º semestre
A alta de Selic beneficiou fortemente o balanço do FGC no primeiro semestre deste ano. A receita financeira do fundo saiu de R$ 1,3 bilhão em junho de 2021 para R$ 5,28 bilhões em junho de 2022. Com isso, o patrimônio do FGC ultrapassou os R$ 100 bilhões, alcançando R$ 100,7 bilhões.
Outro destaque do balanço do FGC é a aproximação do índice de liquidez da banda regulatória, que vai de 2,3% a 2,7% e da qual o fundo está desenquadrado desde 2020. No primeiro semestre houve aumento de cerca de 10% da liquidez do fundo em relação a junho do ano passado, para R$ 78,7 bilhões, representando 2,20% do saldo de depósitos elegíveis. Em junho do ano passado, estava em 2,05%.
Em 2020, primeiro ano da pandemia, o índice chegou a cair para 1,95%, por conta da corrida dos investidores para ativos de bancos, como CDBs, LCIs, LCAs, poupança e depósitos à vista, que são protegidos pelo fundo. Houve um aumento de 50% no volume de depósitos elegíveis à proteção do FGC, que saíram de R$ 2,4 trilhões em 2019 para R$ 3,5 trilhões em junho deste ano.
"Acredito que até o final do ano chegaremos perto dos 2,3%", diz Daniel Lima. Dos R$ 3,5 trilhões de títulos emitidos pelo sistema elegíveis à proteção do FGC, R$ 1,86 trilhão correspondem aos que se enquadram no limite de cobertura do fundo, de R$ 250 mil investidos por CPF em cada instituição financeira. Isso representa 52,62% dos elegíveis e um crescimento de 6,65% em relação a junho de 2021.
De acordo com ele, o índice é monitorado mensalmente e, embora tenha havido apreensão com sua queda em 2020, o Conselho de Administração julgou não ser necessário nenhum tipo de ação para uma reconstituição mais rápida. A decisão foi tomada, afirma, diante da percepção de que o Banco Central subiria o juro - beneficiando as receitas -, e de expansão na base de contribuição do FGC, que tem relação direta com demanda por títulos protegidos pelo fundo.
Lima observa ainda que o risco do sistema financeiro se manteve controlado pelas ações do Banco Central e do governo na pandemia, sem indicações de que o fundo seria chamado para ressarcir beneficiários de garantia. Tanto que, apenas duas instituições financeiras tiveram problemas de liquidez entre 2020 e 2021, a Dacasa Financeira e a CHB Cia Hipotecária. Ao todo, o FGC já pagou R$ 975 milhões referentes a obrigação de cobertura das duas instituições.
Em 2022, não houve nenhuma exigência de cobertura.
Entidade investe no fortalecimento da área de tecnologia
Entre as novidades no FGC estão o fortalecimento da área de tecnologia para incorporar à análise de risco outras fontes de dados que a indústria não trabalhava no passado, como dados não estruturados e qualitativos, como notícias e qualidade da administração.
Este ano é marcado também pela chegada de dois novos diretores, Luis Vicente, que já teve seu nome homologado pelo Banco Central para a diretoria de gestão de riscos, e um segundo ainda sob análise do BC para a diretoria de monitoramento e pesquisa. Lima foi reconduzido ao cargo de diretor executivo em abril, por mais três anos.
Este texto foi publicado no Broadcast+ no dia 19/09/2022, às 12h30
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